witch lady

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sexta-feira, 6 de abril de 2012

FOTOS ANTIGAS




Sonhei que examinava velhas fotos de família. Enquanto ia abrindo as páginas do álbum, os acontecimentos ali retratados tomavam vida e ganhavam movimento. Vi fotos de uma festa de São João na casa de minha irmã. Meus sobrinhos ainda eram pequenos, meu cunhado tinha cabelo e a Tia Rosa estava viva. Até meu pai aparecia em uma das fotos...
Vi fotos de uma menina tímida, que acreditava que seus sonhos eram impossíveis. Ela nunca acreditaria, se alguém, naquela época, lesse seu futuro e dissesse como seria sua vida hoje. Não sou mais aquela menina magrela, insegura, complexada. Na foto, ela anda entre as pessoas, tentando não aparecer muito, não querendo incomodar.
Vi pessoas que um dia fizeram parte de nossas vidas, mas que hoje desapareceram completamente em algum lugar no infinito tempo. Eu já não pensava nelas há séculos. Algumas viveram entre nós por um período muito curto, mas deixaram marcas profundas; outras, ficaram mais tempo, deixando marcas profundas ou não. Algumas ainda, ficaram por um período tão breve que nem sequer me lembro de seus nomes. Mas todas estiveram conosco um dia.
Vi minha mãe bem mais jovem. Minhas irmãs. Meu irmão. Vi cães e gatos que tivemos.
Acho que sei o motivo deste sonho:
Sábado. Andávamos pela Rua l6 de Março após o almoço, conversando animadamente e planejando o resto do nosso dia. A rua estava movimentada e alegre. Eu estava contente, pois tinha acabado de comprar um casaco que vinha namorando há duas semanas, e estava de mãos dadas com meu marido, a pessoa que mais amo no mundo. O céu encoberto, uma leve brisa soprando. Quase frio. Para mim, um dia perfeito.
Foi quando o vi.
Após a reforma do Centro Histórico de Petrópolis, colocaram banquinhos de madeira ao longo das calçadas. Ele estava sentado em um deles. Sujo, totalmente envelhecido, o olhar perdido em algum lugar bem longe dali, fixo nos pés das pessoas que passavam na calçada. Estava só. Eu ainda vinha longe, quando o avistei. Achei seu rosto familiar, mas não consegui identificá-lo de imediato. Ainda estávamos longe um do outro, quando ele ergueu a cabeça e nossos olhares se cruzaram. Rapidamente, ele desviou os olhos . MAs eu continuei olhando para ele. Mas ainda não tinha certeza...
Voltei no tempo há uns vinte e cinco anos atrás. Lembrei-me de nossa adolescência, ele em nossa casa ouvindo música, nós dançando no som do Serrano F.C., andando pelas avenidas de Petrópolis e aprontando todas. Lembrei-me de uma linda casa no Quarteirão Brasileiro onde ele morava. Lembrei-me que um dia eu até tivera uma quedinha por ele, e por isso, minha carteira da escola era toda desenhada com carinhas do Cebolinha, personagem de Maurício de Souza, pois esse era o apelido dele. Isso, antes dele começar a namorar minha irmã. Então ele se tornou, durante algum tempo, quase um membro da família. 
Viajamos juntos para Cabo Frio uma vez, junto com toda a minha família; ele e minha irmã já namoravam. Foi uma época muito divertida.
Todas estas lembranças vieram à minha cabeça como um relâmpago. Apertei a mão de meu marido. Seria ele? Eu não estaria confundindo? Aquela pessoa velha, extremamente magra , que vestia roupas sujas e surradas seria mesmo ele, aquele jovem engraçadíssimo, cheio de vida e com todas as oportunidades pela frente?
Nisso, eu já estava passando quase em frente ao banco onde ele estava sentado. Meu marido também o olhou. Ele ergueu os olhos novamente, mas eu ainda não tinha certeza. Até que ele murmurou um "oi" constrangido. Quase forçado. Reparei que lhe restavam poucos dentes. Respondi com um outro "oi" ainda incerto.
Era ele! Compreendi isso quando já estava a alguns passos adiante. falei com meu marido sobre o que tinha acontecido, meu coração pulando em minha garganta. Ele respondeu: "Mas aquele homem é um mendigo! Você tem certeza?"
Sim, eu tinha. Era ele, era o Cebolinha.
Um personagem do meu passado. Senti-me péssima por não ter feito nada, mas o que eu poderia ter feito?
Lembrei-me da última vez que o encontrara, ali na 16 de Março, há mais ou menos quinze anos. Ele estava bem, e carregava um menino no colo. Seu filho. Mandou lembranças para todos lá em casa. Não, não poderia ser a mesma pessoa. Mas era!
Ele não queria que eu o tivesse visto. Notei que se sentia muito constrangido. No que será que ele pensou quando me viu?
Será que eu deveria ter parado, perguntado a ele o que tinha acontecido, se ele precisava de alguma coisa? Ele teria apreciado isso? Não sei... mas tive a impressão que ele não queria que eu falasse com ele, tanto que desviou os olhos quando me viu pela primeira vez. Na verdade, não sei se errei ou acertei. Se minha atitude foi covarde ou sensível.
Acho que por isso, tive esse estranho sonho. Resgatei alguns personagens do meu passado, muitos dos quais já tinha me esquecido. Acho que isso faz parte do amadurecer.
A vida dá voltas. Isso é um cliché, mas é a mais pura verdade. Como seria, se soubéssemos , com certeza, no que nos transformaríamos daqui a alguns anos? Eu sou outra pessoa, ele é outra pessoa, você também é. Mas vê-lo fez com que eu me desse conta disso. Foi como um tratamento de choque, uma coisa que a vida queria que eu percebesse mas não estava conseguindo fazer com que eu enxergasse. E quando não enxergamos o que a vida quer nos mostrar, ela o esfrega em nossa cara.
A vida é um susto. A vida é imprevisível. A vida é uma surpresa, e deve ser vivida como tal. Se não tomarmos cuidado... 







