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sábado, 30 de junho de 2018

ORAR PELOS OUTROS








Não quero que orem por mim. Por favor, agradeço a consideração e o interesse, mas podem deixar que por mim, eu mesma oro. E mesmo assim, eu o faço com muito cuidado, justamente porque eu acredito piamente no poder da oração. 

No livro “Cuidado com o que Você Pede nas Suas Orações,” de Larry Dossey, há a história de um rapaz cujo maior sonho na vida era ser escritor; talentoso, apesar de sua habilidade com a escrita, nunca conseguia publicar um livro. Deprimido e decepcionado, o jovem acabou desistindo do ofício, seguindo outra carreira que agradou muito à mãe. Ao saber que o filho desistiria de ser escritor, a mãe comentou, feliz: “Ah, que bom que você desistiu dessa bobagem. Rezei a vida toda para que isso acontecesse!”

O rapaz, indignado, descobriu o poder da oração de uma mãe, que pensava que estivesse fazendo o bem a ele. Viveu anos e anos de sua vida totalmente infeliz e frustrado, e só pode libertar-se ao descobrir que a mãe vinha rezando para que ele desistisse do seu maior sonho.

Acho que na maioria das vezes é assim quando rezamos por outras pessoas; forçar alguém a ir contra as suas inclinações, ou a desistir de um sonho simplesmente porque ele não nos agrada, é egoísta e cruel. Há sempre pessoas interesseiras que nem sequer percebem que, ao tentarem forçar alguém a providenciar-lhe vantagens, seja através de orações, “trabalhos espirituais” ou chantagens emocionais, estão submetendo a pessoa em questão a sofrimentos desnecessários, constrangimentos e infelicidade, e até mesmo, doenças físicas e mentais, como a depressão. Se a pessoa não for forte o suficiente para firmar-se, estará condenada a ser infeliz. E tudo por causa de uma inocente oraçãozinha, que na verdade, “É para o próprio bem dele.”

Muito egoísta esse pensamento de quem acha que sabe o que é melhor para todo mundo. 






AS ROSEIRAS E O MAL







Minha mini roseira não vai nada bem... não consegue crescer. Toda vez que fico feliz ao ver que novas folhas estão começando a brotar e que novos botões estão se formando, na manhã seguinte ela aparece totalmente nua, pois as formigas se alimentam dela durante a noite. Acordo, corro lá para fora para vê-la e não há mais folhas ou botões. A culpa foi minha, por achar que formigas apenas guardam provisões para o inverno nos dias de verão, não aparecendo durante os dias e noites frios de inverno, e devido a esse erro, não me preocupei em livrar-me das malditas formigas. 
Conversando com um jardineiro ontem, ele me explicou que se o gramado estiver enfraquecido, não sendo limpo e adubado periodicamente, ele logo se verá tomado por ervas daninhas, as famosas e indesejáveis “tiriricas.” Depois, a única forma de exterminá-las é arrancando tudo e replantando, o que além de levar tempo, é caro e trabalhoso.

Trazendo minhas recentes experiências de jardinagem para a vida prática, ontem li uma mensagem religiosa que afirmava que, para nos livrarmos do mal e da companhia de maus espíritos (e podem ter certeza, eles existem, tanto vivos quanto mortos), basta que sejamos pessoas boas e façamos apenas o bem, focando o pensamento sempre no lado positivo da vida e nos lembrando de agradecer por tudo o que temos; desta forma, afirmava o texto, nos manteremos afastados de todo o mal que anda pelo mundo.

Acho esta afirmativa um tanto pueril, e perigosa também. O mundo está cheio de exemplos de pessoas boas que foram dizimadas pelo mal. Para citar apenas alguns exemplos: Gandhi, o naturalista Chico Mendes, Chico Xavier, que durante a vida foi perseguido por seus adversários, apesar de só ter feito o bem a todos, e por que não citar, até mesmo o próprio Cristo, que é o exemplo máximo de amor, bondade e abnegação que temos como referência. E há centenas de milhares de crianças que são dizimadas durante as guerras todos os dias, mesmo enquanto você lê este texto, sem terem feito mal algum a ninguém. Estavam inocentemente brincando nos quintais de suas casas quando uma bomba as atingiu.

