witch lady

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sábado, 31 de março de 2012

Aventuras em Minas







Há muitos anos - tantos, que nem me lembro se foi em 2004 ou 2007, quem sabe, um pouco antes ou depois - meu marido e eu saímos em uma aventura pelas cidades históricas de Minas Gerais. Foi durante o mês de inverno mais frio, ou seja, junho. Tínhamos planejado apenas o nosso quartel general, que ficaria localizado em Tiradentes. O resto, deixamos ao acaso. Não tínhamos roteiro.




Foi uma viagem e tanto! Acho que a melhor que eu já fiz na vida. Fomos de carro, parando quando tínhamos vontade, e virando as curvas que desejávamos. Nada de planejamentos e horários.




Bem, ao chegarmos em Tiradentes, em pleno Festival de Inverno, achamos a cidadezinha lotada. Ainda bem que tínhamos feito reservas! E nossas reservas, feitas por telefone, foram em uma pequena pensão, uma das poucas que restavam que ainda tinha quartos vagos: a Pensão Uélerson. Isso mesmo, Uélerson!




Chegamos já no final da tarde de sábado, cansados e com fome. O lugar era extremamente simples, e meu marido coçou a cabeça ao ver os lençóis e toalhas pendurados em um varal no estacionamento. Eu disse: "Calma! É sinal de que eles lavam as roupas!"




Ao entrarmos no quarto, deparamos com uma cama de casal e uma pequena TV que pegava mal pacas. O chão era forrado com carpete roxo, e o banheiro, de pobre, mas limpinho. Mais uma vez, meu marido rosnou, ao olhar para o carpete roxo: "Eu não vou ficar aqui!" Mais uma vez, eu tentei acalmá-lo: "Calma! Nós não vamos morar aqui!" 



MAs ele teimou em mudar-se. Demos uma volta pela cidade, e encontramos todos os hotéis, pousadas e pensões lotados. Voltamos para o nosso quartinho na Pensão Uélerson de rabinhos entre as pernas e orelhas baixas.



No dia seguinte, descemos para o café da manhã, e ficamos mais animados: pão fresquinho, um excelente café, leite, doces em compotas, queijos, frutas e pão-doce. Bom demais!


No dia seguinte, deixamos o quarto na Uélerson reservado, e nos hospedamos em Ouro Preto. Conseguimos vaga por mero acaso, pois lá também estava tudo lotado. O quarto era minúsculo, acho que eles nem sequer alugavam aquele espaço, mas como nós imploramos, arranjaram-no para nós. Mas foi muito gostoso. A janela tinha vista para os telhados dos prédios históricos, e a torre de uma igreja. Bucólico e maravilhoso! Adorei Ouro Preto, e espero poder voltar lá algum dia.



Visitamos Mariana, Tiradentes, Ouro Preto, Ouro Branco, Congonhas... foi a melhor viagem, pois a única coisa que sabíamos ao sair, é que tínhamos um lugar para dormir em Tiradentes e um destino totalmente em branco à nossa frente. E decidíamos para onde ir no dia seguinte, durante o café da manhã.


Bom demais passear.











A PASSAGEM DO TEMPO SOBRE AS COISAS - CORDEL







A PASSAGEM DO TEMPO SOBRE AS COISAS

Tem coisas que o tempo apaga, 
E outras que o tempo aviva...
Ao mesmo tempo que apaga,
Deixa sempre uma lembrança,
E ao mesmo tempo que aviva,
Varre da memória ativa
Muita história já vivida
Levando toda a esperança!

Tem coisas que o tempo mata,
E outras que ressucita,
Mas quando mata, ainda sobra
Um resto que 'inda se agita
E aquilo que ressucita
Nunca traz tudo de volta,
Deixa um fio de saudade
No peito, ânsia que grita.

Tem coisas que o tempo apaga, 
E outras que o tempo aviva...
Da paixão, apaga o fogo
Do amor, aviva a chama,
E o coração de quem ama
Permanece sempre aceso
Enquanto da paixão pura
Depois do incêndio na cama
Sobra um carvão de loucura.

Tem coisas que o tempo apaga,
E outras que o tempo aviva...
Aviva um reencontrar-se,
Apaga uma despedida...
Mas deixa sempre uma história
De chegadas e partidas,
E no livro da memória
Enfileirada em palavras 
Uma dor lida e relida...

Tem coisas que o tempo apaga
E outras que o tempo aviva...
Apaga uma dor causada,
Avivando uma amizade
Mas às vezes, já é tarde
E a palavra proferida
Causa um dano irreversível
E ao invés de cicatrizes,
Deixa uma ferida viva...

Tem coisas que o tempo apaga
E outras que o tempo aviva...
Ninguém é senhor do tempo,
Mas o tempo é um senhor
Que passa por sobre as coisas
Deixando um rastro marcado
De adeus e despedida
Mas também de recomeços
Pela estrada dessa vida...

sexta-feira, 30 de março de 2012

FRAUDE

Psychosocial

I did my time, and I want out!  Cumpri minha pena, e quero sair
So effusive fate,                          Destino tão efusivo
It doesn't cut, this soul is not so vibrant. Não corta, esta alma não é tão vibrante
The reckoning, the sickening.  A estimativa, o doentio
Packaging, subversion.             Embalagem, subversão
Pseudo-sacrosanct perversion      perversão pseudo-sacrossanta
Go drill your deserts, go dig your graves!  furar seus desertos, cavar sua sepultura!
Then fill your mouth with all the money you will save. E encher sua boca com todo o dinheiro que guardar
Sinking in, getting smaller again.   Afundando, diminuindo outra vez
I'm done! It has begun, I'm not the only one!  Terminei! Começou, não sou o único!