BRILHO DE ESTRELAS E ANSEIO









Ninguém pergunta às estrelas

O porquê de seu brilhar,

Embora haja um motivo.




Para todos, basta vê-las,

E quem sabe, até ouví-las,

Como já disse o poeta.




Espalhadas no infinito,

As estrelas dos meus sonhos

Brilhando, em busca de rumo




Anseiam por um planeta

Que lhes forneça uma órbita

E um profundo céu escuro.




Existe em mim a vontade

De ter um anel de saturno

Brilhando sobre o meu dedo,




E uma estrela que cintile

E que traga alguma luz

Ao que me resta de medo.



PAIXÃO






E então, aquele que tinha vindo para revelar a sombra dos que reinavam, mostrando a eles mesmos o seu grau de corrupção, foi capturado. 

Como pudera ele atrever-se a derrubar o templo seguro das verdades que há séculos norteavam existências? Como pode ele ter tido a coragem de desafiar seus dogmas e preceitos há tanto estabelecidos e jamais questionados? E aqueles a quem ele chamava de discípulos não passavam de gente simples do povo, gente sem representatividade que, não mais que de repente, eram premiados com a missão de espalhar a Palavra que ele desencavara dos confins dos corações humanos! E que dizia ser a Palavra Divina! Mas eles tinham a palavra Divina, e apenas eles!

Mas a multidão oprimida, com suas almas sedentas e ressecadas, seguia o mestre e seus discípulos a todos os lugares, e sentavam-se para ouvir suas histórias. Eles prometiam um mundo melhor, onde a repressão e a dor teriam fim. Bastava que para isso, eles o seguissem e cumprissem o novo dogma. Bastava que desistissem das ilusões aflitivas e tribulações daquele contexto de mundo cansado e repressor no qual estavam inseridos. Mas haveria ranger de dentes até que toda aquela paz pudesse ser alcançada! Haveria morte e perseguição, mas desta vez, por um ideal maior que eles mesmos. Ora, já não eram mortos e perseguidos em favor dos que estavam no poder e lhes usurpavam as almas? Desta vez, a perseguição sofrida seria por uma causa maior: a salvação da humanidade!

