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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Cartas de Meu Avô - Manuel Bandeira




Cartas de Meu Avô

A tarde cai, por demais
Erma, úmida e silente…
A chuva, em gotas glaciais,
Chora monotonamente.

E enquanto anoitece, vou
Lendo, sossegado e só,
As cartas que meu avô
Escrevia a minha avó.

Enternecido sorrio
Do fervor desses carinhos:
É que os conheci velhinhos,
Quando o fogo era já frio.

Cartas de antes do noivado…
Cartas de amor que começa,
Inquieto, maravilhado,
E sem saber o que peça.

Temendo a cada momento
Ofendê-la, desgostá-la,
Quer ler em seu pensamento
E balbucia, não fala…

A mão pálida tremia
Contando o seu grande bem.
Mas, como o dele, batia
Dela o coração também.



domingo, 8 de junho de 2014

Saudades de um Manacá-da-Serra












Minha singela homenagem ao meu Manacá, que tombou na última tempestade de verão...





Nada é Para Sempre




Às vezes,
As coisas permanecem,
Mas os olhares mudam.

Tu passas 
(E nem percebes)
Pelas mesmas praças,
Ruas e calçadas...

A mesma cor desbotada
Nas paredes da tua casa
Que tornou-se tão pequena
Para tuas cenas.

E nada mudou,
Nada!
Apenas o teu olhar
Que se demora e se perde
Para além dessas vidraças...

No quintal, a mesma árvore
Faz sombra sobre o telhado,
O tempo traça caminhos
Sob a pele que já pende
Sob o olhar amargurado,
Mas é dentro que se encontra
Aquilo que está passando,
Aquele que foi mudado...

É que às vezes, 
As coisas permanecem,
Mas os olhares mudam,
E se perdem
Nas ilusões do mundo.




Orquídeas

Uma das orquídeas que comprei e depois que as flores murcharam,  pedi ao jardineiro que colocasse no tronco do ipê

Moro bem próximo a um orquidário, e por isso, sempre tenho orquídeas em casa. Gosto de enfeitar o parapeito da janela da sala com elas, e quando as flores murcham, costumo pedir ao jardineiro que as coloque em árvores pelo jardim. Elas sempre rebrotam.

Orquidário Binot

As orquídeas são flores delicadas, e precisam de cuidados especiais, como por exemplo: não deixá-las expostas ao sol forte e direto, não aguar demais (no verão duas regas por semana serão suficientes, e no inverno, uma), deixá-las sempre sob luz abundante e tomar cuidado com as praguinhas. Mas felizmente, a floração das orquídeas pode durar meses! Tive uma que ficou florida durante quase quatro meses.


Outra das minhas...


As orquídeas enfeitam e encantam. Algumas espécies são perfumadas - tive uma com cheirinho de chocolate! Flores delicadas, demoram a florir, mas vale a pena esperar.


Pequena ajuda à natureza: orquídeas azuis!

Passear pelo orquidário, entre as flores... fotografá-las, apreciá-las, sentir seu perfume e conversar com as pessoas que trabalham por lá, é um exercício de higiene mental.


Nada como a natureza para nos limpar por dentro, deixando-nos melhores.


Cada espécie tem suas próprias características, manifestadas em cores, perfumes e formas que merecem apreciação calma e cuidadosa...


Nenhuma orquídea é igual às outras; todas são únicas.


Às vezes, parecem que tem personalidade... esta aí em baixo parece uma menina sentada em uma flor.


Há espécies muito grandes e altas, podendo chegar a mais de um metro de altura...  como esta:



E há espécies minúsculas, apenas para os olhos sensíveis que enxergam a beleza das pequenas coisas...


Existem espécies muito caras, como esta, que fica pendurada no ar, as raízes expostas:


Há também as mais 'humildes' e mais acessíveis:


Mas seja qual for a sua orquídea preferida, ela certamente trará beleza e espiritualidade para sua casa.


Eu adoro todas.


Um verdadeiro descanso para os olhos e para a alma.



E quando não se pode comprá-las, basta fotografá-las e apreciá-las enquanto caminhamos por entre elas. Não deixa de ser uma forma de trazermos sua energia para os nossos lares.


Para mim, não existe presente mais lindo!


































quinta-feira, 5 de junho de 2014

SUTILEZAS...














Certezas




Só sei que nada deu certo...
Meu desejo, minha voz,
Foram colhidos pela bruma.

Tudo perdeu-se na brancura,
Germinou dentro da umidade
E de manhã bem cedo,
Brotou em gotas sobre as flores,
Gotas que o sol apagou.

Te estendi as mãos vazias,
E vazias permaneceram.
Te entreguei meu coração,
Que congelou na madrugada...