And the rain will kill us all.    E a chuva matará todos nós
We throw ourselves against the wall.       Nos jogamos contra a parede
But no one else can see.     Mas ninguém mais pode ver
The preservation of the martyr in me.   A preservação do mártir em mim

Psychosocial Psychosocial Psychosocial  Sociopata, sociopata, sociopata
Psychosocial Psychosocial Psychosocial  Sociopata, sociopata, sociopata

There are cracks in the road we laid.  Há rachaduras na estrada onde nos deitamos
But we're the temple fell, the secret have gone mad. Mas somos a sujeira do templo, o segredo enlouqueceu
This is nothing new, but when we kill it all? Isto não é novidade, mas quando mataremos tudo isto?
The hate was all we had!  O ódio era tudo o que tínhamos
Who needs another mess, we could start over.Quem precisa de outra bagunça, poderíamos recomeçar
Just look me in the eyes and say I'm wrong! Apenas me olhe nos olhos e diga que estou errado
Now there's only emptiness, venomous, insipid   Agora só há vazio, malicioso, insípido
I think we're done, I'm not the only one! Acho que terminamos, não sou o único

And the rain will kill us all. E a chuva matará a todos nós
We throw ourselves against the wall. Nos jogamos contra a parede
But no one else can see. Mas ninguém mais pode ver
The preservation of the martyr in me. A preservação do mártir em mim

Psychosocial Psychosocial Psychosocial Sociopata, sociopata, sociopata
Psychosocial Psychosocial Psychosocial Sociopata, sociopata, sociopata

The limits of the dead! (4x) Os limites dos mortos!

Fake! Anti-Fascist lie, (Psychosocial) Fake! Mentira anti-facista!
I tried to tell you but, (Psychosocial) Tentei  te avisar, mas
Your purple hearts are giving out. (Psychosocial) Seus corações roxos estão desistindo
Can't stop the killing idea. (Psychosocial) Não consegue parar a idéia de matança
If it's hunting season. (Psychosocial) Se é a estação de caça
Is this what you want? (Psychosocial) É isto que você quer?
I'm not the only one! Não sou o único!





Vivendo a vida que não tinha,
Contando histórias tão perfeitas,
A pobre alma rarefeita
A embriagar-se pelas vinhas

De mil parreiras que não tinha,
E de um vinho inexistente
Embebedou-se, imprudente,
Quebrando os dentes de sorrir

Com um sorriso tão amargo,
Assassinando cada bardo
Ao escrever com obscenas
E inecrupulosas penas...

O coração empedernido
Por fora, mas por dentro havia
O hemorrágico esvair-se
De dois ventrículos sofridos...

Não tinha rosto, só desgosto,
Que adaptava-se às paragens
Daquelas vidas que criava,
Tão absurdos personagens!

Criava histórias, como a aranha
Que entretecia sua teia,
E as escrevia na areia
Que uma onda sempre apanha...

Abandonada, ela sofria
(Mas era menos que um dia),
Pois logo, a mente se desdobra
Em outro verso, em outra trova...

Nasciam sempre mil personas
Da fronha do seu travesseiro,
E ela as paria o dia inteiro,
Por desespero e por peçonha...

Ela afogava-se no fundo
De um mar revolto e asfixiante,
Sem perceber, por um instante,
Que a si mesma ela perdia...

Até que um dia, estava morta,
E no inferno, a companhia
Das mil personas que criara
E ela nem as conhecia...



A ANSIEDADE DO QUERER






Muitas pessoas perdem tudo por desejarem ansiosamente. É como o homem que armou uma arapuca para pegar um pássaro, e quando o pássaro se aproximava, não pode conter sua ansiedade e saiu desembestado de trás da moita aonde se escondia, espantando o pássaro. Sei que é uma imagem cruel, mas é a melhor que consegui para ilustrar o que penso.

Acho que precisamos aprender a controlar a nossa ansiedade, e a jamais depositarmos a nossa felicidade na realização de alguma coisa. Antes de obtermos o que queremos, precisamos estar felizes e tranquilos. Então, e só então, estaremos prontos para colher o que plantamos. Agora veio-me uma outra idéia que li em algum texto, não me lembro de quem: a menininha que, na ansiedade de ver brotar a semente que tinha plantado, todos os dias tirava-a do vaso. Resultado: a planta não crescia nunca!

Eu acredito que o segredo está em:

1) Definir, com certeza, aquilo que se quer. Ninguém terá alguma coisa se, secretamente, luta contra ela! Muitos querem ter algum bem material, mas ao mesmo tempo, vivem afirmando que o dinheiro é coisa do diabo. Ora, então, como obter alguma coisa que depende dele?

2) Tendo definido aquilo que se quer, começar a 'mexer os pauzinhos.' Ou seja: correr atrás. Nada cai do céu, a não ser bomba, cocô de pombo e aeronave. 

3) Acreditar em um resultado positivo. Não subestimar-se, achando que não merece. Parece óbvio, mas tantas e tantas vezes, ouço pessoas dizendo que não são dignas disso ou daquilo. Por que não? Por que achar que a felicidade é produto de luxo, e que só algumas poucas pessoas a merecem?

4) Se não estiver dando certo, mudar a estratégia; também vale analisar: "Estou prejudicando alguém? Alguém sofrerá, para que eu obtenha o que desejo?" Se a reposta for positiva, mesmo que você obtenha o que deseja, no fim, não será feliz.