E muitos acreditaram nele. Muitos o seguiram, bebendo suas palavras e assimilando as novas verdades. Assim, ele tornou-se perigoso, pois proclamara-se um novo rei, com promessas de um novo reino de vida eterna a seus seguidores, que em muito ultrapassava as expectativas daquele povo e as capacidades dos antigos governantes e líderes espirituais.

Ele tinha que ser calado. Enviaram-lhe o Rei das Trevas, com promessas de ouro, prata e poder sobre toda a humanidade. No deserto de sua própria sede e de seu próprio medo, ele foi tentado. Só mesmo o seu próprio coração pode reconhecer a dificuldade que ele teve ao dizer ‘não’ a todas aquelas ofertas! Mas ele conseguiu, e atravessou seu próprio deserto, agora consciente da própria sombra que carregava, fruto de sua própria luz.

Como ele não havia cedido, a única alternativa que lhes restava, era eliminá-lo. Para isso, procuraram o mais fraco de seus discípulos – o mais ambicioso – e o convenceram-no a traí-lo; mas disseram que não se tratava de traição, e que tudo seria para o próprio bem de seu mestre, e que nenhum mal lhe seria feito. Tudo o que ele precisava para ser novamente libertado, era negar suas convicções errôneas e deixar de colocar ideias malucas na cabeça do povo. Que mal poderia dar-se daquela atitude? E não seria traição, já que o discípulo só estaria contribuindo para que seu mestre permanecesse vivo e fisicamente íntegro!

Assim, com um beijo, a história foi selada.

O mestre foi conduzido a um tribunal, onde as autoridades não quiseram responsabilizar-se pelo seu destino. A decisão seria do povo – seus seguidores. Levaram-no diante deles, junto com Barrabás, o Ladrão, e disseram ao povo que eles deveriam decidir quem morreria e quem viveria.

A multidão calou-se por um instante, indecisa diante da sombra e da luz. Pela primeira vez, estavam diante de dois espelhos, mas em apenas um deles, reconheceriam a sua imagem.

Lembraram-se dos muitos anos durante os quais a luz de poucos projetara sombras escuras sobre a sua existência. Mas, por outro lado, lembraram-se das promessas de luz eterna e conhecimento,feitas pelo mestre que os ensinara, sentado sobre as colinas, e das tardes maravilhosas que haviam desfrutado juntos. Mas também se lembraram de que ele mesmo dissera que, para que a luz fosse feita, e para que a paz fosse alcançada, muitos deveriam morrer. E mil dúvidas vieram Às suas mentes: será que existia mesmo, a vida espiritual prometida? Tudo o que conheciam, era aquela vida carnal, urgente, incontestável, feita de dores e prazeres.

Por fim, concluíram que, se a vida espiritual realmente existisse, que mal fariam, se enviassem seu mestre até ela? Não deveria ele precedê-los, e guardar seus lugares junto ao Pai maior?

A decisão que tomaram foi assim justificada; mas o que eles não perceberam, era que matar o ladrão seria o mesmo que matar algo importante em todos eles, pois Barrabás era o receptáculo de suas sombras! Durante suas vidas, eles tinham aprendido a lidar melhor com a sombra do que com a luz. Não estavam prontos para abrir mão de seu lado mais obscuro, trazendo-o à luz do conhecimento. A salvação teria que esperar por mais alguns séculos, até a humanidade pudesse reconhecer a sua sombra e lidar com ela adequadamente, trazendo-a à luz.

