witch lady

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quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O DOM DO ESQUECIMENTO




O tempo às vezes traz
O dom do esquecimento,
Um vento benfazejo
Que apaga os maus momentos...

E ao cair dos panos,
No avançar dos anos,
Quem sabe, não lembrar
Não passe de um presente?

As águas das enchentes
Carregam muitas coisas
Que estão presas às margens
Pra bem longe da gente...

Entrar bem devagar
Na densa mata escura,
Sem dores ou memórias,
A mente e a pele nuas,

Deixar pelo caminho
Relógios e palavras,
Levar consigo apenas
A bênção da loucura...




Quem Não Queria Uma Casa Assim?





Hoje posto aqui o mesmo texto que postei em um de meus outros blogs, o Passagem. É um poema de Manoel de Barros. Uma homenagem.

E quem não queria uma casa assim, como a que ele descreve?



Senhor, ajudai-nos a construir a nossa casa
Com janelas de aurora e árvores no quintal -
Árvores que na primavera fiquem cobertas de flores
E ao crepúsculo fiquem cinzentas 
como a roupa dos pescadores.

O que desejo é apenas uma casa. 
Em verdade, Não é necessário que seja azul, 
nem que tenha cortinas de rendas.
Em verdade, nem é necessário que tenha cortinas.
Quero apenas uma casa em uma rua sem nome.

Sem nome, porém honrada, Senhor. 
Só não dispenso a árvore,
Porque é a mais bela coisa que 
nos destes e a menos amarga.
Quero de minha janela sentir 
os ventos pelos caminhos, e ver o sol 

Dourando os cabelos negros 
e os olhos de minha amada.

Também a minha amada não dispenso, meu Senhor.
Em verdade ele é a parte mais importante deste poema.
Em verdade vos digo, e bastante constrangido, 
Que sem ela a casa também eu não queria, 
e voltava pra pensão.

Ao menos, na pensão, eu tenho meus amigos 
E a dona é sempre uma senhora 
do interior que tem uma filha alegre.
Eu adoro menina alegre, 
e daí podeis muito bem deduzir 

Que para elas eu corro nas minhas horas de aflição.

Nas minhas solidões de amor e 
nas minhas solidões do pecado
Sempre fujo para elas, quando não fujo delas, de noite,
E vou procurar prostitutas. Oh, Senhor vós bem sabeis
Como amarga a vida de um 
homem o carinho das prostitutas!

Vós sabeis como tudo amarga 
naquelas vestes amassadas
Por tantas mãos truculentas ou tímidas ou cabeludas
Vós bem sabeis tudo isso, e portanto permiti
Que eu continue sonhando com a minha casinha azul.

Permiti que eu sonhe com 
a minha amada também, porque: 
- De que me vale ter casa sem ter 
mulher amada dentro? 
Permiti que eu sonhe com uma que ame 
andar sobre os montes descalça
E quando me vier beijar faça-o 
como se vê nos cinemas...

O ideal seria uma que amasse fazer comparações
de nuvens com vestidos, e peixes com avião; 
Que gostasse de passarinho pequeno, 
gostasse de escorregar no corrimão da escada 
E na sombra das tardes viesse pousar 
Como a brisa nas varandas abertas...

O ideal seria uma menina boba: 
que gostasse de ver folha cair de tarde...
Que só pensasse coisas leves que nem existem na terra,
E ficasse assustada quando ao cair da noite
Um homem lhe dissesse palavras misteriosas ...
O ideal seria uma criança sem dono, 
que aparecesse como nuvem,
Que não tivesse destino nem nome - 
senão que um sorriso triste 
E que nesse sorriso estivessem encerrados
Toda a timidez e todo o espanto 
das crianças que não têm rumo...


Manoel de Barros





Manoel de Barros






Senhor, ajudai-nos a construir a nossa casa
Com janelas de aurora e árvores no quintal -
Árvores que na primavera fiquem cobertas de flores
E ao crepúsculo fiquem cinzentas 
como a roupa dos pescadores.

O que desejo é apenas uma casa. 
Em verdade, Não é necessário que seja azul, 
nem que tenha cortinas de rendas.
Em verdade, nem é necessário que tenha cortinas.
Quero apenas uma casa em uma rua sem nome.

Sem nome, porém honrada, Senhor. 
Só não dispenso a árvore,
Porque é a mais bela coisa que 
nos destes e a menos amarga.
Quero de minha janela sentir 
os ventos pelos caminhos, e ver o sol 

Dourando os cabelos negros 
e os olhos de minha amada.

Também a minha amada não dispenso, meu Senhor.
Em verdade ele é a parte mais importante deste poema.
Em verdade vos digo, e bastante constrangido, 
Que sem ela a casa também eu não queria, 
e voltava pra pensão.

