Como se não houvesse amanhã,
Ele acordou naquele dia se sentindo mais vivo,
Abriu a janela e percorreu as curvas das montanhas
Com as pontas dos dedos.
Deixou que as pupilas ficassem, por instantes,
Nos miolos das flores,
E cumprimentou cada uma delas, dizendo seus nomes.
Como se não houvesse amanhã, ele respirou profundamente,
Sentindo a vida entrar pelo seu corpo bem devagar,
Preenchendo todos os espaços.
Absorveu os mormaços do sol,
Saudou as gotas de chuva,
Pisou na grama, descalço.
Como se não houvesse amanhã,
Ele fez as pazes com todo mundo,
Até mesmo com quem o havia magoado
Profundamente,
Erguendo seus rostos para olhá-los nos olhos, sem mágoas,
Eles, que haviam pisoteado em seu solo as melhores sementes,
Frustrando o plantio de seus mais preciosos sonhos.
Como se não houvesse amanhã,
Ele abraçou cada um dos seus amigos, e riu com eles,
Esquecendo de olhar-se no espelho,
Dissolvendo-se, doando-se, mesclando-se a todos,
Tornando-se, ele mesmo, o reflexo de cada um
Daqueles que amava.
Como se não houvesse amanhã,
Ele esqueceu as próprias dores, seu calvário,
E tratou de ser mais solidário
Com a pequenas dores alheias, as mais corriqueiras,
Sem minimizar nenhuma delas.
Abriu portas e janelas,
Deslumbrou-se com o sol que se punha,
Saboreou a comida simples como a um banquete,
Doou a maior parte de tudo o que mais amava
Beijou sua garota com mais paixão que de costume,
Exatamente como se não houvesse amanhã.
E ele fez bem, pois não houve,
Levou-o daqui o mesmo vento que o trouxe,
Deixando-nos órfãos do seu sorriso...
E as suas pegadas,
Foram aos poucos sendo apagadas,
Pois as estradas por onde ele seguiu
Nos eram fechadas.