Mal sabiam eles que tinham feito a escolha certa, nada mais, nada menos do que exatamente o que o mestre esperava que eles fizessem, pois a luz foi devolvida a uma dimensão à qual não os cegava, e eles podiam procurá-la e olhar para ela sem correrem o risco de se tornarem cegos por seu brilho. Bastava-lhes saber que ela existia.

E a promessa, feita pelo mestre, de muitas dores e provações até que pudessem alcançá-la e olhá-la de frente, até hoje é cumprida na face da terra.



quinta-feira, 5 de abril de 2012

Sexta Feira Santa






Sei que houve, mas não consigo lembrar-me de uma Sexta Feira Santa que não tenha sido cinzenta. Geralmente, este é um dia silencioso, no qual muitas pessoas jejuam e se recolhem em oração e meditação.
Não sou religiosa. Não creio em tudo o que está na Bíblia. Tenho medo e desconfio de qualquer coisa que tente determinar em quê devo acreditar, como devo me vestir ou de que maneira devo pensar.
Mas mesmo assim, acho as Sextas feiras Santas dias especiais. Elas foram feitas para que possamos pensar em várias coisas. Por exemplo, no quanto é fácil cometer uma injustiça quando nos omitimos, mesmo sabendo da verdade, ou quando apenas seguimos a maioria.
Podemos também aproveitar para medirtarmos sobre quanta destruição e dor uma traição pode causar. E que aquele que trai, será sempre lembrado não pelas boas obras que cometeu, mas por aquela (talvez única) traição que perpetrou, mesmo que tenha havido também, em sua vida, boas ações.
A Sexta Feira Santa também nos ensina o quanto somos cruéis ao queimarmos, ano após ano, durante séculos e séculos, a figura de um homem que errou, fraquejou e caiu - mesmo que este homem tenha se mostrado tão arrependido a ponto de tirar sua própria vida. Continuamos a julgá-lo e condená-lo, sem perdão. Como se nós jamais tivéssemos errado, fraquejado e caído.
Esta data também é importante para nos ensinar uma verdade afirmada pelo próprio Cristo (mas que ele mesmo se esqueceu de praticar): "Não jogueis pérolas aos porcos." Porque, para mim, foi o que ele fez, ao sacrificar-se por uma humanidade que não estava, não está e tão cedo não estará pronta para entender o que ele tentou ensinar. Porque eu tenho certeza: se ele tivesse vindo hoje, seria tratado da mesma maneira. Ou até pior.
Por estes e outros motivos, acho a Sexta Feira Santa um dos dias mais importantes do ano. É o dia da sombra. É o dia de encararmos a nós mesmos e aos nossos atos e decidir quem somos: o que joga pérolas aos porcos, o que trai, o que condena, o que se omite, ou o que não perdoa. Porque em diferentes momentos da vida, todos nós encarnamos estas personalidades. 






ABISSAL







Escolhi do mar
As lembranças
Que desejei ter...
Quase afogada,
Pés atados pelas algas
Que tentavam me reter.

Um cavalo marinho,
Para cavalgar em meus sonhos salgados,
Uma estrela do mar,
Para fazer um pedido,
Uma tartaruga
Para eu, distraída, vir a perder,
Três peixes,
Que me ensinem a nadar sem morrer
E que me levem aonde está você.



O CAMINHO DA FLOR





Queria voar, queria existir,
Bem além do seu jardim.
Pétalas erguidas ao céu,
Recebiam a chuva e o sol,
Mas desejavam o vento
Que a erguesse
E a levasse
Para muito além
Daquelas paragens.

As outras flores riam,
Não entendiam...

Fechavam-se à noite,
E ela, se abria toda!
Despertavam bem cedo, pela manhã,
E ela, quase ao meio-dia...

Flor rebelde, que queria
Fortemente, o que não conhecia....

Até que um belo dia...

Veio o vento, e a levou
Para o céu, em vis rajadas!..
As outras flores, amedrontadas,
Lamentavam o destino
Da amiga enlouquecida.

