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sexta-feira, 30 de março de 2018

Feliz Páscoa!






Feliz Páscoa!

Desejo a todo uma Feliz Páscoa. Que possam encontrar nesta data, que para mim é tão importante quanto o Natal, um pouco de arte - arte de conviver, de ser humilde, de olhar para o outro e enxergar nele o melhor.

Arte de alegrar-se pelas conquistas alheias, respeitar escolhas, partilhar sonhos. Arte de saber rir de si mesmo e não levar a vida tão a sério, sem colocar-se como o centro do universo.

E acima de tudo, nesses tempos tão estranhos, arte de saber discernir, ler nas entrelinhas, tomar decisões acertadas baseadas em escolhas refletidas. Arte de saber canalizar a violência e o antagonismo dentro de si e transformá-los em alguma expressão mais bonita e suave que possa pacificar o mundo, ao invés de despertar ainda mais ódio.

Feliz Páscoa a todos.




quarta-feira, 28 de março de 2018

Outono









Na tarde de outono,
A quase lua cheia
Tão pálida, tão branca,
Passeia de um lado;
Do outro, o sol poente.

Num céu azul-marinho
(Vermelho no horizonte)
A saga dos amantes:
Eterno despedir-se
No instante em que se veem...

A lua e o sol no céu,
No mesmo céu de sempre,
Um céu sempre de adeus,
Como quando me vejo
Dentro dos olhos teus.



A todos os leitores e amigos do blogger, meus sinceros desejos de uma Feliz Páscoa e uma Semana Santa de muitas reflexões!





terça-feira, 27 de março de 2018

Negação - Um Texto de Sri Prem Baba







“Esta é a ilusão básica que sustenta a miséria do mundo: a ideia de que somos carentes e precisamos receber algo de fora.” – Sri Prem Baba

NEGAÇÃO


“O distanciamento da nossa verdadeira identidade vai se tornando cada vez maior, até que chega um momento em que ocorre uma cisão: perdemos a conexão com aquilo que somos e passamos a acreditar que somos a máscara. Esse rompimento é extremamente doloroso, é como se fôssemos cortados ao meio e um buraco se abrisse dentro de nós. Daí nasce todo vazio interno que acompanha o ser humano em toda a sua existência. E para conseguirmos lutar contra essa dor brutal, acionamos o mecanismo da negação.





Assim como suavizamos a dor das feridas físicas com analgésicos, amenizamos a dor das feridas emocionais através da negação. A negação é como um analgésico psicoemocional que pode agir por tempo indeterminado. Trata-se de um mecanismo que tem o poder de jogar para os porões do inconsciente todos os sentimentos negativos, todo o conteúdo interno que não queremos ver ou sentir. Dessa forma, escondemos dos outros e de nós mesmos aquilo que não aceitamos e com o que não queremos entrar em contato. 
Essa é a forma que encontramos para nos proteger e não mais entrar em contato com a realidade de que fomos reprimidos e machucado. Esse mecanismo sustenta a falsa identidade, porque fortalece a crença inconsciente de que somos vítimas carentes e que não somos aceitos pelo que realmente somos. 
..........





Essa desconexão gerada pela cisão com a verdadeira identidade gera a ilusão de que somos separados da fonte da vida. Em outras palavras, nós perdemos a consciência de que a fonte da vida nos habita e de que nós somos parte de uma corrente de energia universal de onde recebemos tudo o que precisamos. Acreditando estar separados dessa fonte que nos nutre, nós passamos a acreditar que somos carentes e com isso nos tornamos escravos do outro. Nós temos a fonte do amor dentro de nós, mas acreditamos que precisamos receber esse amor de alguém. 



quinta-feira, 22 de março de 2018

PASSARINHO







Passarinho


Passarinho é coisa tão, mas tão delicada...
Canta e morre assim, de repente, do nada.
Pousa no galho, pia e faz graça,
E depois ele voa, e nunca mais passa.

Deixa no ar uma penugem leve
Que cai devagar, ao vento entregue;
Pousa nos pés de alguém que nem vê,
Essa pequena pluma, presente tão breve!

Passarinho é coisa tão, mas tão bonita...
Canta e encanta o amargor dessa vida.
Nasceu para voar e para ir embora,
Mas sempre há alguém que o põe na gaiola!

