witch lady

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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Infelizmente, Extremamente Contemporâneo








Pensamentos de Adolf Hitler - um dos homens mais letais que já pisou este planeta. Infelizmente, temos que admitir a atualidade de seus pensamentos, e também aceitar que o mundo não mudou quase nada após o nazismo. Continuamos cometendo os mesmos erros.







“Torne a mentira grande, simplifique-a, continue afirmando-a, e eventualmente todos acreditarão nela” 







“Que sorte para os ditadores que os homens não pensem.”







“Toda propaganda tem que ser popular e acomodar-se à compreensão do menos inteligente dentre aqueles que pretende atingir.” 







“O Cristianismo é uma invenção de cérebros doentes.” 







“A natureza é cruel; então também estamos destinados a ser cruéis. Temos de ser cruéis. Temos de recuperar a consciência tranquila para sermos cruéis.” 








“O vencedor não será perguntado se ele falou a verdade.” 






“A propaganda não pode servir à verdade especialmente quando possa salientar algo favorável ao oponente.” 







“Na guerra eterna a humanidade se torna grande - na paz eterna, a humanidade se arruinaria.” 







“Qualquer aliança cujo propósito não é a intenção de iniciar uma guerra é sem sentido e inútil.” 








“Onde Napoleão falhou, obterei sucesso, vou desembarcar nas praias da Inglaterra.” 







“De um fraco cosmopolita transformei-me (em Viena) num grande anti-semita.” 






Mudar-se








Tem gente que detesta a confusão das mudanças. Montes de coisas que a gente tem que decidir se leva com a gente ou se doa ou descarta; Todo o trabalho de embrulhar louças e objetos frágeis em toneladas de folhas de jornal e depois arrumar tudo em caixas etiquetadas. E, chegando na nova casa, desembalar tudo, lavar e guardar nos devidos lugares - processo que pode durar muitos dias, ou até mesmo meses!

Já passei por isso quatro vezes ao longo da minha vida, e adorei todas elas! A gente tem que remexer nos armários, e acaba encontrando coisas que já tínhamos esquecido que estavam por lá - algumas delas, achávamos que tínhamos perdido! E daí, quando percebemos, estamos sentados diante de uma pilha de livros que gostaráimos de reler. E começamos ali mesmo. Ou quem sabe, encontramos velhas fotografias de viagens ou datas comemorativas, onde pessoas que não vemos há muito tempo, nos olham de volta; algumas delas, jamais voltaremos a encontrar. Simplesmente, se foram de nossas vidas, ou deste mundo.

Eu adoro chegar em uma casa nova e decidir onde colocar as minhas coisas até que ela tenha cara de lar, até que ela se pareça comigo e com meus novos sonhos e objetivos. É como se um novo recomeço nos estivesse sendo oferecido. Andar por um novo bairro, cumprimentar novos vizinhos...

Mas apesar de amar mudar, acho que ainda ficarei nesta casa por muito tempo, pois adoro o lugar, os vizinhos e a casa. Aqui, bati um recorde de permanência: enquanto nas outras casas nós permanecemos por exatos sete anos, nesta já estamos há onze. Só morei mais tempo em uma casa quando era ainda solteira - a casa dos meus pais, onde vivi durante vinte e seis anos. Às vezes me pergunto se terminarei meus dias aqui.

Mas acredito que, se nós envelhecermos, esta casa vai ficar muito difícil de manter, e teremos que nos mudar para algum lugar bem menor. Mudar de casa é um exercício de desapego. O que levaremos conosco?

Algumas pessoas não conseguem se livrar de nada. Não doam nada, não vendem, não emprestam e não trocam. Porém, continuam adquirindo coisas e mais coisas. Conforme vão envelhecendo, suas casas vão se transformando em lugares atravancados e empoeirados, por onde fica difícil cuircular ou até mesmo, respirar.  Limpar? Tarefa hercúlea, praticamente impossível! Acho que elas pensam que, de alguma maneira, estas coisas as segurarão aqui, mantendo-as vivas: "Tenho muita coisa para cuidar." Mal sabem elas que a morte é democrática, não tem preconceito de classe social, e não se importa se quem ela leva é rico ou pobre, jovem ou idoso, se possui muitas coisas ou não. Apegam-se a objetos como se eles fossem a garantia de que permanecerão vivos por mais tempo. E então, fica tudo por aí...