Enquanto isso, ela voava,
E olhava, lá de cima,
A vida, as outras flores,
Passando por outros jardins,
Conhecendo outras fronteiras,
Sentindo o beijo da brisa
Deitado sobre suas pétalas.

Foi deixada em uma poça,
E morreu de morte encantada.




quarta-feira, 4 de abril de 2012

DAS SOMBRAS






Das sombras, nascerão rosas!
De dentro da escuridão
Brotarão das mãos Divinas...

Silêncio negro e profundo,
Que envolve e governa o mundo,
Adubo do renascer...


E ao reabrir dos olhos,
Surpresa e arrebatamento,
É isso que quero ver!

E mesmo na incerteza,
Nas sombras, plantarei rosas,
Que um dia, hei de colher...



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DA PÁSCOA






Da Páscoa...

Da Páscoa, eu me lembro de minha irmã com caixas de sapato e papel de seda, fazendo 'ninhos' para o coelho por os ovos. Ela cortava alguns babados de papel, colava à volta da caixa, e depois, fazia palha fininha com o que sobrava dele, enquanto eu ficava imaginando o que encontraria na manhã seguinte.

Da Páscoa, lembro-me das quaresmeiras em flor. O morrinho ao lado da casa ficava salpicado de roxo e amarelo.

Da Páscoa, lembro-me de meus pais me acordando no domingo bem cedinho, e de eu levantar da cama correndo para ir olhar meu ninho de caixa de sapato, cheio de ovinhos de chocolate e bombons.

Da Páscoa, lembro-me da família reunida na sala de estar, assistindo àqueles filmes religiosos que passavam na semana santa, todos comendo bombons. Havia bombons que não existem mais, com sabores de frutas: figo, ameixa, pêra, laranja. Não gostávamos deles, e eram sempre os últimos a serem comidos.

Da Páscoa, lembro-me de minha irmã e eu, e das outras crianças do bairro, todos unidos depois do almoço de domingo, para mostrarmos nossos ninhos uns aos outros e comermos chocolate.

Da Páscoa, lembro-me do almoço em família, o cheiro do 'batatalhau' se espalhando pela casa.

Da Páscoa, lembro-me de nós no Teatro Mariano, para assistir, pela enésima vez, "A Paixão de Cristo." 

Da Páscoa, lembro-me do enorme ovo de chocolate que minha irmã mais velha ganhava do namorado, e que ficava sobre o móvel da sala de estar, por meses a fio, e no qual não podíamos nem sonhar em tocar... uma vez, ela demorou tanto tempo para abrí-lo, que quando o fez, ele estava todo mofado.

Hoje, eu sei do verdadeiro significado da Páscoa, mas quando eu era criança, eu o vivia muito mais intensamente, sem o saber...



Na Minha Idade...










Fazer quarenta anos foi um marco, assim como fazer vinte, trinta... agora, aos quarenta e seis, encaminho-me para uma nova década que se aproxima cada vez mais. São fases, como pontes que cruzamos durante nosso caminho pela vida.


Me desculpe quem acha que é fácil envelhecer. Palavra feia, não é mesmo? ENVELHECER. Mas aceitemos a verdade de que este processo começa no momento em que nascemos, e a coisa fica um pouco mais fácil e natural. Ninguém nasce velho e começa a renovar-se, como no filme. E se é assim, deve haver um bom motivo.

Tudo na natureza aponta para este ciclo: nascer, crescer, envelhecer, morrer - embora nem sempre este ciclo siga esta ordem. Muitos se vão ainda bem jovens, e esta é a única maneira de não envelhecer. Mas não me parece uma idéia muito agradável, embora eu não tenha medo da morte e nem seja extremamente apegada à vida. Que aconteça o que tiver que acontecer! E quem sabe, exista uma continuação neste ciclo que a maioria de nós desconhece: renascer. Começar tudo de novo. Ter uma outra chance. Por que não? Que me provem o contrário.

