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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Como me Lembro de Você





Quando eu me lembro de você - e isto acontece muitas vezes durante o dia - não procuro fazê-lo apagando todos os seus defeitos, e muito menos, acusando-a por causa deles. Também não fico me lembrando apenas do que foi maravilhoso, endeusando a sua personalidade. Sei que todos nós temos defeitos e qualidades, e isto não nos torna melhores nem piores do que ninguém.

Mas quando eu me lembro de você, me vem cenas do nosso cotidiano; revejo momentos, conversas que tivemos, momentos em que nos desentendemos mas também nos entendemos bem. Lembro-me da sua voz, do seu rosto, dos seus medos, e de tudo o que você procurava me ensinar. Lembro-me de que inúmeras vezes eu precisei de você e você não estava lá, presente, para me defender ou para me aplaudir.

 Hoje mesmo acordei me lembrando de uma ocasião, durante um desfile de Sete de Setembro na escola, em que eu a procurei na platéia e você não estava lá. Eu tinha sido retirada do pelotão minutos antes da parada começar, pois havia excesso de alunos. Eu e mais uma meia-dúzia (um garoto gordinho, uma menina de cor e um outro que usava óculos e estava com o uniforme incompleto, e ainda outros que como nós,  não eram tão populares). Eu me preparara durante meses para aquela ocasião, e na última hora, me retiraram... eu queria que você estivesse lá para me defender, mas você chegou apenas no final da apresentação, porque perdeu o ônibus. Quando eu perguntei se tinha me visto, e para não me magoar, você mentiu: "Vi sim, você desfilou muito bem!" E eu fiquei aborrecida, porque eu nem tinha desfilado.  

Lembro-me que muitas vezes eu não concordava com suas atitudes ou seus pensamentos. Às vezes, quando eu era adolescente, me envergonhei de algumas delas...eu era demasiadamente preocupada com o que os outros pudessem pensar. Condenava a tua franqueza e a tua maneira simples e direta de dizer e fazer as coisas. Mas com você, eu aprendi a não ser dissimulada. 

Engraçado... aprendi muito com as suas qualidades, e mais ainda, através dos seus defeitos, quando eu a observava, pensando: "Eu não quero ser assim..." e no fim, o saldo foi muito positivo.

Eu a conheci bem, mas não a conheci completamente. E sei que o mesmo se deu com você. Tenho certeza que houve ocasiões em que você e meu pai me olharam, tentando compreender aquela garota tão diferente dos outros irmãos, tão complicada, como meu pai dizia, "uma fiteira." E se perguntaram de onde eu tinha vindo. A garota que sonhava em ser cantora, bailarina, escritora, que queria aprender a tocar piano, que desejava aprender música, filosofia, mitologia, inglês. De onde surgiam estas ideias?! De todos os sonhos que tive, apenas um vocês tiveram condições de me ajudar a realizar: tornei-me professora de inglês. Minha carreira de 'bailarina' foi curtíssima, limitando-se à algumas aulinhas no colégio, e a de aprendiz de música, mais ainda. 

Mas o que ficou de tudo o que vivemos nesses quarenta e sete anos, foram as coisas boas que aprendi, as memórias bonitas e acima de tudo, a sua honestidade incontestável! Você era uma pessoa muito, muito honesta! Preocupada com a sua integridade, com o empenho da sua palavra, jamais fingindo gostar de quem não gostava ou dando-se a paparicar pessoas a fim de conseguir favores. Franca ao extremo - qualidade (ou defeito?) que herdei, e que ando tentando lapidar um pouco. Você sempre pagou todas as suas contas religiosamente em dia. Sempre assumiu os seus compromissos, e também aprendi isso com você.

E acho bonito isso. Que tenha ficado comigo a imagem de uma pessoa íntegra, literalmente inteira, mas que também errou muito, demasiadamente, em várias ocasiões. Mas afinal de contas, quem não errou? Por isso mesmo, eu jamais admitiria que alguém sujasse a sua memória. Principalmente agora, que você nem está mais aqui para se defender.

E é justamente na esperança de que respeitem o que você tentou me ensinar, que eu o faço.



8 comentários:

  1. Um bonito texto que emociona pela colocação do coração em cada palavra.
    Gostei muito. Beijos.

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  2. Ana,emocionante o seu texto. Dificilmente conhecemos nossos pais como as pessoas que eles realmente são, porque, para nós, eles sempre foram e serão " pais" . Mas os exemplos que deuxam, estes viverão conosco até o nosso próprio fim e, quem sabe, até depois...

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  3. Lindo texto/desabafo e ao mesmo tempo com grande reconhecimento dos ensinamentos deixados, pois é mesmo assim em todas as famílias, lapidam-se mutuamente até brilhar as pedras preciosas!
    Abraços, amei ler!

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  4. Oi Ana, como sempre, um texto lindo e com uma mensagem emocionante. Parabéns!!
    Minha querida deixo este pensamento, para te desejar uma semana abençoada, muita luz no teu caminho e que Jesus esteja sempre presente guiando teus passos.
    “Somos seres iluminados pela luz Divina. Uma vez iluminados precisamos acender aqueles que permanecem apagados ou preferem as trevas por não conhecerem a verdadeira luz”.
    Abraços: Profª Lourdes Duarte

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  5. Oi Ana, o texto é o mais transparente possível porque a gente sempre acha que nossos pais são inatingíveis quanto aos defeitos. Mas chega uma hora que a gente toma consciência e começa MESMO a vê-los como realmente são. Embora o amor continue sempre o mesmo.

    Ótima crônica, esboçando sentimentos coloridos e des(coloridos), onde você herdou alguns lápis de cor.

    Gostei imenso de ler porque tua linguagem flui (sempre) naturalmente.

    abração

    :)

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  6. Oi Ana
    Que texto emocionante. Adorei! Já te disse e repito, sempre que venho aqui, me emociono. Vc tem esse dom, de colocar emoção nas palavras, além de escrever super bem!
    Bjos.

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  7. Olá!Boa noite
    Ana
    Muito emocionante...
    penso que é muito necessário entender e eliminar totalmente qualquer dúvida e qualquer hesitação de que eles , nossos pais, verdadeiramente são nossos aliados e estão no mesmo barco literalmente conosco.Isto não acontece à toa, uma vez que as relações familiares são as mais difíceis justamente, devido à proximidade entre os membros e a ausência de fronteiras, o que acarreta grandes dificuldades em perceber e aceitar as diferenças.Porém mães também são humanas e nem todas atingem tal maturidade, e apresentam grande dificuldade.Mas, tenho pleno certeza que o amor incondicional, de ambas, permite superar as dificuldades, enfrentando a prova do tempo e das relações...e aí, só boas lembranças e saudades!
    Obrigado pelo carinho
    Bela semana
    Beijos

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