terça-feira, 20 de maio de 2014
A Vingança das Flores
As flores me olham quando eu passo,
Balançam suas leves cabeças e riem,
Em sinal de desaprovação:
-"Estúpida criatura humana,
Nem és capaz de cumprir uma promessa
Que há tanto tempo, fizeste a ti mesma!"
Então, eu as colho em um buquê bem apertado,
E as amarro, todas juntas em um vaso
Que coloco em algum canto escuro da sala.
Penso em, mais tarde,
Brincar de mal-me-quer.
Em resposta, elas murcham.
domingo, 18 de maio de 2014
Domingo de Manhã
Acordo mais tarde, por volta das oito da manhã. O marido ainda dorme.
Olho lá para fora, abrindo uma greta entre as cortinas, e vejo o gramado cheio de folhas secas esperando para serem varridas. Silêncio, pois quase todo mundo dorme até mais tarde aos domingos.
Desço; na sala, a baguncinha deixada pelo sábado: almofadas espalhadas, coisas em desordem sobre a mesa de centro. Pelos de cachorro no assoalho. Na cozinha, algumas louças que não foram lavadas. Abrir janelas, arrumar tudo?... Espreguiçar-me. Hoje, não vou sair para caminhar... preguiça. Tempo nublado, friozinho leve...
A casa no domingo de manhã é sempre tão serena! Não há a preocupação de correr para arrumar tudo antes dos alunos começarem a chegar. Posso andar pela casa de pijamas e chinelos, espreguiçando-me calmamente, ou sentar-me na varanda com um livro por uma boa meia-hora... quem sabe, uma ou duas? Depois eu arrumo; depois eu faço tudo. Depois...
Há que se aproveitar a vida, e para mim, aproveitar a vida significa desfrutar desses momentos pequenininhos, em silêncio, só os passarinhos e raios ainda úmidos do sol... andar pela minha casa, a casa que eu conheço e aprendi a amar. Olhar nos olhos do meu cão ainda cheios de soninho, acariciar a sua barriga, ver se aquela rosa já abriu.
Depois, fazer café e sentar-me ao computador, ainda com a xícara, para escrever um pouquinho.
Pressa? Pra quê?
sexta-feira, 16 de maio de 2014
O Estigma da Dona-de-casa
A moça, constrangida ao responder à pergunta sobre sua profissão, disse quase entre os dentes, rosto corado: "Não trabalho." Diante do olhar espantado de sua interlocutora, arrematou: "Sou dona-de-casa." A outra ergueu as sobrancelhas, e após um minuto de silêncio constrangedor (durante o qual poderíamos imaginar o que ia nas cabeças de ambas), ela respirou fundo, deu um sorriso amarelo e pediu licença.
A primeira, dona-de-casa, decidiu ficar em casa e dedicar todo o seu tempo para cuidar dos filhos; a outra, preferiu seguir sua carreira, dividindo-se entre casa, marido, filhos e trabalho (não necessariamente nesta ordem).
Cada uma fez a escolha que melhor lhe coube; eu não saberia dizer qual das duas está certa ou errada; mas acho que ambas merecem ser respeitadas.
Por que essa indignação contra a mulher que resolveu não trabalhar fora e ter uma carreira importante? Será que a função das donas-de-casa não é importante? Não entendo o motivo que algumas pessoas encontram de censurar as mulheres que decidiram viver uma vida mais simples, fora do mercado de trabalho estressante e competitivo. Bem, adrenalina não é para qualquer um! E podem acreditar, o trabalho dentro de uma casa pode ser bastante árduo, e igualmente importante.
Acho que as donas-de-casa estão se tornando uma espécie em extinção, por puro preconceito! Quem fica em casa sente-se diminuída diante das que trabalham fora. Ora, é apenas uma escolha diferente, que não significa ser "Amélia!"
Que cada uma de nós tenha o direito de ser feliz como bem escolher; se passamos anos tentando sair daquele estado de submissão aos homens, por que não respeitarmos o direito de cada uma de viver a vida que desejar? Por que as mulheres estão se tornando censuradoras de mulheres?
Portas
"...A força da natureza que impele a vida para frente e fecha as portas atrás dela para que jamais recue." - A Ciência dos Espíritos - Eliphas Levi
A vida passa, e fecha as portas
Atrás da barra das suas saias
Guardando a chave, enquanto passa...
-Não volta jamais, e não se volta.
E o que fica atrás das portas,
Veste-se em véu só de mistério
Leve, bordado de pretéritos
A adornar nossos cabelos
(Embora não possamos vê-los).
E o que segue em frente, nunca
Alcançará o que deixou,
Leva as lembranças nos artelhos
E numa caixa, a esperança.
"...Sendo a fé uma graça que é necessário merecer, Deus nunca a impõe a ninguém, mesmo após a morte." - Eliphas Levi
quinta-feira, 15 de maio de 2014
Não é o Momento de Ficarmos Tristes
Vem, chega mais perto e senta aqui comigo,
Dê-me a tua mão, e vamos contar as nuvens que passam...
Elas levitam e transformam-se em grandes animais,
Depois, desaparecem pouco a pouco, desmanchadas...
Assim é a vida: transformação e movimento,
E somos como as nuvens: passamos sem notar
Num céu ora claro, ora tempestuoso,
Crivado de estrelas que há muito já se apagaram...
-Ilusão! Eis o que debrua o limiar da existência!
Pois o olho só alcança aquilo que ele percebe,
Enquanto outras coisas vão ficando entre mistérios
Que a vista jamais capta, que o pensamento não vê!
Mas não é o momento de ficarmos tristes,
Ainda não, não enquanto passam as nuvens,
Enquanto as formiguinhas, enfileiradas, trabalham,
Enquanto os passarinhos voam de galho em galho...
Escuta: não existe uma canção passando com o vento?
Por dentro da tristeza, brotam sementes de alegria...
E tudo é passageiro, nada permanece,
E mesmo que a saudade nos alcance um dia,
Ainda não é o momento de ficarmos tristes!
Eu sei que pendem dos galhos da árvore da vida, gotas pesadas...
Que um dia, vão cair, acarretando-nos mágoas;
Mas por enquanto, desfrutemos da paz que ainda nos resta,
Pois não sabemos quando será o final da festa.
Ainda não é o momento de ficarmos tristes,
Digamos uma prece pelo que ainda existe...
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