Mas uma das coisas mais difíceis na minha idade, não é exatamente a própria decadência física: mas a decadência de nossos pais , parentes e amigos mais velhos que nos cercam. Não é nada fácil assistir aqueles que acostumamos a ter como pontos de referência em nossas vidas envelhecendo, adoecendo, tornando-se fracos, vulneráveis e, muitas vezes, perdendo a capacidade de raciocínio. De repente, nos vemos na posição de termos que assumir a responsabilidade pela família, um cargo que pode ser extremamente pesado e causar muita angústia, submetidos que somos às ansiedades e necessidades de nossos irmãos e pais - quando estes não são mais capazes de tomar decisões, como sempre.

Em toda família, existe aquele que substituirá os pais, quando estes não mais puderem ocupar a sua posição de liderança, ou pior, quando eles não estiverem mais por aqui. Geralmente, é o irmão mais velho. E cuidar de uma família não é tarefa fácil, especialmente quando os demais não se dão conta de que o outro precisa de ajuda. Colocam-se em uma posição confortável, assumindo que o mais velho cuidará de tudo, sem perceber a pressão que ele sofre, tanto física quando psicológica, emocional. E nem o fazem por maldade, e sim, pela vontade inconsciente de não assumirem riscos. "Aquilo para o qual eu não olho, não existe, e pronto!"

Na minha idade, vejo minha mãe, aos oitenta e cinco anos, cada vez mais entendendo que sua hora está chegando. Convencê-la a ir ao médico é uma dificuldade, pois ela diz que suas mazelas e dores são consequência da idade, e acha que não adianta, mesmo, 'já que está no fim.' Isto gera uma angústia em todos nós que gostamos dela, e desejamos vê-la bem. E acho que esta angústia vem exatamente da compreensão de que ela está certa. O fim está se aproximando. E vemos nela, na sua idade avançada e na sua fragilidade, o nosso próprio futuro. 

Observo o quanto as pessoas idosas veem sua posição mudar dentro da família. Antes, o que elas diziam era ouvido , acatado ou pelo menos, digno de uma boa reflexão. Agora, elas são ignoradas, deixadas em um canto enquanto os outros conversam, sentindo que ninguém está interessado em ouvir o que elas tem a dizer, que sua presença é tolerada compassivamente. Apenas tolerada. E quando essa tolerância acontece, podem considerar-se com sorte! Pois muitos não toleram seus esquecimentos, as mesmas perguntas que são feitas várias vezes, as coisas que caem de suas mãos frágeis e espatifam-se no chão. E talvez elas sejam tratadas assim porque nos fazem conviver com a nossa realidade futura a todo instante, e muitos de nós não sabem como lidar com ela.

Por favor, não me digam que é fácil envelhecer. Não me digam que é um processo natural da vida, pois disso, eu já sei, e saber não torna tudo mais fácil. Sei também que aceitar a vida e seus ciclos é a coisa mais sensata a se fazer, pois nada vai mudar se passarmos a vida fazendo pirraça contra aquilo que nos desagrada. Reconheço que a vida deve ser vivida e desfrutada com o máximo de alegria e gratidão em qualquer época e a qualquer idade, pois não sabemos o que o futuro nos reserva, e nem é saudável cogitar sobre isso.

Mesmo assim, e apesar de ser uma pessoa feliz, envelhecer não é fácil.



terça-feira, 3 de abril de 2012

Mudando Sempre...





Há uma certa necessidade de permanência em mim. Gosto de morar onde moro, estou há vinte e sete anos com a mesma pessoa (casada há quase vinte e dois anos) e sou bastante conservadora daquilo que aprecio. Mas existe também - confesso - uma certa impermanência em meu desejo de permanência.

