witch lady

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domingo, 19 de fevereiro de 2017

VARRER





Era bem cedinho de manhã, e o dia mal tinha clareado. Eu era bem pequenina, e acordava com o ruído da vassoura batendo no chão de terra endurecida do nosso quintal. A luz que entrava pela veneziana trazia consigo sombras que se movimentavam no teto de madeira do quarto: era meu pai varrendo o chão. Os cachorros latiam para alguns cavalos que passavam na rua, e eu ficava ali na cama, escutando tudo aquilo em silêncio.

Mais tarde, eu ouvia a porta da cozinha se abrindo, e ruídos de papel sendo amassado: era meu pai que chegava com o pão e algumas comprinhas. Então, ele ia para o quarto e sentava-se na cama(eu escutava os sons das molas do colchão estalando) e começava a contar à minha mãe as novidades que ouvira na rua. Conversavam tão baixinho para não nos acordar, que eu não conseguia escutar o que diziam, apenas suas vozes. 

Depois, minha mãe se levantava, e o cheiro do café sendo coado no coador de pano invadia a casa. 

Quando varro meu próprio quintal, de manhã bem cedinho, eu me lembro daqueles dias. Fico pensando se meu pai e minha mãe me olham de algum lugar, ou se ainda vivem e respiram somente na minha lembrança. Talvez a substância criada pelas nossas lembranças seja consistente o suficiente para manter as pessoas vivas, enquanto vivermos, e depois disso, quando ninguém mais se lembrar delas, elas morram. 

Quem sabe, enquanto a minha vassoura toca o chão, levantando poeira, os meus pais, em algum lugar, abram os olhos novamente?





Machado de Assis






Pensamentos de Machado de Assis




"Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria."



"Não levante a espada sobre a cabeça de quem te pediu perdão."



"O dinheiro não traz felicidade — para quem não sabe o que fazer com ele."


"Está morto: podemos elogiá-lo à vontade."


"Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito."


"Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho. Há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!"


"Há amigos de oito dias e indiferentes de oito anos."


"A ocasião faz o furto; o ladrão nasce feito."


"Uma coisa é citar versos, outra é crer neles."


"Há coisas que melhor se dizem calando."



Eloquência









A chuva
Faz crescer a erva entre os caminhos
E constrói redondas poças
Que vão ficando cada vez maiores
E cada vez mais intransponíveis.

O vento se cansa
De transportar palavras fracas
Entre diferentes pares de ouvidos,
E as mensagens morrem,
Sem deixar qualquer eco.

Mas as sementes caídas
Displicentemente, das mãos distraídas,
São fertilizadas pela mesma chuva
Que faz crescer as ervas daninhas,
E o silêncio que dorme no vento
Torna-se bem mais eloquente
Do que qualquer palavra.





quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Mais um Fim do Mundo







Segundo o astrônomo russo Dyomin Damir Zakharovich, existe um asteróide com mais de um quilômetro de diâmetro vindo em nossa direção ainda hoje. O choque há de causar um tsunami gigantesco que acabará com nossos dias neste planeta. O astrônomo alega que a NASA está ciente deste fato, mas que se recusa a admiti-lo. 

Fico me perguntando o porquê de tantas anunciações sobre o fim do mundo. Quando eu era criança, diziam que o fim do mundo seria no ano 2000, e há algum tempo, em 2012. Muitos ganharam dinheiro vendendo pedaços de terra supostamente seguros, bunkers inquebrantáveis e muitos livros sobre como sobreviver ao fim do mundo - o de 2012. Mas nada aconteceu.

Lembro-me que, naquela época, tive um sonho estranho: ao levar um de meus alunos ao portão, o dia começou a escurecer rapidamente, e chegando lá, ao abrir o portão para deixar meu aluno sair, deparei com um outro aluno esperando para entrar. Eu não o conhecia, mas mesmo assim, senti que não era perigoso. Ele era muito negro, confesso que nunca vi uma pessoa tão completamente negra em toda a minha vida. Tentando comentar sobre a escuridão, eu disse: "Nossa! Parece que temos um eclipse!" E ele, muito sério, me respondeu: "Não é eclipse, é o fim do mundo." Acordei muito assustada.

Fato é que, após aquele sonho - e outros que não convém mencionar aqui - minha mãe adoeceu e morreu, e na mesma época, em outro hospital, tínhamos meu cunhado também na UTI devido a uma cirurgia de coração, e ele ficou por lá, entrando e saindo da UTI durante seis meses. Meu marido também ficou muito doente na época, e uma de minhas irmãs quebrou o pé. Foi um período muito difícil para todos nós. Quase como o fim do mundo. No meu site no Recanto das Letras, sofri vários ataques vindos de duas pessoas que me ameaçaram de todas as formas - uma delas, faleceu logo depois -, também na época em que estava vivenciando tudo aquilo na minha família.

Mas o mundo não acabou, e nós sobrevivemos. 