O mal está espalhado pelo mundo. Creio que ele se encontra dentro de cada um de nós, muitas vezes, adormecido, mas é capaz de despertar a qualquer momento se não soubermos dominar nossas baixas inclinações. Mas há também aquela espécie de mal que nos atinge sem que tenhamos feito nada para merecê-lo – como as formigas e pulgões nas minhas roseiras, ou as ervas daninhas que crescem no jardim e que tomam conta dele, acabando com todas as outras plantas se não as exterminarmos a tempo. 

Alguém disse que a maior vantagem do diabo sobre nós, é que muitos não acreditam na sua existência. Eu concordo. Precisamos estar protegidos. Precisamos aprender a nos defender.








terça-feira, 26 de junho de 2018

A Fé, Ganesha e Eu






Há muitas diferentes vivências, definições e entendimentos quanto à fé. Aqui eu vou falar do meu entendimento e da vivência da minha fé, de como eu a interpreto e vivo.

Em primeiro lugar, gostaria de dizer que respeito todas as religiões, embora não me harmonize pessoalmente com nenhuma delas. Até hoje, não consegui encontrar uma que falasse à minha fé, mas tenho profundo respeito por todas elas, porque eu acho que jamais se deve fazer pouco caso da fé alheia. Por que? Simplesmente porque ela é muito importante para quem a professa; que direito tenho eu de achar-me mais sábia do que os outros, ao ponto de questionar a sua fé? Não preciso ser arrogante ao ponto de tentar ridicularizar a fé alheia, apenas para parecer ‘esperta,’  ‘moderna’ ou ‘independente’. Porém, não acho bom tentar impor a própria fé ou religião aos outros; cada um tem o direito de seguir seu próprio caminho e fazer suas próprias escolhas. 

A minha fé é como se fosse tentáculos que se estendem diante de mim, Para cima e para baixo, e por todos os lados. Eu vivo tentando sentir a energia das coisas, dos lugares e das pessoas. Algumas coisas e alguns lugares chamam a minha atenção, e outros me repelem. A fé é – e deve ser – uma experiência pessoal, e para que ela se expresse, eu vou experimentando o que funciona e o que não funciona para mim. Quem me conhece, sabe da minha ligação forte com São Jorge, porque em um dia de muita necessidade, eu me dirigi a ele e me senti amparada, e a ajuda veio. Depois disso, já recorri a ele várias vezes sendo atendida quase sempre. 

Para explicar melhor essa minha coisa com a fé, vou contar uma historinha pessoal: 

Certa vez, visitei um local aqui em minha cidade chamado “Vale do Amor.’ É um lugar junto às montanhas, cheio de verde, onde existem vários templos que abrangem quase todas as religiões, tudo ao ar livre, junto da natureza e cercado de beleza por todos os lados. De repente, passei diante de uma estátua de Ganesha; eu já tinha visto uma há muito tempo, na internet, e a imagem me intrigou: é um menino com cabeça de elefante. Em volta da imagem, havia muitas frutas. Eu parei, fiquei observando e senti alguma conexão com a imagem, que eu não sei explicar de onde veio. Eu nada sabia sobre a história daquela imagem. Fotografei-a, e publiquei a foto em um site de fotografias do qual participo, o EyeEm. 

No dia seguinte, um indiano tinha deixado um comentário, me perguntando onde eu tinha conseguido aquela foto; expliquei a ele, e ele me respondeu, dizendo que Ganesha é um deus que remove obstáculos e traz prosperidade, e que se eu a cultuasse, ela traria muitas coisas boas para mim. Agradeci o comentário, mas não dei importância. Dias depois, procurando por uma imagem bonita para colocar como fundo na área de trabalho do meu computador, Ganesha reapareceu; baixei a imagem, e deixei-a na minha área de trabalho, mas sem entender direito o porquê de ter feito aquilo. Deixei-a lá por alguns dias, e depois troquei-a por outra. 

O tempo passou; esses encontros e desencontros com Ganesha duraram mais de um ano. Eu assino alguns canais do YouTube, e certa vez recebi de um deles uma notificação por e-mail sobre a história de Ganesha. Acessei, escutei a história, achei muito interessante – gosto muito de lendas. Mas ficou por aí. Porém, ao entrar em uma loja de produtos naturais aqui em minha cidade, na vitrine, lá estava a imagem novamente; uma versão pequena, onde Ganesha veste branco e tem uma pedra vermelha na testa. Achei-a bonita. Trouxe-a para casa. Ainda não sabia bem o que estava procurando. No dia seguinte, resolvi arrumar meu armário de CDs – tenho tantos, que ocupam um armário inteiro! De repente... encontrei um que eu já tinha esquecido que possuía, um CD de música tântrica que contém alguns mantras... Ganesha retratado na capa. Coloquei-o para tocar, e a música se espalhou pela casa. Um sentimento de alegria e gratidão profundas tomou conta de mim.

