Crônica publicada também em meu blog, A Casa & a Alma, e no Recanto das Letras.
No último sábado, ao conversar com um de meus alunos sobre questões da vida, me veio à mente uma frase: "A vida é uma pergunta retórica." Para explicar melhor, uma pergunta retórica é aquela que não tem como objetivo exigir uma resposta, mas apenas causar uma reflexão. Talvez porque, na verdade, não haja uma resposta que se adeque a todas as realidades, crenças e vontades. Quando se trata de vida, o que a maioria das pessoas deseja ao formular uma pergunta, é uma resposta que se adapte às suas próprias crenças: o religioso quer acreditar que existe uma vida espiritual, e o ateu, que ela não existe. O Budista acredita no Nirvana, o Cristão, no Paraíso, o espiritualista, no Nosso lar, e o ateu, em nada.
E nós seguimos, afirmando isto e aquilo, sem termos certeza de absolutamente coisa alguma.
Minha única certeza, é quando abro os olhos de manhã e sinto que ainda estou por aqui. É a água fria quando lavo a louça na pia da cozinha, o barulho da vassoura varrendo o chão, o preparo da comida que vai saciar a minha fome, os cheiros que me cercam, os momentos em que estou brincando com meus cães, ou sentada no jardim de olhos fechados, escutando o vento e as centenas de sons que me cercam, sentindo o sol, a chuva, olhando as plantas, os animais, as árvores, ou as pessoas na rua.
Mesmo assim, gosto de criar uma realidade alternativa que me proteja. O meu Nirvana, o meu Paraíso, o Meu Nosso Lar, onde existe uma casinha pintada de azul, no meio de um pequeno jardim. Na varanda, me esperam todos os bichinhos de quem já cuidei até hoje, desde que eu era criança. Lá me aguardam também uma porção de gente que se foi antes e que eu gostaria de rever. Quando eu chegar lá, eles estarão pela casa, e me receberão.
Mas noutras vezes, eu prefiro crer que fecharei os olhos um dia e todas as minhas lembranças serão imediatamente apagadas, juntamente com todos os sinais conscientes da minha existência. Talvez eu me transforme em uma força neutra, que será reabsorvida por alguma fonte que a re-utilizará para criar algo novo. E nada do que sou restará. Minha personalidade morrerá, desaparecendo para sempre.
Mas também há dias em que preferiria simplesmente deixar de existir. Não ser, sequer, este material etéreo que será reutilizado na criação de algo novo. Fechar os olhos, e sumir para sempre. Não ouvir mais nada, não ver mais nada, não dizer mais nada, não pensar mais nada. Não mais ser.
E eu caminho entre estas três respostas, não sabendo qual delas - ou se uma delas - é a certa para a minha pergunta retórica; então eu ponho minha mão sob a água gelada, e deixo que ela escorra sobre minha pele. Vou varrer o chão, passar roupas, limpar a casa, trabalhar... e percebo que, na verdade, esta é a única realidade que eu tenho agora, a única da qual tenho certeza que faço parte, e se assim é, pode ser a única que realmente tem importância neste momento.
Que linda reflexão, amei a sua retórica, eu também às vezes penso assim, amo dormir, acho que depois de um dia repleto de coisas feitas com prazer, a melhor coisa é dormir e sonhar literalmente e ao acordar perceber que ainda estou por aqui!
ResponderExcluirCada dia ao seu dia, saborear cada momento, nem todos bons, mas todos nos dão a capacidade de avaliar e escolher como se quer continuar a viver!
Amei ler aqui, como sempre, algo de bom aprendo!
Abraços querida amiga!
Ana Bailune
ResponderExcluirGostei da crónica-lição. Deu para reflectir, exercício muito do meu agrado.
Leia e comente BRASIL – O SORRISO DE DEUS
Forte de Santa Catarina do Cabedelo
http://amornaguerra.blogspot.pt/
Bjs
Interessante, toso os dias tenho por aqui esta rotina e sempre perpassa pelas minhas emoções esta mesma sensação:
ResponderExcluir"Vou varrer o chão, passar roupas, limpar a casa, trabalhar... e percebo que, na verdade, esta é a única realidade que eu tenho agora, a única da qual tenho certeza que faço parte, e se assim é, pode ser a única que realmente tem importância neste momento."