Explico: adoro mudar as cores e organização de meus espaços! Em minha casa, por exemplo, frequentemente troco as capas das almofadas, as cortinas e a disposição dos móveis. Gosto de comprar novos adornos, 'aposentando' os antigos por algum tempo, trocando-os de lugar ou até mesmo, fazendo doações. Na minha maneira de vestir-me, essas mudanças também ocorrem frequentemente. Tenho cores predominantes, em certas épocas. Já fui pink, preto, amarelo, branco, azul... atualmente, acho que estou em transição, do verde para alguma outra cor que ainda não escolhi qual será.

Da mesma maneira, é meu blog. Gosto de trocar o plano de fundo, as cores, as letras... e também adoro escrever sobre absolutamente todos os assuntos que me interessam: poemas, crônicas, contos, artigos, Haikais, romances, resenhas... sempre gosto também de variar no conteúdo; às vezes, escrevo sobre a tristeza, e outras vezes, sobre a alegria, o ciúme, a inveja, a felicidade... todos os sentimentos humanos já passaram sob a minha pena, assim como em minha vida. Escrever sobre eles, ajuda-me a entendê-los.

Também sou assim quanto a mudar de opinião, se necessário. Não costumo agarrar-me a uma idéia apenas porque ela foi a primeira idéia que me ocorreu, ou a que alguém me ensinou. Mudar de opinião e alcançar uma nova visão sobre as coisas faz parte do crescimento, e ater-se a dogmas, o paralisa.

A leitura faz parte de mim, e gosto de ler sobre vários assuntos. Mas, acima de tudo, não sei viver sem escrever! Só me sinto completa quando escrevo todos os dias.

Minha vida pode parecer sempre a mesma para quem me observa - uma simples professora, que dá aulas particulares em sua própria casa - mas eu posso garantir que, todos os dias quando acordo, olho para as mesmas coisas, mas sempre com um novo olhar! Jamais sinto-me entediada durante muito tempo. E quando me sinto entediada, é porque por algum motivo, não estou bem. Mas trato de mudar de atitude assim que posso!

A vida nunca é a mesma, basta que tenhamos sobre ela um olhar sensível e apreciativo. Assim, embora eu seja, em essência, a mesma pessoa, meus gostos e o ambiente à minha volta estão sempre mudando. Aos poucos, mas também radicalmente.

A ESPOSA FADA - Um conto







Um conto baseado em lendas Celtas.


Rodolfo acordou no meio da noite, e ainda parcialmente habitando os sonhos, olhou para o lado. Viu-lhe a silhueta desenhada sob as cobertas, que se erguia levemente, conforme ela respirava em seu sono tranquilo.

Uma onda de amor e paixão inundou-o. 

Lembrou-se de como a conhecera, há um ano e seis meses: 

Caminhava pela floresta após o almoço, a mesma velha floresta pela qual costumava caminhar desde os seis ou sete anos de idade (naquele tempo, escondido de seus pais, que temiam que se perdesse). Conhecia o que estaria depois de cada curva, e cada canto de pássaro. A floresta era como se fosse sua segunda mãe, pois vira-no crescer, transformar-se em um homem. Ela o protegera e o escutara em seus momentos de dificuldades, sempre respondendo às suas questões e acalmando suas ânsias como o faria uma dedicada mãe, através do sussurro do riacho, do canto dos pássaros e do beijo sibilante do vento.

Como eu já disse, Rodolfo conhecia cada curva da floresta; por isso mesmo, ficou estarrecido ao ir ter à beira de uma fonte que parecia ter aparecido do nada, no meio das árvores, onde uma linda moça banhava seus pés. Parou, encantado diante da beleza da cena:

A jovem, vestida com uma túnica branca diáfana, estava sentada na beirada do riacho, e a água que caía de uma pequena fonte fazia bolhas em volta de seus pés. Os cabelos, muito claros e longos, caíam-lhe em cascatas até a cintura, e uma grinalda de flores do campo ornava-lhe a cabeça. A pele era tão branca e delicada, que Rodolfo comparou-a aos cogumelos que cresciam em seu jardim, no meio da grama, e que ressecavam aos primeiros raios de sol.