Bem, a estatueta de Ganesha está lá, na minha sala de aula. Ainda não sei o que ela está fazendo ali, mas eu costumo tocar o CD com seu mantra, e quando passo por ela, sinto que existe algum tipo de vibração emanando dela. Também reparei que o número de pessoas que têm me pedido ajuda quando saio às ruas, e até pessoas que batem à porta da minha casa pedindo alguma coisa, aumentou bastante. E também que algumas coisas que estavam emperradas na minha vida, de repente começaram a caminhar novamente.  Não sei o que significa tudo isso, mas estou seguindo este caminho; isso, para mim, se chama fé. Porque fé não se questiona; a gente sente um impulso, e segue um caminho, confiando nas coincidências que nos trouxeram a ele. 

E eu não acredito que coincidências sejam apenas... coincidências. Elas nascem das raízes da fé. Ou talvez a fé brote das raízes das coincidências. Não sei.





terça-feira, 19 de junho de 2018

Homenagem




Homenagem


Este vídeo foi feito em minha homenagem. Agradeço a todas as pessoas envolvidas, do fundo do meu coração. Fiquei muito emocionada quando Carlos Lopes me enviou o link. 

É exatamente nessas horas que a gente descobre que realmente valeu a pena, que vale a pena! Escrever é uma atividade solitária, muito "a gente com a gente mesmo," e quando a gente cai em si e percebe que aquele trabalho frutificou, que encantou pessoas que moram lá do outro lado do país e que nem sequer nos conhecem pessoalmente, dá uma sensação maravilhosa na gente. Não dá para descrever. 

É como eu deixei escrito na minha página do Facebook:



A palavra é: GRATIDÃO. É muito bacana e surpreendente saber que, lá do outro lado do Brasil, pessoas conhecem meus escritos e gostam deles. Ver meu poema, "Meu Filho", lido pela poetisa Silmara, e a emoção dela no final, é uma coisa que não tem preço. Obrigada a Carlos Lopes, Augusto Sampaio, Simone Pinto, Patrícia Celeste Lopes e Silmara Feitosa. Muito, muito obrigada!




ECOS & LEMBRANÇAS









Bandeirinhas verdes e amarelas sendo penduradas de um lado da calçada até o outro. Nós, crianças, sentados no chão, as recortávamos e colávamos nos barbantes. Os adultos que passavam paravam para ver, e alguns vinham com ofertas: "Olhem, eu tinha em casa essa lata de tinta amarela!"  "Podem ficar com o plástico verde." "Esta bandeira é da última Copa. Podem pendurá-la."

E nós pendurávamos todas as bandeiras, pintávamos os muros de verde e amarelo e fazíamos aquela festa... às vezes, havia o concurso da Rua Mais Bonita, promovido pela estação de rádio local.

Na hora do jogo, eu me lembro que a rua ficava totalmente vazia, mas a cada grito de "Gooool!!!" as pessoas iam às janelas gritando e acenando umas para as outras, comemorando. 

E se o Brasil vencesse... ah, aquela carreata indo em direção ao centro da cidade, todo mundo feliz, buzinando, carregando bandeiras, para nos reunirmos e comemorarmos a vitória. Naquele dia, ninguém mais trabalhava, e no dia seguinte, a avenida estava coalhada de pessoas vestidas de verde e amarelo.

Mas até isso nos tiraram. 

Tiraram-nos tudo: a esperança, a fé em um futuro melhor, o sentimento de patriotismo. Esta está sendo uma Copa do Mundo amarga. Assisti até gora a apenas um jogo, e vi o mesmo desânimo nos jogadores de futebol. Parece que não existem motivos para que eles joguem com raça; afinal, quase nenhum deles vive no Brasil - foram vendidos a times estrangeiros, onde recebem verdadeiras fortunas. Não os culpo; qualquer um no lugar deles faria a mesma coisa. Cada um vai para onde se sente mais valorizado. Porque aqui, nada mais é valorizado: não damos valor aos nossos atletas, nem às nossas crianças ou aos nossos profissionais. 

