Há quanto tempo escuto o ruído do rapaz que lixa a grade na casa vizinha? Mais de duas semanas, eu acho... e nem é uma grade muito grande... fica na porta da cozinha, e deve ter mais ou menos um metro de comprimento. Barrinhas de ferro paralelas e espaçadas. E ele lixa, lixa, lixa... arranca toda a tinta antiga, com paciência e eficiência, mas sem nenhuma ciência. Acho que ele medita. Não tem pressa de acabar.
Eu mesma, já não consigo controlar a ansiedade de ver a grade pintadinha de novo. Mas o homem apenas lixa, lixa, lixa.
Antes, era o ruído de uma faquinha que ele usava para arrancar a camada mais grossa da tinta envelhecida. Aliás, várias camadas, todas sobrepostas, por anos e anos de pintura inadequadamente feita. Porque os pintores anteriores não lixaram a tinta velha antes de passarem a nova. E a faquinha batia no ferro, compassadamente, quebrando o silêncio da manhã, entrecortada pelos passarinhos.
Uma visita me perguntou que barulhinho era aquele, e eu mostrei a ela o homem que raspava (agora, o homem que lixa).
Penso: "Por que ele não usa logo um maçarico e acaba com isso? Quem, afinal, se importará se uma gradinha de nada como aquela foi totalmente lixada, a tinta velha totalmente removida? E se fosse uma grade extensa, medindo quilômetros, como a do meu outro vizinho?" Mas ele, alheio às minhas especulações, concentra-se em seu trabalho de lixar.
O homem que lixa está se lixando para o mundo...
Na síntese de tua conclusão, cabe o mundo do sentido. Muito bom ler-te, Ana. Boa semana! Bjs
ResponderExcluirAs vezes precisamos exercitar a fazer do som uma canção.
ResponderExcluirE ele deve pensar assim eu lixo e não me lixo.
Mas no fim faço bem feito.
Mas que barulhinho chato esta lixa.
Meu abraço.
O mundo não lhe importa,apenas o lixar e lixar e dizer eu fiz bem feito patroa.
ResponderExcluirBelo texto do olhar cotidiano.
Meu abraço amiga.
quando posso gosto de guardar coisas que me ensinam, me trazem lições de vida e a filosofia oriental, me traz tanto aprendizado... um filme que guardei, por amor, por tão bela lição... por mim passaria pelo menos uma vez ao mês para as crianças, já que a família se mostrou incapaz de educar para a vivência e a religião e a escola entregaram os pontos, também incapazes... Karatê Kid é o meu filme e a sua essência é a mesma mensagem que esse senhor passa no seu fazer... que sorte a sua de conviver mesmo que indiretamente com esse ser superior... eu queria pessoas assim à minha volta, com certeza seria mais feliz... bjuuu
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