Ela ergueu os olhos e olhou para ele como se o conhecesse. Não houve qualquer sobressalto. E ele também teve uma estranha sensação de já tê-la encontrado antes, mas em um tempo tão remoto, que apenas uma leve bruma de memória conseguia chegar até ele, e uma bruma tão leve quanto breve.

Desde então, eles passaram a encontrar-se ali todas as manhãs. E mesmo que estivesse chovendo torrencialmente, ali naquele ponto na clareira da floresta, uma nesga de sol brilhava.

Ela aceitou casar-se com ele, para seu alívio, pois Rodolfo não concebia a idéia de viver longe dela; preferiria morrer!

Mas ela impôs algumas condições:

-Ele jamais deveria fazer perguntas sobre ela; de onde viera, quem era sua família, ou que forma de vida ela era.
-Jamais deveria abrir um pequeno baú que ela guardava sempre junto a si, e nem indagar-lhe o que ele continha.
-Ela precisaria ficar algumas horas por dia totalmente só, e ele jamais poderia seguí-la, questioná-la ou espioná-la.
-Na primeira noite de lua-cheia, ela iria para a floresta. Nem foi preciso dizer que o faria sozinha, e que ele não deveria seguí-la jamais!
-Eles teriam que viver para sempre junto àquela floresta.

Recordando-se daqueles tempos, Rodolfo percebeu quando a esposa acordou, pois o rítimo de sua respiração tranquila mudou. Ele fingiu que ainda dormia, enquanto ela se levantava e, abrindo a porta do chalé, saía pela noite enluarada, a barra da camisola esvoaçando atrás de si, e ela, mergulhando na floresta escura até desaparecer.

Todas as noites de lua cheia, quando ele a via sair, sentia curiosidade em saber o que ela fazia. Encontrar-se-ia com alguém? O ciúme o dominava, mas lembrava-se da promessa feita a ela, e forçando a sua própria natureza, não a seguia. Naquela noite em especial, estava tão ansioso que decidiu ir até a pequena cozinha preparar para si um pouco de chá.

Foi quando deparou com o pequeno baú na prateleira da despensa. Uma estranha luz azulada saía pelas frestas da madeira. Imediatamente, Rodolfo começou a tremer de curiosidade, e mesmo fazendo todo o esforço que conseguia para conter sua curiosidade, acabou pegando o pequeno objeto e, ainda hesitante, abriu uma pequena fresta da tampa...

Foi o suficiente para que a luz azul escapasse, em uma explosão de raios que dominaram toda a pequena casa! Quem estivesse passando na floresta àquela hora, teria visto uma luz azul que explodia para fora do chalé, através de portas, janelas, chaminé e frestas, iluminando tudo em um raio de quilômetros!

Quando ele despertou, estava caído no chão da cozinha, e o baú, tinha desaparecido. Assim como desapareceram todo e qualquer traço da presença de sua esposa pela casa. Ele procurou pela cesta de palha que ela tecera durante a manhã; também olhou dentro das panelas, e a comida tinha desaparecido. Todas as coisas feitas por ela - cortinas lindamente confeccionadas, cestos, pequenos candelabros delicados, flores que ela colhia e nunca murchavam, enfim, tudo desaparecera. A cabana era apenas um lugar nu, gelado e sem-vida.

Ele correu para a floresta, e tentou em vão encontrar a clareira onde tinham se conhecido.
Chamou por seu nome. Chorou copiosamente, gritando ao luar o seu arrependimento. Mas ninguém respondeu-lhe. 

Quando o dia amanhecia, voltou para a casinha. Olhou-se no espelho: era um homem velho.



Parceiros

Wyna, Daqui a Três Estrelas

Este é um post para divulgação do livro de Gabriele Sapio - Wyna, Daqui a Três Estrelas. Trata-se de uma história de ficção científica, cuj...