E ele canta, assim, só de tristeza
Na tarde que cai, inclina a cabeça...
E quem o escuta, ainda diz que é alegria
Pois não consegue escutar sua agonia!

Passarinho é coisa tão, mas tão abençoada...
Nasceu para ir, assim, na revoada,
Bando de seres alados, quais anjos,
Soltam seu canto no céu que cobre a estrada!

Passam voando por sobre a gaiola
Onde, desolado, um deles só chora...
-Deus queira que um dia, em hora incerta,
Alguém não perceba a portinhola aberta!

Porque passarinho tem por codinome
A palavra mais linda por sobre o seu nome:
E ela é Liberdade, essa coisa que a inveja
De quem jamais voa, sem dó, apedreja.






Arrogância ou Amor Próprio?









Às vezes, alguém escolhe não gostar de nós. Não importa o que façamos, tal pessoa simplesmente olha para nós e decide que temos alguma coisa que as incomoda. Talvez seja a nossa maneira de andar, olhar, sentar, falar. Quem sabe, a nossa maneira de calar. Ou de respirar. Não importa: quando alguém nos escolhe como alvo, de nada adianta lutar contra isso, ou tentar reverter a situação, pois não importa o que possamos fazer, só servirá para agravar ainda mais a situação, pois será apenas mais uma anotação feita no livro do ódio dessas pessoas. Qualquer coisa que façamos ou digamos será distorcida e virará uma justificativa, diante dos outros, que a pessoa usará para continuar nos detestando.

Uma vez trabalhei com uma moça que não gostava de mim, embora eu jamais tivesse dado a ela motivos para tal. Durante uma conversa informal entre amigas, eu descobri o motivo de tanto ódio – e acreditem, a futilidade de tal motivo muito me chocou. Conversávamos sobre características físicas, uma conversa informal e bem-humorada, quando de repente ela me olhou e soltou esta pérola na frente de todo mundo, a voz trêmula de ressentimento: “Você tem peito e tem bunda. Eu queria ter esse corpo.” Bem, a moça em questão era magra e bem proporcionada, e jamais teria passado pela minha cabeça que ela me invejasse pelos meus atributos físicos que mais me incomodavam. Devido à futilidade do motivo, mais tarde eu fiz de tudo o que podia para mostrar a ela que eu era uma pessoa legal, afinal de contas, mas de nada adiantou. Ela me detestou por anos a fio, inclusive me prejudicando voluntariamente no trabalho várias vezes. 

Ontem eu conversava com alguém e ela começou a falar sobre o ressentimento que algumas sogras guardam a respeito de suas noras. Tal ressentimento, muitas vezes sem qualquer razão, está baseado na falsa verdade de que a nora “roubou” seu filho. A sogra que pensa desta forma se recusa a compreender que o seu ódio não é da nora em questão, mas de qualquer uma que estivesse no lugar dela; até mesmo se fosse um grande amigo com quem o filho passasse muito tempo, ela talvez o odiasse da mesma forma. Mas tais ódios em família causam fendas entre os relacionamentos, e essas fendas tendem a crescer e causar rupturas definitivas. O que poderia ter se tornado  amizade, colaboração e união, transforma-se em uma guerra silenciosa de ressentimentos, ciúmes e inveja. 

Quem odeia, muitas vezes não contente em odiar sozinho, gosta de instigar outras pessoas contra o seu desafeto. E as outras pessoas muitas vezes acabam aprendendo a nutrir e expressar esse mesmo ódio. Quando não podem fazê-lo abertamente, elas o fazem nos pequenos gestos; elas o deixam bem claro nas indiretas, nas exclusões, nos olhares de soslaio. E quem passa por isso, sofre. Porque não entende o porquê de ter sido escolhido como alvo em determinado grupo.

De repente, a pessoa odiada finalmente compreende que de nada adianta tentar lutar; de nada adianta tentar ser agradável, cordata, viver caminhando pelos cantos para não provocar olhares reprovadores, deixar de ser quem é a fim de tentar ser o que ela acha que poderia agradar quem a odeia; porque, quem odeia, não está disposto a mudar. Não quer passar a gostar, e jamais vai admitir que sustentou uma opinião errada e injusta durante anos a fio a respeito de alguém. 

E então, essa pessoa simplesmente desiste.