Depois que eles morrem, ficam os copos de cristal que nunca foram usados, o aparelho de jantar que nunca foi partilhado em uma mesa, a colcha bordada pela avó que permaneceu anos e anos trancafiada no fundo do armário em um saco com naftalinas, roupas e mais roupas que pertenceram a várias fases da vida e que poderiam ter aquecido o inverno de muitas pessoas, livros que poderiam ter sido doados a escolas e hospitais, e sobre os móveis, bibelôs que serão jogados fora sem a menor cerimônia. 

Eu não quero ser assim. Não quero ter esse grau de apego às coisas. Adoro tudo o que tenho, mas não quero que aquilo que eu tenho me possua. Sou muito grata por saber que as coisas tornam a minha vida mais fácil, mas que seu tempo comigo vai passar, e então elas pooderão continuar sendo úteis a outras pessoas. 

Quando nos mudamos para esta casa, nossos pertences couberam em uma viagem de caminhão. Hoje, como a casa é maior, eles aumentaram, mas se tivesse que me mudar para um lugar menor, sei que o faria sem me lamentar pelas coisas que ficariam para trás. Vez ou outra, faço um "esvaziamento" de espaço. Acho que a vida fica mais leve...




quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Passam as Águas








Sob a ponte passam as águas.
Sobre ela, passam as mágoas.
Sob e sobre, tudo passa,
Passam as águas, passam as mágoas.

Passam as dores e os horrores,
Passa o que nunca mais passava.
Passam amores e rancores,
Passam os barcos e as algas.

Passa o medo de sonhar,
E a noite também passa.
Passa o medo de acordar,
Quando a tristeza  também passa.

Sobre a ponte, sob a ponte,
Passam as almas que se foram
Na mais longa das viagens;
E a saudade, um dia, passa.

Passa o passado em tons  sépia,
Busca um futuro que não passa...
Segura na mão o presente,
Pois que ele também passa.

Sob a ponte, sob os olhos,
Sob os dedos, só não passa
A essência do que fomos
Fica, da vida, a graça.





You Don’t Know Jack!










If you really want to know
Something about me,
All I can tell you is that
My life’s a speck of dust
-In this I trust.
Apart from that,
I don't know much
And you don’t know jack.














domingo, 21 de fevereiro de 2016

ASSINATURA









Tenho, de cada gesto e palavra,
A escritura,
E dou gargalhadas
Daquilo que normalmente constrange.

Diante de tudo, um único rosto:
Seja alegria, dor, ironia, desgosto.
Estar inteira, e por completo
No meu céu ou inferno predileto.

Não , não há qualquer necessidade,
De desvelar o que está claro,
De encobrir o que é gritante
Se até meu ódio é diletante.

Piso com patas de elefante,
E espio com olhos de lince
Tudo aquilo que me cerca,
Tudo aquilo que me atinge.

Fascinam-me deveras
Enigmas e esfinges,
Olhares de fera
Palavras de estilingue.

E sob tudo o que permeio,
Do começo ao fim, e no meio,
Da lucidez à loucura,
Deixo, inconteste, hoje, e sempre,
A minha velha assinatura.



Ana Bailune


I'LL CRY








I'll CRY


When there's nothing else to try for,
I'll cry.

When rivers are blood,
My sadness will flood
Over a dry land.

I'll walk through the meadows
That once were alive,
 Transpassing their shadows
Remembering light.

I'll kneel on the sand
And face a dead sea
Where only death dives
And mourn for these times.

When nothing else matters,
I'll cry.










MARILYN








“Não me alimento de 'quases', não me contento com a metade! Nunca serei sua meio amiga, ou seu meio amor. É tudo ou nada.” 








“Eu estou bonita, mas não sou bela. Tenho pecados, mas não sou o diabo. Sou boa, mas não um anjo.” 








“A imperfeição é bela, a loucura é genial e é melhor ser absolutamente ridículo que absolutamente chato.” 