5) Estou sendo sincero comigo mesmo, ou estou apenas seguindo aquilo que a maioria acredita? Muita gente pensa que só pode ser feliz se tiver alguém do lado, como uma muleta. Que a resposta está no outro. Mas eu acho que primeiro, a gente precisa se amar e sentir-se feliz e agradecidos pela vida que temos; isso fará com que outras pessoas se aproximem, e quem sabe, o cara-metade não estará entre elas?... Mas conheço pessoas solteiras, independentes e felizes.

6) Lembrar-se sempre de agradecer. Com sinceridade. E frequentemente, se possível, várias vezes ao dia.

7) Não deixar que acontecimentos tristes contaminem todos os aspectos da vida. Posso estar muito triste, imensamente triste por algum motivo, e mesmo assim, encontrar prazer nas outras coisas, por exemplo, minha vida profissional pode não estar indo muito bem, mas a vida amorosa vai às mil maravilhas. Ou, de repente, não tenho o lugar que desejo para morar, mas tenho muitos amigos que sempre me alegram. Se formos esperar até que tudo esteja perfeito para que sejamos felizes, chegaremos à velhice como pessoas frustradas e vazias. Ninguém é feliz o tempo todo, em todos os aspectos. Aproveitemos as boas marés da vida, e aprendamos com as ruins.

8) Desligar-se do passado. Dele, que só possamos trazer conosco as boas lembranças, jamais as angústias e mágoas. E mesmo as boas lembranças devem ser deixadas de lado a maior parte do tempo.

9) Acreditar que aquilo que nos pertence, que é nosso, acabará vindo a nós, se fizermos um esforço. Se não veio ainda, é porque não estamos preparados.

10) E se não vier de jeito nenhum, conformar-se, acreditando que nem sempre sabemos, de verdade, o que é melhor para nós, e que não recebermos aquilo que desejamos pode ser uma bênção disfarçada!

quinta-feira, 29 de março de 2012

A ESPERANÇA





A esperança teceu sua longa trança
Cuidadosamente, aos fios dos meus cabelos.
Por muito tempo, te confesso, adormeci
Tendo esta trança enrodilhada entre meus dedos.

Atrás de mim a arrastei pelos caminhos,
E vez ou outra, ela prendia-se entre espinhos,
E por mais dor que me causasse a minha andança,
Estava eu sempre a arrastar a esperança!

Dela eu vivia, adormecia, despertava,
Sem perceber quão lentamente eu caminhava!
Devido ao peso da esperança alimentada,
Presos meus passos à esperança que arrastava!

Até que um dia, a esperança enfim, morreu.
Tornei-me livre, muito mais leve, bem mais eu!



anabailune

O QUE ANDO FAZENDO?





Bem, tenho tido um pouco mais de tempo livre, e a fim de ocupá-lo de maneira adequada, decidi aprender coisas novas. Por exemplo: dia desses, achei que seria legal e divertido aprender a fazer PPS - aqueles slides com musiquinha e mensagens edificantes que a gente manda por email. Fiquei a tarde toda no power point e na net, buscando informações e fazendo experiências. Após algumas horas, fotos, escolha de música, textos e alguns palavrões, terminei meu primeiro PPS.


Apertei lá: "exibir slides."


A surpresa que eu esperava não aconteceu. O troço ficou preso no primeiro slide, e a musiquinha só tocou após uns dois minutos. Como a coisa não andava, resolvi clicar para ver o próximo slide, e a cada clique e mudança de slide, a música recomeçava do zero. Apaguei tudo, e vou tentar de novo mais tarde. Muito mais tarde. Mas não vou desistir!


Sábado passado, decidi que ia aprender a formatar o computador, e que nunca mais encheria a paciência dos meus pobres sobrinhos para virem aqui em casa formatar para mim. Futuquei, futuquei e descobri que os novos computadores da DELL fazem isso sozinhos, basta apertar um botão. Eu apertei, e a formatação começou. Senti-me muito poderosa, até que me lembrei, assim como quem não quer nada, que tinha esquecido de fazer um backup.


Perdi todos os meus arquivos de 2012: fotos, vídeos, aulas de gramática e textos de inglês, músicas e downloads. Beleza. A gente só aprende errando, eu disse para mim mesma. Mas não sem antes xingar mais alguns palavrões entre os dentes, me perguntando por que eu não tinha colocado meus arquivos na droga do HD externo que eu comprei.


Bem, acho melhor tentar pintura em cerâmica, antes que eu ponha fogo na casa.





CAFÉ COM O DIABO










CAFÉ COM O DIABO





Bateram à porta, em uma tarde de quinta-feira, logo após o almoço. Estava pronta para tirar uma soneca na rede da varanda, e a batida incomodou-me. Fingi não estar em casa, mas a criatura do outro lado da porta insistiu. Já estava quase aos socos, quando eu abri a porta, pronta a dar uma bronca daquelas, e deparei com aquele ser bizarro; desarmei-me, diante de tanta peculiaridade:



Ele era marrom-esverdeado, e tinha um par de chifres pequeninos na testa. Cabelos curtos e crespos, avermelhados. Dentes pontiagudos e língua bipartida. Os olhos eram verde-esmeralda, as pupilas, finas como as de uma cobra. Os pés – exatamente como na Divina Comédia de Dante – terminavam em cascos. As mãos eram peludas, dedos e unhas compridos. 



Ele segurava a cauda pontuda em uma das mãos, fazendo-a rodopiar, e com o outro braço, apoiava-se no tridente, de maneira relaxada e displicente.