E o que significa desistir? É não se importar mais. Não ligar mais para o que pensam a respeito dela, e caminhar da maneira que quiser, sem se importar com opiniões, fofocas e olhares reprovadores. 
E é exatamente neste momento, que ela passará a ser conhecida como “arrogante.”
“Fulana é arrogante porque não fala com ninguém. Não pede a opinião de ninguém, enfim, não faz o que a gente espera que ela faça.”  E continuam os julgamentos. 

Mas talvez seja bem melhor ser considerado arrogante por quem nos subestima a continuar nos subestimando a nós mesmos. Amor próprio é fundamental. E também é bem melhor estar sozinho e totalmente em paz – sabendo que jamais fez nada para prejudicar ninguém, nunca hostilizou ou segregou alguém devido a uma antipatia sem fundamentos – a continuar sendo saco de pancadas alheio. 

Quem sabe, a minha missão aqui na terra seja compreender e assimilar esta verdade? Se for, acho que estou a caminho.






terça-feira, 20 de março de 2018








Eu rezo a um Pai cujo rosto eu não conheço,
Eu peço a um Filho que eu jamais pari
E faço o sinal da cruz,
Mencionando um Espírito Santo que nunca vi.

Murmuro palavras que me foram ensinadas,
E outras palavras que eu mesma invento.
Eu peço, imploro, tento
Alcançar uma luz que há de cegar-me.

As adagas pontiagudas da fé
Dançam em volta de mim,
Cortam de leve,
Sangrando sentidos
E eu, em suspiros desabridos,
Tento escutar a leve voz
Suave e santa – Doce Algoz!

O cheiro do incenso que santifica,
Purifica a minha dúvida.
De joelhos eu caio; cortam-me os cacos
Da fé sobre a qual estou prostada.









quarta-feira, 14 de março de 2018

Meus Dois Stephens









Existem dois Stephens que conheci através das letras: Stephew King e Stephen Hawking. Para mim, ambos são magos dentro de suas especialidades. O primeiro inventa mundos, e o outro, os descobre. Ambos têm aparência forte; o primeiro tem um olhar que parece o de alguém saído de um manicômio de filme de terror, e o segundo, uma força descomunal aprisionada dentro de um corpo encarquilhado e imóvel.

Ambos chocam, surpreendem, causam espanto e admiração. Ficamos amedrontados ao entrar no mundo de King, mas não conseguimos voltar, uma vez que a porta esteja aberta e tenhamos dado o primeiro passo; e ficamos curiosos e esperançosos (ou desesperançados) ao adentrarmos o mundo de Hawking, e concluímos que também não conseguiremos voltar, mas por razões totalmente diferentes.

Cresci convivendo com eles através dos livros. King ensinou-me que o sobrenatural pode estar nas situações mais corriqueiras do dia; na imagem que passa pelo canto dos olhos, no ruído estranho que geralmente ignoramos, na sombra esquiva em um quarto escuro, na aparente normalidade de uma comunidade de pessoas, e mais ainda, dentro de nós mesmos. Hawking ensinou-me que podemos voar tão alto quanto desejarmos, usando apenas a força do pensamento e o combustível da curiosidade. Esta lição está tatuada em seu próprio nome: “Hawk”, em inglês, significa “falcão.”  E a gente sabe muito bem que  podemos colocar um falcão em um poleiro com uma corrente prendendo suas garras, mas quando o soltarmos, ele voará acima de nossas cabeças e enxergará aquilo que jamais enxergaremos. Tiramos o falcão do céu, mas jamais seremos capazes de tirar o céu do falcão.

E hoje, o Falcão voou. Vejo-o ir ao encontro dos céus com os quais sonhou, em direção aos mundos que ele descobriu, comprovando ou aperfeiçoando as suas teorias. Livre, finalmente livre, sem o peso do corpo que o conteve, durante tantos anos, contra todas as probabilidades médicas. Corpo que jamais foi capaz de conter sua genialidade, impetuosidade e capacidade de ser mágico e ensinar a todos sobre a magia da vida.






terça-feira, 13 de março de 2018

Tenho Pensado...










Eu tenho pensado muito em você,
E descobri que ainda lamento
E choro pelo que era doce.
Eu tenho muitas saudades
De como era, e do que eu pensava
E acreditava que você fosse.

Era bom, andar ao seu lado,
Os pensamentos sempre interligados,
Os passos pisando o chão, seguros,
Aparentemente caminhando
Sempre na mesma direção.

