Meu cachorrinho matou um filhote de sabiá polca. Eu estava ouvindo música, concentrada em outra coisa, e quando me dei conta dos gritos dos pais, já era tarde: peguei-o ainda vivo em minhas mãos e coloquei-o de volta no ninho, que fica em uma das árvores em meu jardim. O ninho foi estranhamente construído em um local bem próximo à linha dos olhos. Achei que eu tinha salvado o pássaro, porém, minutos mais tarde, quando fui verificar se ele estava bem, encontrei-o morto. Havia uma perfuração enorme sob a asa que eu não tinha visto.
Acho que aquele tinha sido seu primeiro voo. Infelizmente, também o último.
Meu marido e eu o salvamos muitas vezes, ainda no ninho, de ataques de tucanos, gambás e pica-paus, mas acho que ele estava destinado a não viver. Nós escutávamos os gritos desesperados dos pais e corríamos lá para fora, para espantar os invasores. Confesso que criei um vínculo com os pais; acostumei-me a acordar com seus pios alegres, todos os dias. Eu me sentava no banquinho da varanda e ficava olhando os pais levando comidinhas para ele no ninho. Eles se alimentavam das frutas que eu coloco no comedouro e tomavam banho e bebiam água na minha fonte.
Ao ver o filhotinho morto, achei que os pais, que procuravam por ele gritando desesperados, deveriam saber o que havia acontecido com o bebê deles. E foi aí que eu tive a maior surpresa de todas: passarinhos têm luto.
Coloquei o corpinho em um galho de árvore, e logo a mãe veio com comida no bico para dar a ele, mas ao perceber que estava morto, ela engoliu a comida, demorou-se um pouco rodeando o corpo e voou para um galho de árvore alto junto com o pai. Os dois ficaram ali ainda durante algum tempo. Não mais piavam desesperadamente, mas entoavam um canto que eu tenho certeza que era de luto. Nunca tinha escutado um sabiá cantar daquela maneira, tão suave e sentida.
O casal ainda pousou no meu muro coberto de hera; os dois ficaram lá, me olhando. Pareciam querer se despedir de mim. Eu pedi desculpas a eles em voz alta (se algum vizinho me escutou, deve estar pensando que eu enlouqueci) por não ter conseguido salvar o filhotinho dessa vez. Assim que eu terminei o meu discurso, os dois voaram para longe, e um silêncio de morte baixou no meu jardim.
Bem, não se pode vencer sempre... sei que meu cachorro não fez de maldade, ele só queria brincar com o pássaro, tanto que quando gritei “Mootley, não!” ele imediatamente largou o passarinho. Porém, acabou por matá-lo. Se eu tivesse chegado pelo menos um minuto antes, talvez tivesse conseguido salvá-lo.
O episódio me fez pensar mais uma vez nos milhares de passarinhos que são mortos todos os dias por incêndios, caçadores ilegais e pessoas egoístas que os contrabandeiam. Penso também nos milhares que, neste exato momento, estão presos em gaiolas minúsculas, pulando de um poleiro ao outro, porque é a única coisa que podem fazer, apenas para satisfazer o egoísmo de alguns seres humanos e servir de fonte de renda para outros. Alguns ficam supostamente “soltos,” mas com correntes nas patinhas, como acontece com os criminosos.
Só pude devolver o corpo do pássaro à natureza, desejando boa sorte aos pais da próxima vez, e desejando também boa sorte aos demais pássaros e animais selvagens ou silvestres, vítimas da maldade humana.
Mas a vida continua sempre. Enquanto eu termino esta crônica, escuto os pássaros voltando ao meu jardim. No próximo ano, os sabiás farão outro ninho e terão outros filhotes, pois é assim que tem que ser. Penso que também nós devemos sempre olhar para aquilo e aqueles que perdemos com ternura, nos despedirmos e continuarmos vivendo, cantando sempre que for possível sobre as coisas vivas e as coisas mortas das nossas vidas.
Que triste e observar a natureza e os comportamentos nos engrandece...Pena pelo sabiá,mas a vida segue...beijos, chica
ResponderExcluirAww, such a touching story, dearest Ana...that brought a year to my eye😢
ResponderExcluirAnd the tender way you dealt with that tiny bird is wonderful. You have such a kind heart.😊
We had a pair of bullfinches nesting in our garden last summer. It was such a pleasure to watch them build their nest and rear their chick. Then, in a split second...a hawk descended and snatched the chick and then dropped it. When we went to pick it up, we discovered that it was dead, probably from shock. We placed the little body back in the nest. Those poor parents! They stayed around the nest for several more days, singing mournfully, and searching for their baby. It was so, so sad.
Yes, I agree, we aren't by any means the only species who mourn our dead. That experience was proof enough for me.
Have a good weekend!😊😊
Hugs xxx
Triste mas é da natureza isso ...
ResponderExcluirQue sensibilidade a sua com que contou esta história!
ResponderExcluirMas os passarinhos hão-de voltar para seus encantamento.
Uma boa semana com muita saúde.
Um beijo.
Que triste! Eu também já vi uma mamãe passarinho tentando dar comida ao filhote morto, ficou muitos minutos ali em vigília. E o cachorrinho não teve culpa também, coitado.
ResponderExcluirOlá Ana Bailune, quanto tempo...olha, que belo achado. O universo dos pássaros é lindo! beijos
ResponderExcluirAmei sua crônica, Ana. Outros pássaros, certamente, estarão por aí. Gostei da forma como descreveu o luto dos pais. Até podemos senti-lo. Entre nós, humanos, tudo caminha diferente. Não somos educados para conviver om perdas da natureza. Bjs.
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