O dia hoje está desfeito,
O sonho acorda, rarefeito,
Só sei que nada deu certo,
Só sei que não tem mais jeito...





quarta-feira, 4 de junho de 2014

Passeio ao Farol





Trechos do livro Passeio ao Farol, de Virginia Woolf

-"Nunca alguém pareceu tão triste.Amarga e escura,a meio caminho nas trevas,sob o feixe de luz que fugia do sol para encerrar-se nas profundezas,talvez uma lágrima se tenha formado;e uma lágrima caiu;as águas agitaram-se de um lado para o outro e receberam-na,depois acalmaram-se.Nunca alguém pareceu tão triste."(...)Sua simplicidade penetrava no que as pessoas hábeis falsificavam."


"...Era preciso achar um meio de escapar a tudo aquilo. Devia haver uma forma mais simples, menos complicada, suspirou ela. Quando se olhou no espelho, viu os cabelos grisalhos, a face abatida, aos cinqüenta anos, e pensou: poderia ter conduzido melhor as coisas - seu marido, o dinheiro, os livros dele. Mas nunca se arrependeria de suas decisões, nunca fugiria das dificuldades ou se eximiria de suas obrigações. Irradiava dignidade nesse momento, e só com um rápido alçar de olhos do prato diante de si, após o silêncio que se seguiu às suas palavras sobre Charles Tansley, é que as filhas - Prue, Nancy e Rose - ousaram deleitar-se com a ideia do que imaginavam ser uma vida diferente da que tinham: talvez mais emocionante, possivelmente em Paris, sem ter de se precaver contra este ou aquele homem. Havia no pensamento de todas elas uma indizível curiosidade em relação a coisas tão diversas como cavalheirismo, o Banco da Inglaterra e o Império das índias, dedos repletos de anéis e rendas. Havia nisso, para todas elas, um pouco da essência da beleza, que enchia seus jovens corações de anseios pela masculinidade, e as fazia, enquanto se sentavam à mesa sob os olhos da mãe, respeitar a extrema severidade e cortesia com que as advertira sobre o desprezível ateu que as tinha perseguido na Ilha de Skye, ou - falando mais precisamente - fora convidado para ficar com elas. Tal advertência fora feita com a mesma dignidade com que uma rainha tiraria da lama o pé imundo de um mendigo para lavá-lo."


"Então com a casa vazia e as portas trancadas e as tapeçarias enroladas, estas brisas sem rumos, postos avançados de grandes exércitos, urgiam, roçavam em tábuas desnudas, roídas e ventiladas, nada encontravam em quartos ou salas que completamente resistiam a elas [as brisas] mas apenas cortinas que vibravam, madeira que rachava, as pernas desnudas das mesas, panelas e porcelanas já forradas, sem cor, rachadas. Que as pessoas tinham abandonado – um par de sapatos, um chapéu de caça, algumas saias desbotadas e casacos nos armários – esses sozinhos mantinham a forma humana e no vazio indicavam como certa vez eles foram preenchidos e animados; como certa vez mãos foram ocupadas com colchetes e botões; como certa vez o espelho tinha refletido uma face; tinha mantido um mundo esvaziado no qual uma figura voltava, uma mão acenava, a porta abria, através da qual entravam crianças correndo e tropeçando; e a saírem de novo. Agora, dia após dia, a luz voltava, tal uma flor refletida na água, sua aguda imagem na parede oposta. Apenas as sombras das árvores, florescendo no vento, prestavam obediência à parede, e por um momento escureciam a piscina na qual a luz se refletia; ou aves, voando, faziam uma suave mancha oscilar lentamente através do chão do quarto.


Parecia que nada poderia romper esta imagem, corromper esta inocência, ou perturbar o oscilante manto do silêncio no qual, semana após semana, no cômodo vazio, ondulavam o piar cadente das aves, o apitar de navios, o zumbir e o zunir dos campos, um latido de cão, um grito de homem, e envolvia-os ao redor a casa em silêncio. Uma vez apenas uma tábua se soltava no terraço; uma vez, no meio da noite com um estrondo, com um êxtase, como se após séculos de consenso, uma rocha se desprendesse da montanha e ressoasse irrompendo no vale, numa prega do xale a soltar-se e oscilar pra lá e pra cá. Então novamente a paz desceu; e a sombra ondulou; a luz se inclinou a sua própria imagem em adoração na parede do quarto; e a Sra. McNab, rompendo o véu de silêncio com as mãos que seguravam no balde, rangendo com botas que tinham esmagado o cascalho, veio direto para abrir todas as janelas, e tirar a poeira dos quartos."