Acho que no fundo, as teorias de fim de mundo existem porque as pessoas estão desencantadas. Elas gostariam que alguma coisa grande acontecesse e mudasse o rumo das coisas, mesmo que isso significasse a extinção de outros milhões de pessoas e também de quase todas as espécies animais. Se existisse uma pequena chance de que elas sobrevivessem, e que tudo recomeçasse de uma maneira diferente, para elas, valeria a pena. 

Mas elas não enxergam que para que isso aconteça, o mundo não precisa acabar; basta que olhemos em volta, sem os óculos cor-de-rosa, e vejamos o quê e quem está na nossa vida, se vale a pena deixá-los ficar, e também examinar comportamentos pessoais que estejam nos prendendo ou nos mortificando a alma, e fazermos tudo o que pudermos para nos libertar deles. 

O ano de 2012 marcou-me como um dos piores de minha vida. Mas também foi o ano em que eu realmente senti que alguma coisa muito grande, uma mudança radical, aconteceu na minha vida, no meu modo de ser, nos meus relacionamentos - alguns terminaram, outros mudaram e ainda outros começaram - e na minha maneira de pensar. Aquele ano foi o meu fim de mundo pessoal, e acho que foi isso que o meu suposto aluno do sonho queria me dizer. Acho que ele era uma espécie de mensageiro, e estava me alertando para o fato de que grandes mudanças e perdas aconteceriam, mas que depois do fim daquele mundo velho e mofado, coisas boas viriam. E vieram.

Coloquei pingos que estavam suspensos em vários 'is;' enxerguei a necessidade de modificar o teor de relacionamentos com pessoas que eu pensava serem amigas, mas que não me apreciavam realmente, e que através da sua inveja, me desejavam o mal. Passei a valorizar pessoas que eu antes mal enxergava - e que eram as que realmente valiam a pena, que me apreciavam e apreciavam as coisas que eu fazia. 

Por isso, se o mundo acabar realmente hoje, eu vou poder ir em paz. Não tenho nada a reclamar, nada que ficou por fazer ou por dizer. Não tenho nenhum ódio, nenhum desejo oculto por coisas que gostaria de ter feito e não fiz. Estou pronta. 



۝

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Só Pra Lembrar...






Olá, pessoal. Abri tantos blogs ao longo destes cinco anos em que participo da blogsefera, que quase perdi a conta. Mas procuro manter todos eles atualizados!
Deixarei aqui os links para quem quiser visitar e seguir:

HISTÓRIAS - Este é o blog onde posto meus contos e pequenos romances em capítulos. Alguns contos são completos- https://anabailunecontos.blogspot.com

YOUR TICKET TO ENGLISH -Aqui é onde posto aulinhas e dicas para quem quiser aprender inglês. Blog novo!yourtickettoenglish.blogspot.com.br

A CASA & A ALMA - Aqui estão dicas para deixar a casa arrumada, e também as relações entre a casa e a alma. Diria que é meu espaço mais zen, mais 'calminho.' - https://acasaeaalma.blogspot.com

FROM MY WINDOW - Neste blog, eu posto apenas poemas e textos em inglês. - anawindown.blogspot.com.br

PASSAGEM - Neste blog, eu coloco textos, poemas e músicas de pessoas que admiro, trechos de livros que li, enfim, coisas que amo. Um dos meus favoritos. 

NADA A DIZER - Somente minhas imagens. Sem palavras.   anabailuneinstantaneos.blogspot.com

BY ANA BAILUNE - Meu site no Recanto das letras. Há contos, poemas, crônicas, artigos, resenhas... enfim, tem de tudo. Este é fora da blogesfera. 

EU VEJO PASSAR - minha página no facebook, onde republico poemas antigos. Porque a gente lê e esquece. https://pt-br.facebook.com/anabailune2

Acho que isso é tudo... ah, e é claro, tem este aqui, o EXPRESSÃO.

Adoraria receber suas visitas em um deles.




The Hummingbird







A hummingbird came into my house while I was working,
Looked at what I was doing
And quickly left through the open window.

I just stood in awe,
Enjoying its ephemeral presence, openmouthed, 
Heart pounding...
And I thought of the many birds life sends us
And we let them fly away, unnoticed... 




domingo, 12 de fevereiro de 2017

Do Meu Banquinho








Adoro sentar-me em um dos banquinhos espalhados pelo centro histórico ou por outras locações  de Petrópolis, e ficar apenas observando. A gente vê coisas bonitas, engraçadas, corriqueiras, especiais, terríveis... enfim, vê-se todo tipo de coisa. Eis algumas das que vi, coletâneas de algumas horas – em dias diferentes – sentada nos banquinhos das ruas e praças petropolitanas:

Praça D. Pedro, depois do almoço: Aparentando quinze ou dezesseis anos de idade, a  mocinha linda, de longos cabelos, despede-se do namorado atrás de um banco onde está sentado um tiozinho, que não os vê. O namorado vai embora, e ela senta-se ao lado do tiozinho, as longas pernas cruzadas, passando a olhar o celular. Ela é linda e muito charmosa, e logo desperta a atenção do tiozinho, que passa a dar olhadelas cada vez mais longas na direção da moça. Ela percebe, e de brincadeira, começa a incentivá-lo, trocando alguns olhares com ele. Joga o cabelão para lá e para cá, ajeita-se de forma que as pernas apareçam mais. O tiozinho está quase enfartando. De repente, ela inclina o corpo na direção dele para descruzar as pernas, e posso ver algumas mechas do seu cabelo roçando de leve o rosto dele. Ele fica azul de entusiasmo, e então, ela descruza as pernas, levanta-se do banquinho e segue adiante, passando bem na cara dele sem olhar para trás. O tiozinho quase desmaia de frustração, e logo vai embora também. Pensou que ia ganhar a gatinha?

Dezesseis de Março: Passa uma moradora de rua, muito conhecida por aqui. Ela está sempre sozinha, usa óculos de lentes grossas e parece ter algum problema mental. Ela para na frente de uma vitrine de joias caras, e passa a observar longamente anéis, pedras preciosas e pulseiras. Penso que ela deve estar fantasiando usar uma delas, pois sorri de um jeito que me faz notar que ela está em mundo que é só seu, onde ela é princesa e usa todas aquelas lindas joias.

Ainda na dezesseis de março: Uma mulher bem vestida e de boa aparência. Ela passa na calçada gritando e agitando os braços, dizendo que quer morrer. Também parece ter algum problema mental. Ela é de meia-idade, está limpa e tem cabelos bem cuidados. A garganta se enche de veias grossas quando ela grita, e os olhos estão injetados. Desespero? Solidão?

Praça D. Pedro outra vez: Senta-se um senhor com uma garrafa de cerveja em um isopor e dois copos. Ele enche um dos copos, e espera. Minutos depois, senta-se um outro homem ao lado dele. O da cerveja puxa conversa, e logo ambos estão conversando. Sobre o que será que eles falam? Não sei. Mas logo, o homem da cerveja enche o outro copo e o oferece ao recém-chegado, que aceita.  Eles continuam conversando, até que a garrafa está vazia, e ambos vão embora, cada um para um lado.

Rua do Imperador: O rapaz que se veste de anjo chega para começar seu dia. Já tem o rosto, braços e mãos pintados de branco, e começa a vestir seu traje de anjo e finalmente, as asas de papelão e espuma. Ajeita-se sobre o pequeno altar, mas não sem antes colocar uma música suave para tocar em sua caixinha de som portátil, e disponibilizar uma outra caixa de madeira para que as pessoas coloquem algum dinheiro. Assume sua posição de anjo-estátua, e quando alguém joga algum dinheiro na caixinha, ele se move lentamente, retirando do bolso um papelzinho que contém uma mensagem, e entrega à pessoa, agradecendo com um aceno de cabeça. Eu sei que é uma mensagem, porque já recebi uma de suas mãos. 

Perto de um sinal de trânsito – O malabarista se posiciona, segurando seus bastões, enquanto espera o sinal fechar. Assim que ele fecha, o rapaz de cara pintada e roupa de palhaço vai para o meio da rua, e começa a sua performance que dura alguns segundos. Depois, agradece e antes que o sinal abra, vai de carro em carro pedindo uma colaboração – que poucas pessoas dão. Ele é jovem, e está longe de casa - tem sotaque estrangeiro. Por que será que veio de tão longe?

Itaipava – Lá vem o moço do aipim. E dos limões. E das tangerinas. Ele é idoso, muito magro e quase já não tem dentes. Carrega nos ombros um saco com uma dessas três coisas que eu citei, e quando se ajoelha no chão diante de quem está sentado tomando um sorvete ou olhando o movimento, começa a desfiar a sua história, em frases desconexas: “Vim de longe... ainda não comi nada... trouxe da fazenda... colhi hoje de manhãzinha... trabalho desde madrugada... tenho patrão... trabalho na roça debaixo do sol forte... não tenho nem uma moedinha...” E de nada adianta dizer que hoje você não quer, obrigada, deixa para uma próxima vez, pois ele só vai sair depois de contar a sua história várias vezes sem obter resultado algum. E a cada vez que a conta, ele vem de um lugar diferente, e vende alguma coisa diferente. Mas seu olhar sofrido é sempre o mesmo. E lá vai o moço do aipim, dos limões e das tangerinas, com seu saco encardido no ombro debaixo do sol quente, de volta para Sardoal, Areal, ou São José do vale do Rio Preto, ou...

E todos esses personagens ficam girando na minha cabeça, me pedindo para contar suas histórias. 






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EU SÓ TENHO UMA FLOR

  Eu Só Tenho Uma Flor   Neste exato momento, Eu só tenho uma flor. Nada existe no mundo que seja meu. Nada é urgente. Não há ra...