Sinto uma pena enorme de tudo isso. Sinto pena porque somos um dos países mais lindos do mundo, de melhor clima, aquele, onde "Tudo o que se planta, dá." Pena que ultimamente só a corrupção tem sido plantada. 





quarta-feira, 13 de junho de 2018

Se Você Quiser










Visto do lado de fora
Por um olhar apressado,
Tudo é fácil, tudo é lindo,
E o caminho, aplainado.

-Quer chegar onde cheguei?
Vai ficar decepcionado!
Pois nem é tão longe assim,
É só o melhor de mim,
Meu pedaço conquistado!

Através do olho sonso,
De quem me olha, encostado,
Há a ânsia insatisfeita
De ter, a si, abandonado.

-Quer chegar onde eu estou?
Não será tão fácil assim...
Terá que andar, sozinho,
Por esse mesmo caminho
Por onde, sozinha, eu andei!

Vai ter que rasgar a alma,
Ferir os pés, ao andar
Sobre a brasa, sobre o gelo,
Sob o sol e sob a chuva,
Suportando a dor intrusa,
A friagem, o calor,
A dúvida, com desvelo
E com calma, sem medrar
Chorar, quando for preciso
Sem perder o chão e o siso
E sem deixar de sonhar!






SOU DO TIPO QUE NÃO DESISTE









No começo da minha vida, eu era fraca. Fugia de toda sorte de controvérsia, por medo de ser julgada ou de não ser aceita. As pessoas me colocavam aqui, empurravam para lá, puxavam para trás. “Um pouco mais à direita,” “Chega para lá,”  “à esquerda é melhor.”  A minha primeira palavra era sempre ‘sim.’ A última também. A coisa mais fácil? Me dizer o que fazer, o que era certo, o que era errado, o que eu deveria ou não deveria. 

Mas creiam ou não (para a alegria de uns e desgraça de outros) eu cresci. Hoje, eu sou do tipo que não desiste. A opinião alheia ao meu respeito não me afeta. Se eu quero uma coisa, se ela é minha, se ela me foi trazida por Deus, eu não largo mão. Ninguém mais me diz o que fazer, onde ficar, como me portar, do que desistir. 

Quem tentar me dominar ou lutar contra mim, encontrará uma adversária dura na queda. E quando eu caio, me levanto cada vez mais forte, e cada vez mais experiente. Posso estar lá no chão hoje, mas enquanto eu estiver lá, estarei olhando para cima e pensando em uma maneira nova de me firmar novamente, e de proteger aqueles a quem eu amo e que me amam. E a cada vez, que eu caio, mais eu aprendo sobre a natureza daqueles que tentam me derrubar, e decido quem fica e quem sai da minha vida. Não perco tempo com pessoas negativas, que nada acrescentam, que nada têm a me ensinar.

Já passei por poucas e boas. E tudo me ajudou a perder o medo de lutar, de me proteger e de proteger quem eu amo.  E sabem o que eu faço para me proteger de pessoas assim? Não faço nada, além de me fortalecer e de viver de forma a não merecer as coisas ruins que elas me enviam.

Quando eu olho em volta, o que eu vejo, é que estas pessoas não são felizes; tentam alcançar o sucesso da maneira mais fácil, pulando etapas, mas suas pernas curtas não impedem que elas caiam nos abismos que elas mesmas cavam quando fazem isso. Sua visão ingênua sobre a vida não as deixam ver que todas as suas maquinações são tão óbvias, que mesmo que elas possam causar algum dano, serão logo desmascaradas e devolvidas às suas condições de fracassadas. E eu vou ficando mais forte.
Porque sou do tipo que não desiste.






domingo, 10 de junho de 2018

Meu Pensamento









O meu pensamento é tão leve,
Que não dura,
Não mata nem cura,
Nem tem estrutura
Para aguentar o peso do teu.

E a pedra que tenta
Cair sobre  ele,
Passa direto
Pela rachadura,
Rola para o chão
 Através da transparência 
Da sua própria descompostura,

Pois meu pensamento é leve,
É breve, e não pretende
Descobrir se um vento que passa
O compreende,
Ou repreende.

Meu pensamento nasce, exatamente,
De um par de olhos
E de um par de ouvidos,
E de um coração, que mesmo que se engane,
Pulsa forte, e sente.