"Mas, o que é uma noite afinal? Um curto intervalo de tempo, principalmente 
quando a escuridão se desvanece tão cedo, e tão rápido, um galo canta, um 
pássaro o chilreia, ou o verde demasiado se aviva no seio da onda, como 
uma folha na primavera. Mas uma noite se sucede à outra. O inverno 
encerra em grande quantidade, e as distribui imparcialmente equanimente, 
com seus dedos infatigáveis. Elas se prolongam; elas escurecem. Algumas 
guardam nas alturas límpidos planetas – discos de claridade. 
(...) As noites agora estão cheias de vento e de destruição; as árvores 
precipitam-se e se curvam e suas folhas voam desordenadamente até o 
gramado ficar eivado delas: e elas se amontoam nos bueiro, entopem as 
calhas e aderem a lugares úmidos. Também o mar fica revolto e se quebra, 
e, fosse alguém, imerso no próprio sono, imaginar que poderia encontrar 
uma resposta para suas dúvidas, ou alguém que compartilhassem de sua 
solidão, e, afastando as cobertas descesse para andar na areia – nenhuma 
imagem com aparência servil e divina presteza viria em seu apoio para dar 
um sentido à noite e fazer o mundo refletir a amplitude da alma. Desvanece 
a mão na sua mão; a voz branda em seus ouvidos. Poderia parecer quase 
inútil perguntar à noite, em meio a tal confusa, o quê? e por quê? e para 
onde? – perguntas que lavam a pessoa adormecida a deixar o leito e buscar 
uma resposta."







A escritora Virginia Woolf evoca desde logo a essência da tragédia. Sentindo-se incapaz de controlar a vida, preferiu a morte, afogando-se num rio com os bolsos repletos de pedras. E no entanto, aparentemente, ela desfrutava das condições que considerava essenciais para uma mulher se afirmar como escritora, advogadas no seu ensaio “Um Quarto que seja Seu” – dispor de espaço, físico e psicológico e de dinheiro suficiente para se bastar a si própria. Inserindo-se na impressionante cadeia de mulheres inglesas, nascidas a partir de 1800, que produziram literatura, a obra desta escritora é sempre classificada como sendo das mais inovadoras e estimulantes, quer entre as mulheres autoras, quer entre o conjunto dos criadores de ambos os sexos. Reconhecida em vida, apoiada pelo seu marido, igualmente escritor, Leonard Woolf, Virginia produziu nove romances, duas biografias, sete volumes de ensaios, vinte e seis cadernos de diários e um sem número de cartas. Nasceu numa família que estimulou os seus talentos mas teria sido objecto, na infância, de abuso sexual por parte dos seus meio-irmãos mais velhos. Estas circunstâncias, aliadas a lutos familiares (a mãe morreu quando ela tinha 13 anos) e aos horrores de duas guerras mundiais, têm servido aos seus numerosos biógrafos e estudiosos para explicar as muitas depressões de que sofreu e as tentativas de suicídio que realizou até ao encontro definitivo com a morte. Os violentos tratamentos médicos a que foi submetida num hospício para “mulheres loucas”, que passavam por absoluto isolamento, proibição de qualquer atividade, incluindo a leitura e a escrita, com o conluio bem intencionado de seu marido e irmã, também teriam tido efeitos nefastos. Seu marido decidiu no início do casamento, aparentemente harmonioso, que ela não tinha resistência para ser mãe, o que Virginia Woolf sentiu como uma fragilização da sua identidade. Neste quadro se situam as suas reflexões sobre a condição feminina publicadas em 1929, onde nos conduz eruditamente de ideia em ideia, com lógica, com aparente leveza, com ironia. Inventa uma irmã para Shakespeare, a qual nunca poderia Ter sido escritora pelo mero facto de ser mulher. Verbaliza com 50 anos de antecedência muitas das questões retomadas no final do século XX e até ao presente. 


Tristeza




A luz não me ilumina... escuridão!
O rosto inexpressivo e amargurado,
O olhar resvala aos poucos, sem cuidado,
Não olha mais a vida; cai ao chão...

Um louco, intimidado coração,
A voz quase sem voz - peito calado,
Colado à vida, o peso de um 'não'
Tal qual uma corrente que eu arrasto!...

Mas tudo nessa vida tem um fim,
E após o fim, um novo recomeço,
Ao que se perde ou ganha, há sempre um preço...

Espero que haja cura, que haja um bálsamo,
E um mais reto caminho, sem percalços,
Por onde siga o que restou de mim.




terça-feira, 3 de junho de 2014

LEVEZA NO VIVER





Às vezes, o dia pesa. Há noites mal-dormidas, coisas que não dão certo, resfriados que demoram a curar, pessoas intransigentes e arrogantes pelo caminho. Às vezes, dá vontade de trancar a porta da casa e deixar o mundo lá fora. 

E é justamente o que eu faço nesses momentos: tranco a porta e deixo o mundo lá fora, até que eu me sinta melhor. E enquanto eu não estiver melhor, fico aqui, protegida, ao invés de sair por aí aborrecendo todo mundo. Mas assim como estes maus momentos nos chegam, da mesma forma eles vão embora, e na maioria das vezes, sem que precisemos fazer nada... basta que tenhamos paciência. E enquanto isso, eu fico aqui em casa, quietinha.

Afinal, casa também é para proteger os outros dos nossos maus dias.



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