“Às vezes, as coisas boas desmoronam para coisas melhores acontecerem.” 





“Quando chega o momento certo, eu os deixo pensarem o que quiserem. Se eles se importam o suficiente para se incomodar com o que eu faço, então já estou melhor do que eles.” 






“Se eu tivesse cumprido todas as regras, eu nunca teria chegado em qualquer lugar.” 






“Os homens passam, os diamantes ficam.” 





“Uma carreira é construída em público, talento em privado”




sábado, 20 de fevereiro de 2016

Clarice na Casa









Um pensamento de Clarice Lispector sobre o amor - e o quanto ele está relacionado a tudo o que somos, à casa onde moramos e às coisas que almejamos:


“Desculpa, mas não entendo. Eu quero tudo e mais ainda. Amor tem que encher o coração, a casa, a alma. Pouco ou metades nunca me completaram.” 

 Clarice Lispector







Eu Sou Uma Linha









Eu sou uma linha embaralhada em outras,
Na página inicial de um site qualquer
Onde pululam palavras doces e rôtas.

Uma linha que transpassa muitos corações,
Costura, quem sabe, os rasgos nos lábios,
E arremata muitas outras linhas soltas.

Eu sou um monte de linha embaralhada,
Pedaço de história na beira da estrada,
Quem passa, mal vê, mal sabe, mal olha.

Eu sou uma linha, que de remendada,
É cheia de nós - e está amarrada
Aos passos que passam; agarro-me às solas.

E cada leitura, nem bem me consola,
-Olhar distraído, palavra de esmola,
Que alguém logo esquece, assim que vai embora.




quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

DIREITOS SOBRE O CORPO








Eu acredito ser um espírito que, de alguma maneira, está no comando de um corpo – como um motorista está no comando de um carro. Eu não sou meu corpo, mas nós interagimos e precisamos um do outro para que a vida orgânica seja mantida e a vida anímica possa ser expressada neste plano. Não posso provar nada disso em que eu acredito, e até hoje, não encontrei ninguém que pudesse prova-lo para mim, mas é nisto que eu acredito porque é o que faz sentido para mim. Eu acho que quando eu morrer, minha alma vai deixar este corpo e ir para algum outro lugar – conscientemente ou não. E o meu corpo será destruído. Apodrecerá. Ou seja: deixará de ter importância.

Mesmo assim, o que eu faço ao meu corpo enquanto viva neste plano, tem um efeito sobre a minha alma, pois eles estão interligados. Eu posso optar por cobri-lo de tatuagens. Posso castigá-lo com chicotes até sangrar, achando que assim estarei me redimindo de meus pecados. Posso sair por aí e dormir com qualquer pessoa que eu encontrar, levar uma vida promíscua e descuidada. Posso beber até cair, me encher de drogas alucinógenas, pintar os cabelos de rosa ou de azul, ou raspar a cabeça, colocar piercings no nariz, nas orelhas, no umbigo e em outros lugares menos aparentes. Posso comer sem controle e engordar, ou então enfiar o dedo na garganta após comer, e vomitar até a exaustão. Posso optar por submetê-lo a um sádico e fingir que a dor me causa prazer sexual – afinal, está na moda.

Não sou religiosa, não sigo nenhuma religião e meu conceito sobre Deus é tão diferente do que as pessoas religiosas pensam, que prefiro nem discuti-lo. Mas eu acho que o corpo é sagrado. É através dele que eu expresso a minha alma. O corpo é a casa da minha alma. Portanto, apesar de eu ser livre para fazer com ele o que eu bem entender sem qualquer limite, há coisas que eu não devo fazer. Não é uma boa ideia cuidar mal do corpo, pois quem está vivo, quer que ele dure e seja produtivo durante um período longo.