Eu tinha a impressão de que já nos encontráramos antes, mas não conseguia me lembrar de onde, exatamente... fiz a pergunta inevitável, embora já soubesse a resposta:



-Quem é você?



Ele virou os olhinhos, suspirando profundamente:



-Ai, ai, ai... tsc...tsc... e ainda pergunta? Vai me deixar entrar ou não vai?



-Escute, eu estava indo... eu... enfim, estou ocupada, agora. Pode voltar depois.



Disse aquilo e tentei fechar a porta, mas ele impediu-me com a cauda, dando um gritinho quando a porta bateu nela:



-Aiiii! Isso não foi nada gentil!



-Desculpe, eu não pretendia...



-Olha, amiga, ou você me deixa entrar, ou eu vou ficar aqui, de plantão, falando mal de você para a vizinhança inteira. E olha que eu tenho muito tempo!



Ficamos nos olhando durante algum tempo, e como não me veio à cabeça nenhum argumento plausível, abri a porta e fiz um gesto para que entrasse. Ele adentrou minha sala de estar, olhando em volta, parecendo estar reparando na decoração. Convidei-o a sentar-se, e ofereci-lhe uma xícara de café:



-Só se for fresco, passado na hora. Café requentado, nem o diabo agüenta!



Dirigi-me para a cozinha, e comecei a preparar o café. Enquanto colocava a água na cafeteira, assustei-me, ao ouvir sua voz bem ao pé do meu ouvido (ele estava bem atrás de mim):



-Cafeteira elétrica, é? Por isso que eu prefiro aquelas cidadezinhas do interior... eles sim, sabem fazer café de verdade. Mas enfim... fazer o que, não é? É o progresso...



Andei para o outro lado da cozinha, ficando o mais longe dele possível, e tentando não demonstrar a minha repulsa:



-Afinal de contas, o que você quer? Como já disse, eu estava indo... eu estou ocupada, e não tenho a tarde toda.



-Nana, nina, não... você tem a vida toda. Se bobear, uma eternidade, se é que você me entende! Mas... que belo pingüim, esse da sua geladeira –ele disse, segurando-o com suas mãos escorregadias- Onde o comprou? Aliás, também a-do-rei as almofadas da sala de estar! Depois você pode me dar umas dicas, querida!...



Era só o que me faltava! Um diabo com jeito de gay e interessado em decoração!



De repente, ele recolocou o pingüim em cima da geladeira, olhando-me:



-O que foi? Você parece um tanto... desconfortável! Será esse meu jeitinho? Sei que você tem tendências homofóbicas! 


-Ei, eu não tenho...


-Tem sim! Tem sim! Tem sim, tem sim, tem sim! – Ele começou a gritar, dançar e pular pela sala. Aquilo começou a me irritar. Sempre detestei manifestações emocionais exageradas.


-Escute aqui, fala logo o que você quer e se manda daqui! Eu não tenho absolutamente nada contra os gays!


-Ah, é mesmo? Então por que se recusou a sentar-se perto de um, quando estava na escola? Por que desistiu daquele emprego, quando soube que a sua chefe era lésbica? Por que xingou o professor da faculdade de viado quando ele te reprovou? Hein?



Engoli em seco. Naquele momento, o café ficou pronto, e coloquei duas xícaras, açucareiro, uma leiterinha e uma tigela com biscoitos em uma bandeja, levando tudo para a sala. Ele se sentou, e começou a se servir, perguntando logo se eu não tinha bolo. Respondi que não, e fiquei olhando-o comer, e percebi que ele não tinha boas maneiras (o que eu odiava em uma pessoa): derramava gotas de café no estofado, e farelos de biscoito no tapete. A mesinha de centro ficou cheia de açúcar. Fiquei vermelha de raiva, pois eu tinha mania de limpeza. Ele parecia que sabia exatamente como me irritar. Sorriu-me, mostrando a língua bipartida.



-Você está louca para saber por que eu estou aqui, não é? Pois bem; olha, me desculpe qualquer coisa... sei que minha aparência e meu jeitinho te a-mo-fi-nam, e se quiser, posso tomar outra forma.



Dizendo isso, ele começou a transformar-se na minha frente: primeiro, no vizinho irritante com quem eu estava brigada há anos; como viu que não gostei, foi aos poucos virando, bem na minha frente, a periguete que roubou meu ex-marido. Quase avancei nele, mas antes que eu o fizesse, vi-o mudar para a minha atual sogra. E assim, ele foi se transformando, cada vez mais rapidamente, em todas as pessoas com quem eu já tivera uma briga, ou cujo comportamento me irritavam e causavam-me desaprovação. Finalmente, ele tomou a forma mais inesperada possível: lá estava eu, diante de mim mesma! Não foi muito fácil, reconhecer aquela cara mau-humorada e a expressão de superioridade; muito menos, sustentar o olhar julgador e o sorriso de escárnio. Mas aquela era eu, sem a menor sombra de dúvida! 


E para meu total espanto, era a face na frente da qual eu me sentia mais desconfortável. Pedi-lhe que assumisse novamente sua forma normal, mas eu – ou melhor, ele- ergueu as sobrancelhas, e ouvi minha própria voz, dizendo:



-Não... é este demônio que você precisa aprender a dominar.



-E desde quando o diabo ajuda alguém? Olha, conheço os seus truques! Na Bíblia Sagrada, está escrito que...