Não percas teu tempo
Tentando lutar
Ou sobrepujar
O que sequer vislumbras,
O que não podes abranger,

Porque os trilhos do que penso
E os trilhos do que pensas,
Não se encontram,
Não se entendem:

Seguem lado a lado,
E a cada um, seu fado.
Embora na mesma estrada,
Seguirão caminhos opostos
Na próxima encruzilhada.






sexta-feira, 8 de junho de 2018

Perdão







Às vezes, 
O leite talha,
A roupa rasga,
Azeda o mel,
O passo trava,
Cai a pedra do anel.

Até parece
Que a luz apaga,
E a gente traga
Uma fumaça
Que nos sufoca,
Nada nos toca
Sem machucar.

-Melhor não ser,
Ou não estar...
Deixar sair,
Deixar entrar,
Sentir a dor,
Perder o chão,
Trancar o céu,
Cortar o fel
Pela raiz.

Deixar doer,
Olhar o mar,
Olhar o mal,
Provar do sal,
E se acabar,
E mergulhar,
Se recompor...

Deixar sangrar
O vil veneno
Da vil serpente,
Até que saia,
Até que cure,
Cortar a carne,
Sugar o corte,
Tornar-se forte,
Tornar-se frio,
Tornar-se imune.





sexta-feira, 1 de junho de 2018

O Furacão - conto completo




Não, não há necessidade de explicações. Principalmente porque ninguém estaria interessado em ouvi-las. Se eu fechasse a porta nesse instante, se eu me desintegrasse, sumisse, ou então se de repente eu decidisse fazer um discurso, escrever cartas, explicar-me – não haveria ninguém que quisesse me ouvir. Porque ninguém está interessado em compreender as razões alheias, mas apenas criticar, apontar, acusar, escarnecer. 

Mas eu sinto que enquanto eles se ausentam, pairando sobre mim como se eu fosse uma carniça apodrecida num deserto, eles me olham. Me assistem. Tomam conclusões ao meu respeito. Acima de tudo, eles me julgam. Fazem questão de permanecerem distantes para que possam demonstrar, nem que seja pelo esforço dirigido, a sua indiferença. (Existe indiferença através do esforço dirigido?) Eles desejam a minha atenção à sua desatenção. Se eu falasse, virar-me iam as costas; se eu gritasse, tapariam os ouvidos – embora eles pudessem me escutar perfeitamente, fingiriam que não. Porque é mister que eles me magoem. Querem ter certeza de que seus esforços sejam recompensados, ou seja, que eu me sinta menos. 

Razões? Cansei-me de procurá-las. Explicações? Cansei-me de dá-las. Os sinos tocaram centenas de vezes, os laços foram tão repuxados, que acabaram esgarçados. E um dia, após um puxão mais forte, romperam-se. E quando eles arrebentaram, abrindo comportas de toneladas de água que formaram um rio de distâncias, só eu ouvi. Eles não ligaram. Talvez achassem que eu acabaria, como sempre, tomando o primeiro barco de volta ao porto. Se estranharam ou não, também não sei. Nunca me disseram. Nunca me perguntaram nada. Se falaram alguma coisa a respeito de mim, nunca fiquei sabendo. 

A vida sempre continua. Não importa o que aconteça, ela sempre segue em frente – com ou sem o nosso consentimento, com ou sem a nossa participação. Ou nós a conduzimos ou seremos pisoteados por ela, e eu decidi que gostaria de conduzi-la, afinal. 

Diga centenas de sins a vida toda; seja cordato, solidário, condescendente, maleável, bondoso, compreensivo. Perdoe tudo. Perdoe sempre, e esqueça sempre. Recomece milhões de vezes. Dê razão a quem não a tem. Seja sempre aquela pessoa adorável e sempre disponível. 

Diga não apenas uma vez. Ou apenas diga que vai pensar – às vezes, é o suficiente para que passem a odiá-lo e desprezá-lo com todas as forças. Você será relegado ao último lugar da fila, e finalmente, você será esquecido. Você será alvo de vinganças e de maledicências. Atreva-se a dizer não, se tiver coragem.
E será nessa hora que você enxergará a verdade, aquela mesma verdade que vinha batendo à sua porta tão insistentemente quanto um vendedor de enciclopédia, mas você fingia que não estava em casa ou que não escutava, porque abrir a porta teria significado a necessidade de rompimentos, mudanças, separações. 

O problema com a verdade, é que no momento em que nos atrevemos a dar uma olhadinha para ela, nem que seja de rabo de olho, nunca mais conseguiremos cobrir tudo com o velho véu cor-de-rosa de sempre. Um pequeno vislumbre e terá sido o suficiente para que ela derrame suas cores fortes no nosso campo de visão, e eu prometo que nada nunca mais será como antes, pois quem enxergou a verdade uma vez, nunca mais conseguirá conviver com a inverdade ou remendar o pano da vida com as linhas doces da mentira. 