Tenho cinquenta anos de idade, e não tive filhos por opção. Poderia ter tido, se quisesse, mas eu não quis. Nunca me senti inclinada a ser mãe. Prefiro ter cães. Nada tenho contra crianças ou contra quem optou por tê-las, mas eu preferi não tê-las. Por isso, eu tomei pílulas a vida toda: porque eu queria evitar uma gravidez indesejada. Mesmo assim, aos 38 anos de idade, o inesperado aconteceu: eu me vi grávida. Apesar do susto que eu levei, abortar nem me passou pela cabeça, porque havia um outro corpo dentro do meu corpo, uma outra vida que não me pertencia, não era eu e nem era minha, não vinha de mim. Era um outro espírito que queria manifestar-se e nascer para este mundo. A gravidez não foi adiante; apenas algumas semanas depois, sofri um aborto espontâneo. Não sou de chorar ou me lamentar pelo que não é para ser: aceitei e segui em frente. Aconteceu o que era para ter acontecido, e pronto, e não sei explicar porque. Mas aquela criança poderia ter nascido através de mim.

As mulheres hoje em dia falam em liberdade sexual e direitos sobre o próprio corpo. Concordo com elas: todo mundo tem direito a fazer o que bem entender com o próprio corpo, embora esta liberdade deva ser usada com responsabilidade. Mas quando se trata do direito de engravidar e abortar, essa tal liberdade deixa de pertencer apenas a quem traz um embrião no ventre: é uma outra vida, e assim como a mulher acha que tem direitos sobre o próprio corpo, esta outra vida também deveria ter. Se toda liberdade fosse digna, então não poderíamos censurar um estuprador por estar fazendo apenas o que ele deseja através do seu próprio corpo, ou seja, conseguir um pouco de prazer sexual. Mas esperem: já posso ouvir as mulheres liberadas gritando:

-Mas isso é um absurdo! O estuprador é alguém que força outra  pessoa a fazer sexo com ele contra a própria vontade! Ele está invadindo um espaço que não é dele, e fazendo uso de um direito que não lhe pertence! Ninguém deve dispor da vida de outra pessoa desta maneira!

Concordo. E justamente por concordar, sou contra o aborto. Vejo o aborto como um caso de estupro, onde uma vida sobrepuja outra e faz dela o que bem quiser sem que esta tenha o direito ou o poder de defender-se. Mas acho que estou ouvindo novamente o grito das mulheres liberadas:

-Mas se o aborto não for legalizado, milhares de mulheres continuarão a morrer nas mãos de médicos carniceiros!

Eu respondo: Mãos a que elas se submetem de livre e espontânea vontade, já que estão exercendo o seu direito de fazer do próprio corpo o que bem entendem! Mas se a polêmica sobre o aborto é apenas esta – livrar as mulheres liberadas que querem fazer do próprio corpo aquilo que bem entendem sem que elas corram risco de vida – não seria bem menos arriscado e bem mais aconselhável e sensato tomar a pílula anticoncepcional e/ou usar camisinha? E de onde vem a responsabilidade de uma mulher que sofre uma gravidez indesejada nesses tempos de AIDS? Por que ela não se protegeu? Por que ela não fez sexo seguro? 

Porque ela é uma irresponsável, que clama por uma liberdade para a qual não está preparada. Ela grita por direitos que ela própria não compreende e não sabe utilizar. Ela se arrisca a ter uma gravidez indesejada e até à morte ao fazer sexo sem proteção, podendo inclusive ser responsável por espalhar uma doença mortal entre seus parceiros, mas não quer se arriscar a fazer um aborto em uma clínica clandestina; quer ter o direito de fazer abortos em hospital público – como se estes estivessem em excelentes condições de recebe-las, ao invés de receber quem realmente precisa deles: centenas de milhares de pessoas com problemas de saúde REAIS.

A estas mulheres liberadas, eu tenho o seguinte a dizer: cresçam e amadureçam. E usem camisinha. 






Do Quintal









TE OLHO

Te Olho







Te olho, assim, só de soslaio,
De um microscópio - vejo o ranço,
O triste habitat de um micróbio,
Os pelos verdes de um pão mofoso,
Vejo uma ameba, a nadar na profusão
Nas águas de um mar gelatinoso.

Te olho por curiosidade,
(O bizarro sempre me distrai)
Como quem vai a um show de horrores,
De humor indiferente e jocoso,
Num circo decadente , em tarde de domingo,
Só para fugir de um dia chuvoso.