-Ora, cale essa boca! Nós dois sabemos que você não acredita em dez por cento do que está escrito ali! Sabemos que você só vai à igreja de vez em quando para ser sociável, quando tem casamento, missa de sétimo dia ou batizado. Deixe de ser hipócrita! 



Naquele momento, não suportando mais tanta audácia, comecei a rezar um Padre-Nosso, em voz alta. Ele olhou para cima, demonstrando impaciência, pegou uma lixa de unhas no bolso e pôs-se a lixar as unhas, displicentemente, exatamente como eu costumava fazer, quando queria irritar meu noivo e fingir que não estava escutando o que ele falava. Parei de rezar, e olhei para ele. Ele riu, jogando a cabeça para trás:



-Querida, foi Ele quem me mandou aqui! Ele, o Todo-Poderoso, entende? Deus, a Força, o Senhor do Universo, o Pai! Nem adianta rezar.



-E desde quando Deus tem pacto com o diabo?



-Mas você é burra mesmo, hein? (Aquela era minha própria voz, exatamente como eu me dirigia aos meus funcionários). Deus não precisa ter pacto com ninguém, ó trouxa! E nem precisa dessas orações ridículas que vocês dizem para conseguir Dele o que querem. Ele sabe exatamente do que vocês precisam, e por isso, me criou! Sem mim, vocês jamais evoluiriam, indo finalmente, voltar às suas origens...



-Origens?...



-É! O final de todos os seres humanos, é voltarem a ser unos com o Pai! Mas antes, precisam consertar uns defeitinhos de fabricação... sabe como é, Deus cometeu alguns errinhos ao criar a humanidade, e agora, está fazendo um recall... chegou a sua vez!



-Recall? Mas... como assim?! Se Ele nos criou, por que não pode corrigir Seus erros sozinhos? Por que Ele precisaria criar você? E dar-lhe, ainda por cima, essa forma... horrorosa, bizarra?



Ao dizer isso, ele assumiu, novamente, a sua forma de diabo:


-Esta? Não foi Ele quem me fez assim, foram vocês! Bem, eu vou explicar desde o início.



Dizendo isso, ele serviu-se de mais uma xícara, recostando-se na poltrona e derramando mais café na almofada:


-Foi mais ou menos assim: Tudo começou há muito tempo. Deus vivia sozinho no universo, e entediado, decidiu criar uns playmobill para divertir-se. E Ele o fez. Mas cansou-se de brincar com aqueles bonequinhos inanimados, e por isso, decidiu que estava na hora de fazer com que eles criassem vida; levou-os todos para uma clínica especializada, em um lugar bem parecido com Miami, a fim de fazer a transfusão de fluidos dele para os bonequinhos, mas Ele não sabia que havia por lá uma bactéria misteriosa que contaminou – em maior ou menor grau – todos os bonequinhos a quem Ele deu vida. Assim, Deus precisou retirar-se para o Paraíso, a fim de não ser contaminado. Os bonequinhos cresceram e se reproduziram, e daí, teve aquela confusão toda entre o Adão e a Eva, acho que você já sabe...


-Hum, hum...


-Então; Ele teve uma idéia de Mestre: ligou para a clínica e pediu-lhes que fizessem uma outra criatura, que contivesse todas as bactérias com que os humanos tinham sido contaminados. Ou seja: Euzinho aqui. E meus outros ajudantes e secretários.


-E qual seria a sua utilidade?



-Curar! Pois a única maneira de curar a bactéria negativa, seria colocando os infectados em contato direto com ela, anulando, assim, o seu efeito. Você sabe, como o veneno de cobra é combatido através da vacina feita com o próprio veneno. Mas esta bactéria tem uma outra característica muito peculiar.


-E qual seria?...


-Ela faz com que seus portadores criem defesas contra a cura! Foi então que vocês – os humanos – começaram a criar estas histórias horrorosas contra o Diabo. Deram para escrever sobre nós em Bíblias e outros livros, e desenvolveram formas de nos exorcizarem cruelmente, só para não serem curados! Projetaram imagens horrorosas, com tanta força, que fomos ficando assim, desta forma que você vê...


Comecei a sentir pena dele. Afinal, era apenas um pobre diabo.


-Mas e daí? O que Deus fez?


-Bem, Deus, que não é nada bobo, teve uma outra idéia: se a vacina que trará a cura consiste em combater o mal através de sua fonte criadora, então... vocês teriam que aprender uns com os outros! Teriam que conviver uns com os outros, vendo o mal que cada um contém na face do outro. É claro que isso leva mais tempo, mas no final, acaba dando certo.

-Então é por isso que eu odeio tanto o meu vizinho? 


-É. Ele tem uma característica que te irrita profundamente, não tem?


Balancei a cabeça afirmativamente. Ele continuou:


-E qual é?


Naquele momento, deu um branco em minha cabeça. Respondi que eu não sabia. Ele disse que eu poderia pensar sobre aquilo mais tarde, mas que deveria fazer um esforço. Perguntei-lhe:


-E vocês, os diabos, como é que ficam nessa história toda?


-Bem, nós não somos mais os personagens principais nesta cura, principalmente, depois que vocês trataram de criar tantas histórias sórdidas a nosso respeito, e começaram a nos banir com aqueles exorcismos ridículos toda vez que a gente tentou se aproximar. Além do mais, nos transformaram em bodes expiatórios, colocando em nós a culpa sobre tudo o que há de errado no mundo, sendo que a culpa está em vocês mesmos! Bem, você quer saber o que vai acontecer com a gente? Ainda temos um trabalhinho por aqui, e depois... vamos tirar férias por tempo indeterminado. Ai, mas confesso que dói, às vezes...