Ao menos, na pensão, eu tenho meus amigos 
E a dona é sempre uma senhora 
do interior que tem uma filha alegre.
Eu adoro menina alegre, 
e daí podeis muito bem deduzir 

Que para elas eu corro nas minhas horas de aflição.

Nas minhas solidões de amor e 
nas minhas solidões do pecado
Sempre fujo para elas, quando não fujo delas, de noite,
E vou procurar prostitutas. Oh, Senhor vós bem sabeis
Como amarga a vida de um 
homem o carinho das prostitutas!

Vós sabeis como tudo amarga 
naquelas vestes amassadas
Por tantas mãos truculentas ou tímidas ou cabeludas
Vós bem sabeis tudo isso, e portanto permiti
Que eu continue sonhando com a minha casinha azul.

Permiti que eu sonhe com 
a minha amada também, porque: 
- De que me vale ter casa sem ter 
mulher amada dentro? 
Permiti que eu sonhe com uma que ame 
andar sobre os montes descalça
E quando me vier beijar faça-o 
como se vê nos cinemas...

O ideal seria uma que amasse fazer comparações
de nuvens com vestidos, e peixes com avião; 
Que gostasse de passarinho pequeno, 
gostasse de escorregar no corrimão da escada 
E na sombra das tardes viesse pousar 
Como a brisa nas varandas abertas...

O ideal seria uma menina boba: 
que gostasse de ver folha cair de tarde...
Que só pensasse coisas leves que nem existem na terra,
E ficasse assustada quando ao cair da noite
Um homem lhe dissesse palavras misteriosas ...
O ideal seria uma criança sem dono, 
que aparecesse como nuvem,
Que não tivesse destino nem nome - 
senão que um sorriso triste 
E que nesse sorriso estivessem encerrados
Toda a timidez e todo o espanto 
das crianças que não têm rumo...


Manoel de Barros




HORTÊNSIAS TEM VÁRIAS CORES














terça-feira, 11 de novembro de 2014

Aqui em casa Tem...




Aqui em casa tem...

- Colcha de croché feita pela avó de alguém há muitos e muitos anos.

-Marcas de patinhas de cachorro no piso da cozinha e da área de serviço.

-Jogos de copos de cristal que foram presente de casamento e que só são usados em ocasiões especiais.

-Uma coleção de xícaras coloridas sobre o armário da cozinha.

-Uma coleção de vinis e outra de CDs, muita música de todos os estilos para todos os gostos.

-Muitos e muitos livros, lidos e relidos, cheios de coisas sublinhadas e comentários à lápis. Estes são os que eu jamais doarei.

-Fotos de papel, lembranças de viagens e acontecimentos felizes.

-Buracos e plantas arrancadas no jardim - afinal, quem tem cachorro sabe que terá que passar por isso...

-Sininhos de vento espalhados pela casa toda, do lado de dentro e do lado de fora, nas árvores, portais e varandas.

-Muitos sprays aromáticos diferentes.

-Muitas velas decorativas, daquelas que a gente não tem coragem de acender.

-Cortinas ralinhas e transparentes em todas as janelas.

-Uma rede na varanda.

-Uma geladeira cheia de ímãs de gente que viajou e lembrou-se de mim - especialmente, alunos e ex-alunos. Eles são de todas as partes do mundo, como por exemplo: Bélgica, França, Russia, Estados Unidos (vários estados), Inglaterra, Itália, Argentina, Chile, Grécia, Portugal, Espanha...



-Bibelôs cafonas que eu adoro.

-Vasos de orquídeas sobre o aparador da lareira e flores sobre o peitoril da janela e a mesa da varanda.

-Poeira em alguns cantinhos e nas prateleiras mais altas, daquela que nem sempre dá tempo de tirar.

-Edredon velhinho e macio sobre a cama.

-Uma bagunça organizada no armário de roupas e sapatos.

E aqui em casa sempre tem roupa para passar, não importa o quanto eu tente colocar tudo em dia... mas acho que são essas coisas que fazem com que uma casa seja um lar.



segunda-feira, 10 de novembro de 2014

PARTILHANDO PALAVRAS




Acredito que o que é bonito e verdadeiro, deve ser partilhado, para que alcance o maior número de pessoas possível. Vivemos em tempos nos quais coisas horríveis são sempre partilhadas - maledicências, fofocas, invencionices, guerras, corrupção. Mas olhem só que lindo isso - Rubem Alves comentando sobre a parábola do filho pródigo:

"Jesus pinta um rosto de Deus que a sabedoria humana não pode entender. Ele não faz contabilidade. Não soma nem virtudes nem pecados. Assim é o amor. Não tem "porquês". Sem razões. Ama porque ama. Não faz contabilidade do mal nem do  bem. Com um Deus assim o universo fica mais manso. E os medos se vão. Nome certo para a parábola:

"Um pai que não sabe somar." Ou: "Um pai que não tem memória."