Te olho, pois bateste à minha porta,
Ornada em paetês, cetins e plumas,
Macramés, brilhos, rapapés,
Desarrumadamente torta,
Na face, um par de olhos mortos
E os dedos nodosos, apontando
As unhas sujas para o meu rosto.

Te olho, pois és um bom exemplo
De tudo o que penso ser medíocre,
E tua insignificância me fascina.
Não sei se o nosso desafeto
É destino, carma, doença ou sina,
Mas te vejo como uma latrina
Na qual despejo meus dejetos.




"Não me peça que eu lhe faça
Uma canção como se deve
Correta, branca, suave
Muito limpa, muito leve
Sons, palavras, são navalhas
E eu não posso cantar como convém
Sem querer ferir ninguém." - Belchior






terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

CHIMERA








She danced in ataxia,
Involved by chimera
Of things she invented
About her fake life...

She looked in the mirror
And saw a strange queen
Whose crown was suspended
Above her bald head...

If only instead
Of making up lies
She could find a reason
To be what she's like!

Oh, what a false world,
Oh, what a false life!
Her ego so huge,
She could not see light!





Não Voltar Para Casa







Acabo de deixar minha aluna no portão, após o término da aula. Hoje de manhã recebi a notícia de que um de meus vizinhos - um senhor idoso que estava muito doente - acabara de falecer.  Apesar de não termos muito contato, nas poucas vezes em que conversei com ele durante estes mais de onze anos que moro nesta rua, pude perceber que se tratava de alguém educado e gentil. 

A casa fica do outro lado da rua, a alguns metros da minha, e pude vê-la do meu portão. Vi as portas e janelas fechadas. Nunca mais ele vai voltar para casa.

Imaginei a solidão por dentro daquelas paredes: os seus objetos favoritos, a poltrona que ainda guarda o formato do seu corpo, as roupas penduradas no cabide - roupas que ele não mais vestirá, as coisas deixadas do jeitinho que ele as arrumou pela última vez, os cantinhos preferidos, os espelhos que tantas vezes refletiram a imagem dele. 

Lembrei-me do que senti quando eu caminhei pela casa pela primeira vez, após a morte do meu pai: acabáramos de voltar do enterro, e a primeira coisa que vi quando abri a porta da cozinha que dava para a área de serviço, foi uma camisa dele que era usada para ficar em casa, displicentemente jogada sobre o varal de roupas. Acho que ele a deixara ali naquela manhã, antes de sair. Sobre a mesa da cozinha, um pacote de biscoitos que ele comprara. No quarto, sob a cadeira, os sapatos com as meias ainda dentro. É difícil caminhar por uma casa quando um dos moradores acabou de morrer.

Da mesma forma, entrar no quarto que pertenceu à minha mãe e sentir ainda o cheiro dela, ver suas roupas todas muito arrumadinhas nas gavetas e armários, mexer nos livros cheios de anotações, números de telefone, endereços, fotografias e flores secas... não foi nada fácil.

E depois, fica sempre aquela pergunta aguda e dolorosa, que ninguém pode responder.




segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

A Casa da Mãe

imagem: Google






Eu e meus irmãos nascemos e crescemos naquela casinha de dois quartos, pelas mãos da parteira Dona Maria Carioca.  A casa era pequena, e precisávamos dividir um único quarto e a sala na hora de dormir, pois o segundo quarto pertencia aos nossos pais. O quarto que partilhávamos era também conhecido como 'quarto do vovô', pois quando ele chegava de suas viagens para nos visitar, nós tínhamos que nos amontoar na sala e ceder-lhe o quarto. Foi assim durante muitos e muitos anos.

Tínhamos um pequeno quintal onde meus pais cultivavam algumas plantas decorativas e também legumes. Por lá, caminhavam livres muitos cães, gatos, galinhas, porquinhos da índia e certa vez, patos. Havia muitas árvores frutíferas: dois abacateiros, um figueiro, um pessegueiro, dois pés de limão galego, uma ameixeira, muitas bananeiras, e às vezes, abóboras, alface couve e tomate. Quando as abóboras do meu pai se derramavam pelo chão, mal havia espaço para pisarmos, e por isso, eles deixaram de plantar abóboras. 