Ele fez uma cara triste, e vi lágrimas em seus olhos:



-Basta ter uma dor de barriga, e vocês dizem que a culpa, é de algum espírito zombeteiro. Se o marido vai embora com a periguete, é porque alguém fez macumba e invocou as Forças do Mal... tudo é culpa nossa!



Senti pena dele novamente. Servi-lhe mais uma xícara de café. Ele fez uma careta após beber, dizendo que tinha esfriado, e eu fui para a cozinha, preparar-lhe outro. Olhei pela janelinha sobre a pia, e a tarde já dava lugar ao comecinho da noite. Terminei de preparar o café, e quando coloquei tudo na bandeja e fui para a sala, ele tinha sumido.


Na minha almofada, as manchas de café começavam a secar e desaparecer. Sobre a mesa de centro, o açúcar tinha atraído algumas abelhas. 



Suspirei fundo, e depois de limpar tudo e lavar as xícaras, fiquei à janela, vendo as últimas luzes do dia se transformarem em noite. O céu encheu-se de estrelas. 


Desde aquela tarde, eu perdi o medo da escuridão, pois percebi que os demônios que eu temia, não estavam do lado de fora; estavam dentro de mim.



quarta-feira, 28 de março de 2012

VOO INFINITO






VOO INFINITO



Ah, pobre pássaro afoito!

Deixou-se seduzir pelo azul mortiço

De um céu que era teto,

E não infinito...

daquele breve voo,

Só restou a saudade,

Pois um voo de liberdade,

Não é feito só de asas!...


É preciso o vento,

Passando entre as penas,

E uma vontade firme

Que una o pássaro ao voo.

E que tudo se dê

Em uma manhã serena,

Culmine ao meio-dia,

E sobreviva ao por do sol.


À noite, há de se ter um ninho,

Que sirva de abrigo

Até o momento certo,

O do voo infinito...




terça-feira, 27 de março de 2012

APELO






Um segredo escondido
No canto da tarde,
Num canto sofrido,
Réquiem de estrelas
Em meus ouvidos,
Uma súplica caída
Do Vale dos Esquecidos

Dizendo: "Lembrai de nós,
Pois não somos mais ouvidos,
Desmancha-se a nossa voz!
E no pó que nos tornamos
Resta aquilo que já fomos,
O que ficou de nós...

Sob a pedra que nos guarda
Haverá sempre um resquício,
E o silêncio onde gritamos
Chora a ausência do que fomos
Sobre os sonhos já morridos
Que nos foram arrancados
Por esse sono forçado,
Por esse corte dorido!"

SANDÁLIAS - um conto







Sandálias





O coração dele disparou ao vê-la aproximar-se. Não era como as outras meninas que chegavam, interessadas nas pulseiras, colares e sandálias que ele fabricava. Já trabalhava naquele canto de praia há vários anos, montando sua barraca todas as manhãs e desmontando-a no final do dia. Estava acostumado à rotina de lindos corpos bronzeados, e por isso, sabia que não era apenas pela beleza do corpo, nem pelas cores deslumbrantes do florão da canga que ela trazia enrolada à cintura.

Talvez fosse a maneira como os cabelos castanho dourados se agitavam sinuosamente com o vento do mar... ou as esmeraldas que ele percebeu nos olhos dela.

Não era só aquilo; era exatamente aquela coisa que acontece e que é indefinível. Pronto: estava perdido, irremediavelmente perdido.

Pegar seus pertences e ir trabalhar todas as manhãs tornou-se um acontecimento diferente, bem longe da rotina que ele cumpria há anos; pois agora, ela estava lá. Sempre no mesmo horário, passava por ele sem notá-lo. Passava como a brisa do mar, refrescando a todos sem distinções.

Ele decidiu que lhe faria um presente: um par de sandálias. O par mais lindo que jamais havia feito. Selecionou as melhores tiras de couro, as miçangas e cristais. Começou a pensar em um arranjo encantador para dispor tudo sobre as tiras, e como trançá-las de forma que os cristais e miçangas formassem um lindo desenho. Engenhoso que era, logo arranjou uma solução.

Um dia, enquanto trabalhava em sua preciosidade, ela chegou de repente, parando para olhar as coisas que ele vendia. Ela fingia estar olhando as pulseiras, mas na verdade, tinha o olhar atento às costas bronzeadas e musculosas do rapaz (ele estava sentado de costas para ela). Reparou que ele usava uma argola em uma das orelhas. Achou aquilo horrível! Pode perceber que suas unhas estavam sujas devido aos produtos que usava para trabalhar o couro. Também não gostou nada daquilo... mas ele tinha alguma coisa de especial que a atraía, embora ainda nem tivesse visto seu rosto: era o cheiro que vinha dele.

Quando ele se virou de frente para ela, ambos tiveram um momento de confusão, corações disparados, bocas entreabertas.Finalmente, ela gostou de alguma coisa que viu nele: os olhos, o olhar profundo, a barba por fazer. Tinha um charme que não era nada parecido com o charme estudado dos rapazes que ela tinha namorado. Ele era totalmente natural e original, tão original que chegava a ser bruto, e aquilo doía.

Ela pegou uma das pulseiras sem pensar, e disse friamente: "Vou levar esta..." Ele não conseguiu dizer nada: colocou a pulseira em um saquinho de papel, que estendeu a ela, pegou o dinheiro, fez o trôco. Foi quando ela reparou nas tiras cravejadas de pedrinhas e contas que estavam no chão, atrás dele. Ficou encantada com a beleza delicada que estava sendo formada por aquelas mãos embrutecidas.

