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segunda-feira, 22 de setembro de 2014

EIS A CASA





Deixo um poema de Cecília Meireles sobre uma casa na qual todos gostariam de viver:


Eis a Casa


Eis a casa
menos que de ar
imponderável,
no entanto é branca de camélia e tem perfume de cal.

Com seus corredores

Suas escadas

O alpendre
As janelas uma a uma

Vê-se o mar. As montanhas. O trem passando. O gasômetro.

Vêem-se as árvores por cima com suas flores

A casa impon derável

Mas de cimento madeira tijolos ferro vidro

A pintura prateada das grades cheira a óleo a fruta a luz

A água a pingar cheira a musgo
soa metálica, trêmula
insetos pássaros líquidos
pequenas estrelas
clarins muito longe

Peitoris gastos de braços antigos

Sombras de borboletas

Eu sei quem comprou a terra
quem pensou nos desenhos
quem carregou as telhas

Passam legiões de formigas pelos patamares

Eu sei de quem era a casa
quem morou na casa
quem morreu

Eu sei quem não pode viver na casa

É uma casa
com seus andares
suas escadas
seus corredores varandas
aposentos
alvenaria
muros

imponderável

Uma casa qualquer
Cruz que se carrega
Imponderavelmente, para sempre, às costas.



Um poema belíssimo, e nem é preciso dizer... nem percebemos o quanto somos como os caramujos, carregando nossas casas às costas - todas elas - as casas onde moramos, nascemos, crescemos e vivemos com nossas famílias. As casas onde fomos felizes e tristes, cujas paredes nos viram rir e chorar, temer e amar. As casas que nos comportaram e nos abrigaram quando nos sentíamos vazios de nós mesmos. As casas onde comemoramos nossos aniversários e choramos após nossos velórios. As casas cujas paredes ficaram impregnadas dos nossos sonhos e desejos, realizados ou não - e os sonhos e desejos não realizados sempre parecem eternos.

Carregamos muitas casas às nossas costas. Todas as casas em que moramos ou ainda vamos morar. Deixamos nelas pedaços de vida que ficam registrados em fotografias e lembranças. Cada mudança de casa é uma mudança de fase; até mesmo uma simples pintura na parede, uma troca de cortinas ou de cores, representa uma mudança, ou pelo menos, o desejo desta mudança.

Carregamos as nossas casas para sempre, quer as experiências que vivemos nelas tenham sido boas ou ruins. E finalmente, há casa derradeira, a casa que nos verá envelhecer. A nossa última morada.




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