Era um quintal simples, de terra batida. Por ali passaram muitos amigos, e em volta daquela casa, fazendo nossos bolinhos de terra e pintando as unhas com pétalas de flores, nós crescemos. Conforme meus irmãos iam casando e mudando, a casa ia ficando maior. Até que finalmente, meu grande sonho se realizou: ter o meu próprio quarto. E logo depois, descobri que ter o próprio quarto nem era tão bom assim, talvez porque aquilo aconteceu em uma época de pouca saúde para meu pai. Ele morreu quando eu tinha 22 anos, e eu e minha mãe ainda ficamos alguns anos morando sozinhas na casa, até que ela foi morar com uma de minhas irmãs e eu me casei.

Hoje a casa é ocupada por outra de minhas irmãs.

Já falei e escrevi muitas vezes sobre esta casa, e acho que ainda o farei durante muito tempo - quem sabe, pelo resto da vida. A casa da mãe é um lugar que a gente não abandona, nem mesmo quando casamos e vamos embora, pois a levamos conosco. E todas as experiências boas e ruins que lá tivemos também passam a fazer parte das nossas vidas de aultos, não importa quantos anos tenhamos.
Aquela casa foi um presente de nosso avô, que os pais dele compraram quando vieram da Itália, através da renda das frutas e legumes que vendiam de porta em porta.

 Minha mãe contava que quando ela se casou e foi morar lá, quase não havia nada em volta, nem outras casas e nem vizinhos. A rua não era calçada, não tinha ônibus, quase não passavam carros. Só havia muito mato e muitas árvores, e ela se sentia muito sozinha, até que aos poucos, outras casas foram sendo construídas em volta da nossa. Alguém colocou luzes e paralelepípedos nas ruas, e os ônibus começaram a passar. 

Uma das  boas lembranças que trago daquela casa e daquele bairro são os vizinhos e amigos com quem nos relacionávamos diariamente. As crianças brincavam na rua depois da escola. Nós brincávamos de bola, de fazer cabanas de bambú, de guerra de lama e de mamona (naquela época ninguém sabia que as mamonas eram plantas venenosas, e quem sabe, a inocência nos tenha salvo?) e também de pique-esconde, passa-anel, e outras brincadeiras que as crianças de hoje nem sequer ouviram falar. No domingo de manhã a gente se reunia para falar do filme que passara na Primeira Exibição na noite de sábado. Geralmente, o filme ficava sendo anunciado várias vezes diarimente durante mais de uma semana antes de ser exibido, e isso criava uma enorme expectativa na gente. Ainda me lembro de "O Grito do Lobo", um filme de terror que me rendeu um conto de humor publicado neste blog em 2012.

As coisas eram mais intensas, mais esperadas e desejadas. Não havia preocupações com a decoração das casas - elas tinham que ter o necessário para que fossem limpas e funcionais, e isso era tudo. Os espaços comuns eram partilhados sem muita preocupação sobre mantê-los arrumados, e privacidade era algo que se tinha durante alguns minutinhos por dia, quando se entrava no banheiro. Dividíamos os quartos, os armários, a mesa da cozinha, as histórias, os gibis, as rusgas, os brinquedos, os doces que comprávamos no bar da esquina, a garrafa de Coca-Cola. Tudo era mais 'desencanado.'  Ninguém fazia dramas sobre os acontecimentos da vida - mortes, mudanças, doenças. Tudo era o que tinha que ser, e a gente simplesmente aceitava tudo como era. As pessoas não choravam muito, e ninguém jamais ouvia falar em coisas como depressão e psicólogos. Resolvíamos nossos próprios problemas, ou então, deixávamos que se resolvessem sozinhos. 

A casa da mãe era o ponto de referência para onde todo mundo voltava no domingo, após a semana de trabalho. O nosso centro. Na verdade, acho que nem era bem a casa da mãe, mas sim, a mãe. A própria mãe. Nenhuma família continua a mesma depois que  mãe morre.



Parceiros

VERDADES

Alguns falam de doçura, Desconhecem O regurgitar das abelhas, O mel que se transforma dentro delas, Dentro das casas de cera. Falam do luxo ...