Se pudéssemos compreender Deus e a vida desta forma, saberíamos que ela, à sua maneira, é sempre justa, pois não faz contabilidade. Não haveria sequer a necessidade de fazer-se afirmações como "Aqui se faz, aqui se paga", ou "Recebemos de volta aquilo que mandamos," pois  se fosse verdade, os justos não sofreriam. Daí alguém pode afirmar: "Ah, mas os sofrimentos dos justos vem de outras encarnações." E do que eles valem, se aquele que está sofrendo não se lembra deles? E o próprio Jesus, exemplo da verdade, da justiça e da bondade, não sofreu horrores pendurado a uma cruz construída com a ajuda  daqueles em quem Ele mais confiava? Qual a culpa que Ele trouxera de outras encarnações?

Gosto de ler Rubem Alves porque ele sempre desperta o que há de melhor em mim, e me faz compreender o que há de pior sem culpas ou medos. Ele me mostra que o que tenho de melhor, é exatamente aquilo que está sob as camadas e camadas de tintas com as quais me pintaram, e que é a minha cor original. Entendo que Deus é bem diferente dessa criatura de mil faces que aparecem de maneiras diferentes para cada religião. Diz Rubem Alves, em um trecho de sua crônica Sem Contabilidade:": 

"...Não farás para ti imagem", tendo sido proibido até com pena de morte, que o seu próprio nome fosse pronunciado. Mas os homens desobedeceram. Desandaram a pintar o Grande Mistério como quem pinta casa. E a cada nova demão de tinta, mais o mistério se parecia com as caras daqueles que  o pintavam. Até que o mistério desapareceu, sumiu, foi esquecido, enterrado sob as montanhas de palavras que os homens empilharam sobre o seu vazio. Cada um pintou Deus do seu jeito."

E ficamos por aí, sempre pintando imagens com tintas falsas, construindo esculturas com imagens falsas e concebendo o Inconcebível. Colocamos palavras na boca de Deus como se Ele mesmo as tivesse dito. E apontamos para o outro que sofre, orgulhosamente afirmando que "O que vai, volta", como se tivéssemos sido eleitos juízes de Deus. Vejo, em algumas pessoas, um brilho de mórbido prazer no olhar (disfarçado de piedade), quando contabilizam as quedas alheias.

Se algum dia eu tivesse uma religião, seria aquela que admitiria não ter todas as respostas e quase nenhuma certeza. Uma que não tivesse dogmas ou receitas infalíveis, e que diante do inexplicável, baixaria a cabeça e diria: "Não sei responder." Eu teria uma religião que não determinasse o que eu posso vestir, que tipo de música eu posso ouvir, ou que comida eu posso consumir; uma que não separasse as pessoas entre "bons" e "maus", "merecedores" e "não-merecedores", "santos" e "pecadores."

Acho que eu jamais terei uma religião.

Minha religião são pessoas que tem algo a dizer, como Rubem Alves. É uma tarde de chuva após um dia calorento, uma linda manhã toda dourada de sol, flores e insetos no jardim, a voz do vento quando traz o perfume da vida. A minha religião são os livros, as palavras, os poemas, as músicas, as cores, as pequenas felicidades, os pequenos prazeres, a comida na mesa todos os dias, a água que sai da torneira limpa e fresca sempre que eu preciso, o silêncio, o silêncio, o silêncio.



quinta-feira, 6 de novembro de 2014

O Chá




-Eu penso em pássaros,
Em voos, em asas,
Em sonhos, em nuvens,
E casas no céu.

-Eu penso em esquilos,
Em amoras, mirtilos,
No açúcar das xícaras,
Nos doces croissants.

-Eu penso em sapos,
Em grilos, espinhos,
Desfaço os ninhos,
Esmago os doces,
Afio as foices...

-Eu penso em peixes,
Em mares e mágoas,
Nas águas salgadas
Afogo meus medos.

-Eu penso em dores,
Em lágrimas, cortes,
No sul sem norte,
Eu penso na morte...

Tomemos o chá
Da nossa união,
Confraternizemos
Nossas diferenças,
Afrouxemos o peso
Dessas prensas
Tão ajustadas,
Que esmigalham
Nossa existência.

Para que possamos
Conviver,
Co-existir
E não matar,
E não morrer.


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EU SÓ TENHO UMA FLOR

  Eu Só Tenho Uma Flor   Neste exato momento, Eu só tenho uma flor. Nada existe no mundo que seja meu. Nada é urgente. Não há ra...