Era boa, a sensação
De que eu sempre teria você
Por perto, de braços abertos,
A me amparar, se eu caísse.

Sinto saudades das nossas andanças,
Da sensação  de segurança,
Das risadas à mesa, aos domingos,
Das tardes amenas de conversas
Do conviver por diversão.

Eu sinto falta das lanchonetes,
Daquelas festas de São João,
De fazer juntos o mercado
As compras no mesmo cartão.

De onde menos se espera o corte,
É bem dali que ele vem mais forte,
E a dor que nasce, dilacera,
A  pele jamais cicatriza...

Fecha-se os olhos, mas a ferida
Por mais que se queira, nunca fecha.
E fica aquela estranha brecha
Ardendo, até o fim da vida.





quinta-feira, 8 de março de 2018

POEM FOR A CAT




I never wanted you to come and stay
But never wished that you would go away.
I was so happy when I heard you meow
When you came into through my bathroom window.

Then we were friends, and not so long ago
I'd always find you sleeping in my bed...
At times I felt you were trespassing, though...
But now you're gone, I feel so very sad!

Where has she gone, where is the little cat
I used to see, who kept me company?
She stood beside when I was weak and ill
And I can feel her silent presence still.

She moved away with her real family
The lonely one now that she's gone is me!
No-one comes in, the bathroom window is bare
I miss that long, suspicious precious stare!




terça-feira, 6 de março de 2018

Coisa Sagrada





Há alguma coisa sagrada no voo dos pássaros,
Na maneira como eles se jogam, sem medos,
Com toda a certeza de que o horizonte está próximo
E o chão está longe.


Às vezes, deixam cair uma pluma leve,
Que vai descendo devagar do mundo dos deuses alados
Oscilando com o vento, procurando onde pousar,
Até que encontra o Chão dos Desencantados.


E eu penso, quando deparo com uma delas
A aterrissar levemente aos meus pés:
Será uma mensagem de esperança contumaz
Ou está ali apenas para lembrar-me
Do que eu nunca, jamais serei capaz?




Delicadeza








Entre a flor e o elefante
Existia um amor platônico,
Daqueles, sempre distantes...

Um gesto, e ele a colheria!
Só um momento de dor
E o perfume que ela tinha
Todo se derramaria!

Mas o elefante passava,
Pisando duro, pisava
Sem ver a flor pequenina...

E a flor com ele sonhava,
E em seus sonhos, se entregava
Ao amor que ele não tinha!

Mas um dia, como sempre
Acontece nas histórias,
O elefante se deteve
Diante daquela flor
Que de triste, já murchava...

Então ele, de repente,
E imprevisivelmente,
No momento do adeus
Por ela se apaixonava...

Mas a flor caiu sem lume
Sobre as patas do elefante, 
Que aspirou com sua tromba
O que restou do perfume...



(poeminha baseado na ilustração)








quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Sumindo








Sumindo
Estamos todos
Sumindo
Na multidão
Partindo
De coração
Partido
Na solidão
Dormindo
A vida , a morte
Vindo.

Sumindo,
Dentro da noite
Ouvindo
O apito infindo
No céu
A lua vindo
O dia
Insinuando
A noite
A que virá
Surgindo
Enquanto nós
Sumimos.

Sumindo
E o pensamento
Imenso
Cheio do que
Não leva
À nossa porta
Aguarda
Pacientemente
A treva
A que nos leva
Arrasta
Inesperada
Mente.







sábado, 24 de fevereiro de 2018

Melancolia – ou Canções do Medo

imagem obtida da minha melancolia




Melancolia – ou Canções do Medo

As pessoas fogem da melancolia de maneira compulsiva. Ninguém quer ficar sozinho. Ninguém quer escutar música clássica. Ninguém quer se lembrar de coisas tristes, pessoas que já se foram, momentos difíceis. Talvez seja por isso que esteja surgindo tanta música barulhenta e infernal nos dias de hoje: medo. As pessoas precisam de barulho para que não tenham que ouvir a si mesmas. E a música barulhenta de hoje é bem diferente da música barulhenta de anos atrás, pois o rock tinha um contexto, uma história, e letras significativas – na sua maioria. Algumas destas letras eram bem melancólicas, como “Love Hurts”, do Nazareth, “Stairway to Heaven”, do Led Zeppelin e “Bohemian Rapsody”, do Queen. Mas as letras de hoje, gritadas a plenos pulmões por pessoas que jamais poderiam ter se tornado cantores, só servem para acompanhar  a mesma batida, que se faz presente em quase noventa por cento das canções. E elas não tem qualquer significado, e seu único objetivo é fazer barulho para matar qualquer possibilidade de silêncio. Eu as chamo de “Canções do Medo.”