Não é nada fácil descobrir como os outros nos veem realmente. Não é fácil descobrir que estamos e sempre estivemos irremediavelmente sozinhos. Mas depois, fica mais fácil quando a gente se acostuma e aceita. Com o tempo, vai ficando cada vez mais fácil. Haverá muitas recaídas, nas quais você há de se perguntar se não seria possível voltar atrás e reencontrar aquele velho e conhecido caminho, por onde você já passou centenas de milhares de vezes, mas descobrirá que não; uma vez que a escolha foi feita, não há como retornar ao velho caminho. O que existe adiante é apenas... uma estrada incógnita. Uma história que você terá que aprender a escrever sozinho, sem as penas alheias, sem os direcionamentos alheios. Você sentirá medo e solidão. Depois, compreenderá que todo caminho é difícil no começo, e que a solidão é tudo o que você sempre teve. Porque ela é tudo o que todo mundo sempre teve, mesmo os que não enxergam isso. 

Como olhar no espelho e tentar reencontrar velhos rostos traçados pela linha da falsa aparência? Não há como jogar com a verdade. Ela não tem parceiros de jogo, ela só tem súditos. É ela quem comanda tudo, embora seja paciente até que a descubramos. E para que isso aconteça, será preciso que haja muitos tombos e decepções, muitas lágrimas e traições, muito medo sob os véus cor-de-rosa.

A gente espera que as pessoas mudem. A gente espera que o sofrimento seja como uma bigorna na qual todos somos moldados, assumindo novas formas mais condizentes com o que se espera dos relacionamentos e convivências. É difícil descobrir que existam pessoas a quem o sofrimento nada causa; elas não se deixam moldar. Choram, imploram e rezam enquanto estão sofrendo, fazendo promessas de que se conseguirem tal e tal coisa, tornar-se hão pessoas melhores; mas quando a nuvem de poeira finalmente baixa, elas voltam a ser como sempre foram. Porque elas não mudam. E descobrir isso é realmente frustrante. A dor deveria unir; pelo menos, é isso que dizem todos os poetas. Ou quase todos. Mas muitas vezes, a dor separa, e a perda é como a cola que unia as páginas de um livro e que se quebrou, e as páginas passam a voar por aí sem direção ao primeiro vento.

E diante disso tudo, você descobre que seu caminho será solitário. Você perdeu o respeito pelas pessoas que deveria respeitar, porque descobriu que elas nunca respeitaram você. Você percebe que passou anos desperdiçando seu amor com quem nunca o amou. Dedicou seu respeito e sua consideração a quem jamais mostrou reciprocidade. Mas se você puder ser forte, perceberá que foi melhor assim. Porque nada o deixará mais forte do que sentir-se fraco algumas vezes. Nada abrirá mais os seus olhos do que uma coleção enfileirada de desilusões de todos os tipos. Nada fará com que você reconheça melhor a verdade e as dissimulações do que cair em armadilhas de mentiras várias vezes na vida. Nada o deixará mais forte do que chorar lágrimas amargas pelo que perdeu, e perceber que no final das contas, você nunca realmente teve aquilo que pensava que tinha. 

E então, um dia você acorda e percebe que não perdeu nada. Quem perdeu foram eles. 

O que dirão de você o escandalizará, até que chegue ao ponto em que só o fará rir: você será chamado de orgulhoso, distante, frio, incompreensível, difícil, preconceituoso. Servirá como um espelho para que eles recitem seus próprios defeitos enquanto pensam que estão falando de você. 

De longe, você vai observar os mesmos velhos jogos sendo jogados, as mesmas armadilhas e trapaças sendo armadas, as mesmas velhas regras sendo recriadas e burladas, as promessas sendo quebradas, e dará graças por não estar mais no meio daquele furacão. 






SEM










Pão sem sal ou glúten,
Doce sem açúcar,
Café sem cafeína,
Manteiga sem gordura,
Leite sem lactose,

- Vida sem ternura...







Parceiros

Wyna, Daqui a Três Estrelas

Este é um post para divulgação do livro de Gabriele Sapio - Wyna, Daqui a Três Estrelas. Trata-se de uma história de ficção científica, cuj...