Perguntou: "O que é aquilo?" Ele respondeu, gaguejando um pouco: "Um par de sandálias." Sem pensar, ela quase gritou, entusiasmada: "Eu as quero! Quando ficam prontas?" Ele sorriu: "Na verdade, elas já tem dono... ou melhor, dona. Estou fazendo as sandálias para dá-las de presente à mulher que é a dona do meu coração."

Ela percebeu que uma leve fúria começou a insinuar-se dentro dela, sem querer. Como ele podia ser tão petulante? Ele percebeu o desconcerto da moça, e achou-o divertido. Ela apenas virou as costas e foi embora, deixando no ar o leve perfume de seus cabelos misturado à maresia.

Ele trabalhou a noite toda, na casinha humilde que ocupava junto ao pier, para terminar o par de sandálias no dia seguinte. Não aceitou o convite dos amigos para mais uma noitada de violão na praia, em volta da fogueira. Quando terminou, o dia amanhecia, e as gaivotas gritavam em volta dos barcos de pesca.

Ele vestiu sua melhor camiseta, sua melhor bermuda, e foi caminhando até a praia. Seu coração não estava acostumado à emoções tão fortes. Batia descompassado, causando-lhe um misto de alegria e ansiedade.

Ela chegou, passando por ele. Desta vez, ela sorriu e seus olhares se cruzaram. Ele esperou até que ela estendesse sua canga na areia e, colocando seus óculos escuros, se deitasse sobre ela. Então, ele pegou sua obra-prima e foi até aonde ela estava, parando diante dela, que, ao perceber que havia uma sombra entre ela e o sol, abriu os olhos, retirando os óculos escuros.

"Você ainda quer as sandálias?"
"Pensei que você tivesse dito que elas estavam sendo feitas para a dona do seu coração..."

Sem nada dizer, ele se ajoelhou diante dos pés dela, colocando-lhe as sandálias. Só então ela compreendeu!

No final do dia, quando ambos estavam sentados diante do mar, exaustos de tanto amar, ela se lembrou que teria que partir na manhã seguinte. Sua vida estava lhe esperando. E a vida bem sabia que não poderia juntar, durante muito tempo, duas criaturas tão diferentes.

Quando ele acordou e estendeu o braço, procurando por ela, encontrou apenas o par de sandálias.





Ana Bailune







A MAGIA DE ESCREVER







Acho que tenho passado tempo demais escrevendo... mas é uma das coisas que eu mais adoro fazer. 

As palavras e idéias vão surgindo e se entrelaçando... as frases se formam. Adiciono alguma imagem, que eu mesma fotografo e edito, e pronto: nasce mais uma crônica, poema, pensamento ou conto. E quando termino, fico como uma mãe coruja, contemplando meu bebê recém-nascido, mas isso não dura muito, pois logo vem a vontade de escrever mais um.

É um vício: até quando eu ando pela rua, tudo me faz ter mais uma idéia para uma crônica, poema, pensamento... acho que ando obcecada.

Sem contar com os benefícios psicológicos que o ato de escrever traz a todos nós. A gente fica se autoconhecendo (isso, quando não tentamos mascarar sentimentos e mentir para nós mesmos), e até a vida muda. Os relacionamentos, as interações. escrever, para mim, é vital. Gostaria muito de viver disso, nunca mais precisando fazer outra coisa para ganhar a vida.

Acho que viver é uma experiência riquíssima, e não consigo achar tédio na vida. Mesmo nas situações tristes, a gente encontra alguma coisa útil, um aprendizado, uma nova visão. Acordar todos os dias, olhar em volta com os olhos da alma, ao invés de bufar e dizer: "mais uma segunda-feira!", faz parte da magia de viver.

É claro, às vezes a coisa desanda, eu perco o prumo. Mas o importante, é retornar ao ponto de equilíbrio, e tenho conseguido fazer isso. Pois escrever me auxilia no caminho de volta. Como eu escrevi em um poema há muitos anos, "Perdida de Mim:"

"Perdida de mim eu andei tanto tempo/que já nem me lembro por onde que andei/Mas sei que voltei mais dona de mim/ Eu não me sabia, mas hoje, eu me sei.../ ...E caso algum dia eu me perca outra vez/ Talvez seja fácil me reencontrar/ Tracei meu caminho, uma trilha se fez/Hoje posso ir, pois sei como voltar."

Escrever deu-me esta certeza. Agradeço todos os dias porque eu posso escrever. Agradeço também a todos que tem a paciência de ler meus escritos, do fundo do meu coração. Fico sempre feliz quando fico sabendo que alguém aproveitou alguma coisa deles, sempre!



segunda-feira, 26 de março de 2012

A FELICIDADE É VIRA-LATA





Não, não se trata de briga; esses dois aí na foto fazem parte de uma turminha de cães abandonados que ficam sempre nos arredores da Praça D. Pedro, aqui em Petrópolis. Protegidos pelos motoristas de taxi do local e por algumas senhoras que os alimentam, eles já fazem parte da paisagem.

Já é costume das pessoas, parar para observá-los brincando sobre o gramado da praça. Às vezes, alguém lhes joga uma garrafa plástica, e a festa dura horas... pessoas param e sentam-se nos bancos da praça, enquanto algumas (como eu) resolvem tirar uma foto.