Obrigada a tirar férias forçadas devido a uma conjuntivite que se agravou, eu passei uma semana inteirinha sozinha em casa, em dias chuvosos e atipicamente frios de verão. Quase não pude ir lá para fora. Nas poucas vezes em que pude curtir um pouco o meu jardim, o céu estava encoberto e havia chuva intermitente. Nada mais melancólico, e eu adoro.





Pude me sentar na minha cadeira de balanço, que fica na varanda, junto à porta de entrada da casa – local onde geralmente não tenho muito tempo de me sentar. E de lá, enquanto eu escutava chuva e passarinhos e observava meus cães brincando ali perto na grama, o pensamento começou a tornar-se autossuficiente, indo por caminhos que eu geralmente tento bloquear. E eu me lembrei de outras coisas, outras pessoas e outros tempos. Algumas dessas pessoas não estão mais aqui, o que me trouxe melancolia, mas notei que lembrar-me delas foi quase como tê-las aqui em minha casa, me visitando. Foi bom. E o medo da tristeza que me acomete quando eu penso nelas, cedeu espaço à memórias agradáveis, momentos tão felizes dos quais eu quase me esquecera devido ao meu esforço de não pensar mais em coisas tristes. Fatos e pessoas dos quais a gente tem mais saudades, são justamente os melhores, os que realmente valem a pena lembrar. 

À noite, começou a chover forte; escolhi uma playlist de músicas clássicas no aplicativo, acendi um único abajur, fechei as cortinas e deitei-me no sofá da sala. A música estava tocando bem baixinho, e eu podia ouvir os relógios da casa funcionando. Há tanto tempo eu não sentia a casa tão minha! Eu costumo ter o hábito de falar com a minha casa, andar por ela – principalmente bem cedo pela manhã ou no final da tarde – e observar, sentir as energias, mudar coisas de lugar, acender incensos. Faço o que ela me pede. E ontem, ela me pediu para ficar quieta. Obedecê-la foi uma das melhores coisas que me aconteceram neste início de ano. 




Porque tem coisas que a gente evita pensar. Atitudes que a gente ignora, porque não existem respostas para elas. As pessoas se transformam, e de repente, estamos diante de pessoas totalmente estranhas. Mas ontem eu percebi que eu também mudei, e que talvez estas pessoas estejam pensando o mesmo ao meu respeito! Não significa que deixamos de ser amados, ou de amar – mas que entramos em sintonias diferentes, e seguimos por caminhos diferentes que precisam ser seguidos. Nessas horas, é preciso soltar as amarras, deixar o barco ir e o mar nos levar para onde ele quiser. 

Mas as canções do medo que tocamos fazem com que nós evitemos perceber tais sutilezas da vida. E assim, acabamos impondo a nossa presença em lugares que já não fazem mais sentido (e onde talvez nem sejamos mais bem-vindos), seja para nós ou para as pessoas que neles estão. Nós nos tornamos invasores da vida alheia. Ontem, o silêncio da casa e meus olhos fechados – com o auxílio luxuoso da música clássica – me fizeram chegar a conclusões essenciais para a minha vida. Aprendi que cada um acredita naquilo que quer, e interpreta a vida e os acontecimentos segundo a maneira como seus silêncios e ruídos lhes chegam – segundo aquilo em que eles estão prontos a perceber. 




A melancolia desses momentos jamais deveria ser evitada. As palavras que crescemos acreditando terem conotações negativas – como desilusão, solidão, despedida, tristeza e melancolia – são justamente as que mais nos trazem aprendizado. Através da aceitação e vivência daquilo que estas palavras representam, aprendemos que a pessoa mais difícil, aquela sobre quem mais deveríamos  aprender e suportar a convivência, somos nós mesmos. E quando assimilamos estas coisas, descobrimos que estar na própria companhia pode ser a mais agradável das companhias. 






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O Tucano O TUCANO   Domingo de manhã: chuva ritmada e temperatura amena. A casa silenciosa às seis e trinta da manhã. Nada melhor do que me ...