Ser cachorro de rua não deve ser fácil... nem sempre, o dia está bonito, e nem sempre seus 'protetores' estão por perto. O inverno Petropolitano pode ser duro, e na época das chuvas, é preciso encontrar um abrigo. Sem falar nas pessoas maldosas, que lhes atropelam ou envenenam. Felizmente, elas são a minoria absoluta!

Mas eu gosto de parar para observar estes cães, porque eles deixam o coração leve... não sabem quando será sua próxima refeição, mas desfrutam de cada momento vivido com intensidade; brincam, correm, deitam-se ao sol, fazem festas nas pessoas. Parece até que gostam de ser observados, e fazem questão de que o espetáculo seja digno de admiração. Isso é que é viver!

De vez em quando, deveríamos tirar uma folguinha para deitar na grama, brincar um pouquinho, desfrutar o momento sem pensar no que vai ser amanhã. Ser viralatamente felizes.








Rápida Crônica Nascida da Bruma


Leve e rápida como a névoa que se dissipa sob os primeiros raios da manhã, assim deverá ser esta crônica. Ela ainda cheira a café recém-coado, e espreme-se, ansiosa, entre a vontade de nascer e a lida do dia, que me aguarda. Uma crônica de significados sutis.

Queria falar da beleza do acordar e sentir sob os pés os fios molhados de grama, em uma temperatura matinal de apenas onze graus. Ver-me refletida nos olhos amados de minha cadelinha Latifa, e poder tocar seu pelo macio e receber sua alegria como o segundo presente do dia.

Alguém me disse há alguns dias: "Viver bem e agradecer, é isto o que nos resta!" É isto que estou fazendo, a cada manhã e a cada fim de noite.

O sol agora já engoliu quase toda a neblina, e as gotas de orvalho brilham, enquanto morrem sobre o gramado, voltando ao lugar de onde vieram - o céu, em nuvens de vapor. Será que conosco?... Não; prometi que esta seria uma crônica leve.

E nasce esta crônica simples, feita da matéria etérea dos meus pensamentos, cuja alma deito sobre o teclado, e que faz-se visível e corpórea na tela.




domingo, 25 de março de 2012

MAR DE SANGUE







Já não posso navegar
Por esse mar de sangue
Cujas águas são tão densas,
Que quebraram-se meus remos...


E a ilha que eu desejo
Fica sempre mais distante!
Já não posso navegar
Por esse mar de sangue!


O meu barco, antes sereno,
Hoje teme o abissal
De onde nascem tantos monstros...
(Todos de água e de sal?...)


Já não posso navegar
Por esse mar de sangue,
Minhas velas se rasgaram,
Nem o vento a me levar...


Já não há nem mesmo um porto,
Um cais para onde voltar,
Estou só e sem guarida
Bem no meio desse mar!


Talvez haja uma saída
Se eu me deixar afundar, 
Pois sobre esse mar de sangue,
Já não posso navegar!



Para o povo do Afeganistão, que navega há tanto tempo entre o sangue, o medo e os monstros.

CEM MIL



Cem Mil


Havia cem mil,
Dos quais cinquenta
Não tinham face,
Uma falácia...
Destes cem mil,
Cinquenta mil no éter
De uma falsa existência,
A façanha de viver
Múltiplas vidas 
Mortas em uma...

Entre os cem mil, 
apenas cinquenta
Eram de verdade.

Aplausos!!!
Risos...

Palavras







Para um bom entendedor
Meia palavra não basta...
A metade de uma letra
Jamais forma uma palavra.

Pelo crivo que me passas
De mim, quase nada resta,
E no fim da tua festa
Meu champanhe se estraga.

A metade de uma boca
Jamais diz alguma coisa
Que nos seja inteligível
Que nos faça algum sentido...

A palavra, se cortada,
Só dirá meias verdades,
Palavras despedaçadas
Em algum texto ilegível.

Que a beleza sobreviva,
Que a verdade seja dita,
E, que de cabeça erguida,
Caminhemos nessa lida!...



Mulheres Afegãs



Elas varrem a poeira
Que se deita sobre as coisas
E que se gruda, em camadas,
Nas mobílias e vassouras.



A poeira sempre volta,
Vem nos ventos e sapatos,
Nas palavras e nos atos
Seculares, imutáveis...


Elas cortam as cebolas
Que provocam sempre o choro
Por aquilo que não foram
E jamais virão a ser.


Elas parem muitos filhos,
Elas calam e consentem
Já nem sabem o que sentem,
Não desejam, jamais brilham...


São dadas em casamento
A quem elas jamais amam,
A quem nunca há de amá-las
Com total indiferença...


Pois uma mulher não pensa,
Não opina, não contesta,
Com os olhos baixos, varrem
A poeira, após a festa.



Não conhecem a esperança,
Dormem sempre um sono leve
Que fará com que despertem
A qualquer sinal de sonho.


Não conhecem outra vida,
Todas são cópias exatas,
São mulheres xerocadas,
E em série produzidas.










ESTÁTUA ENTERRADA






No meio da lama, a face
Encovada.
Dura, rígida, de pedra,
Órbitas vazias,
Face rachada.


Era a face de um santo,
Mas não sei qual santo era,
Tinha as palmas bem unidas,
E um semblante de fera.


Desenterrei, com as mãos,
O resto da estátua.
Meu sangue pingou no chão
Pela fé desenganada...


Santo, santo, se ao menos
Eu soubesse teu nome,
Quem sabe, falava contigo
Sobre a minha fome...




Parceiros

VERDADES

Alguns falam de doçura, Desconhecem O regurgitar das abelhas, O mel que se transforma dentro delas, Dentro das casas de cera. Falam do luxo ...