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terça-feira, 3 de abril de 2012

A IGREJA NO TOPO DO MORRO







Ela é muito, muito antiga. Branca e absoluta. Fico imaginando quantas damas em seus vestidos rodados e armados, acompanhadas por seus cavalheiros, já olharam lá de cima para a cidade cá em baixo. Talvez soltando no ar uma prece, sabe-se lá pelo quê... Pelo quê rezavam as pessoas, há duzentos, trezentos anos atrás?

Eu já estive lá em cima. Mas eu não rezei. Limitei-me a olhar para baixo, deixando a mente passear entre as casas e prédios, e o vento a zumbir em meus ouvidos. Apenas olhei o mar lá de cima, e sentei-me à porta fechada da velha igreja, sem nenhum pensamento. Embebida pela beleza que me cercava, quis apenas sentí-la, ser parte dela.

Da experiência, ficou uma foto: eu, aos dezessete anos, queimada de sol, pernas cruzadas e olhar triste (até hoje, todos dizem que tenho um olhar triste) ao lado de meu pai. Hoje, exatamente hoje, que o céu está encoberto e o vento muito forte, lembrei-me daquele dia. Na foto, apareço de camiseta azul-marinho e shortinho vermelho. Meu pai, a camisa estampada aberta no peito, as mãos entre os joelhos.

Neste momento, a igreja no topo da montanha é apenas solidão. Seu sino já não dobra mais. Turistas descem e sobem o morro, tiram fotos, olham o mar e depois, se esquecem. A velha igreja está exatamente como as damas antigas e seus vestidos rodados: perdida no tempo. Ninguém sabe para onde elas foram. Às vezes eu penso se, por um acaso, aquela igrejinha no topo da colina não será apenas uma miragem, que só continua lá para que as damas e seus cavalheiros tenham um lugar para onde voltar, quando se cansam de suas peregrinações pelo além...



quinta-feira, 29 de março de 2012

CAFÉ COM O DIABO










CAFÉ COM O DIABO





Bateram à porta, em uma tarde de quinta-feira, logo após o almoço. Estava pronta para tirar uma soneca na rede da varanda, e a batida incomodou-me. Fingi não estar em casa, mas a criatura do outro lado da porta insistiu. Já estava quase aos socos, quando eu abri a porta, pronta a dar uma bronca daquelas, e deparei com aquele ser bizarro; desarmei-me, diante de tanta peculiaridade:



Ele era marrom-esverdeado, e tinha um par de chifres pequeninos na testa. Cabelos curtos e crespos, avermelhados. Dentes pontiagudos e língua bipartida. Os olhos eram verde-esmeralda, as pupilas, finas como as de uma cobra. Os pés – exatamente como na Divina Comédia de Dante – terminavam em cascos. As mãos eram peludas, dedos e unhas compridos. 



Ele segurava a cauda pontuda em uma das mãos, fazendo-a rodopiar, e com o outro braço, apoiava-se no tridente, de maneira relaxada e displicente.



Eu tinha a impressão de que já nos encontráramos antes, mas não conseguia me lembrar de onde, exatamente... fiz a pergunta inevitável, embora já soubesse a resposta:



-Quem é você?



Ele virou os olhinhos, suspirando profundamente:



-Ai, ai, ai... tsc...tsc... e ainda pergunta? Vai me deixar entrar ou não vai?



-Escute, eu estava indo... eu... enfim, estou ocupada, agora. Pode voltar depois.



Disse aquilo e tentei fechar a porta, mas ele impediu-me com a cauda, dando um gritinho quando a porta bateu nela:



-Aiiii! Isso não foi nada gentil!



-Desculpe, eu não pretendia...



-Olha, amiga, ou você me deixa entrar, ou eu vou ficar aqui, de plantão, falando mal de você para a vizinhança inteira. E olha que eu tenho muito tempo!



Ficamos nos olhando durante algum tempo, e como não me veio à cabeça nenhum argumento plausível, abri a porta e fiz um gesto para que entrasse. Ele adentrou minha sala de estar, olhando em volta, parecendo estar reparando na decoração. Convidei-o a sentar-se, e ofereci-lhe uma xícara de café:



-Só se for fresco, passado na hora. Café requentado, nem o diabo agüenta!



Dirigi-me para a cozinha, e comecei a preparar o café. Enquanto colocava a água na cafeteira, assustei-me, ao ouvir sua voz bem ao pé do meu ouvido (ele estava bem atrás de mim):



-Cafeteira elétrica, é? Por isso que eu prefiro aquelas cidadezinhas do interior... eles sim, sabem fazer café de verdade. Mas enfim... fazer o que, não é? É o progresso...



Andei para o outro lado da cozinha, ficando o mais longe dele possível, e tentando não demonstrar a minha repulsa:



-Afinal de contas, o que você quer? Como já disse, eu estava indo... eu estou ocupada, e não tenho a tarde toda.



-Nana, nina, não... você tem a vida toda. Se bobear, uma eternidade, se é que você me entende! Mas... que belo pingüim, esse da sua geladeira –ele disse, segurando-o com suas mãos escorregadias- Onde o comprou? Aliás, também a-do-rei as almofadas da sala de estar! Depois você pode me dar umas dicas, querida!...



Era só o que me faltava! Um diabo com jeito de gay e interessado em decoração!



De repente, ele recolocou o pingüim em cima da geladeira, olhando-me:



-O que foi? Você parece um tanto... desconfortável! Será esse meu jeitinho? Sei que você tem tendências homofóbicas! 


-Ei, eu não tenho...


-Tem sim! Tem sim! Tem sim, tem sim, tem sim! – Ele começou a gritar, dançar e pular pela sala. Aquilo começou a me irritar. Sempre detestei manifestações emocionais exageradas.


-Escute aqui, fala logo o que você quer e se manda daqui! Eu não tenho absolutamente nada contra os gays!


-Ah, é mesmo? Então por que se recusou a sentar-se perto de um, quando estava na escola? Por que desistiu daquele emprego, quando soube que a sua chefe era lésbica? Por que xingou o professor da faculdade de viado quando ele te reprovou? Hein?



Engoli em seco. Naquele momento, o café ficou pronto, e coloquei duas xícaras, açucareiro, uma leiterinha e uma tigela com biscoitos em uma bandeja, levando tudo para a sala. Ele se sentou, e começou a se servir, perguntando logo se eu não tinha bolo. Respondi que não, e fiquei olhando-o comer, e percebi que ele não tinha boas maneiras (o que eu odiava em uma pessoa): derramava gotas de café no estofado, e farelos de biscoito no tapete. A mesinha de centro ficou cheia de açúcar. Fiquei vermelha de raiva, pois eu tinha mania de limpeza. Ele parecia que sabia exatamente como me irritar. Sorriu-me, mostrando a língua bipartida.



-Você está louca para saber por que eu estou aqui, não é? Pois bem; olha, me desculpe qualquer coisa... sei que minha aparência e meu jeitinho te a-mo-fi-nam, e se quiser, posso tomar outra forma.



Dizendo isso, ele começou a transformar-se na minha frente: primeiro, no vizinho irritante com quem eu estava brigada há anos; como viu que não gostei, foi aos poucos virando, bem na minha frente, a periguete que roubou meu ex-marido. Quase avancei nele, mas antes que eu o fizesse, vi-o mudar para a minha atual sogra. E assim, ele foi se transformando, cada vez mais rapidamente, em todas as pessoas com quem eu já tivera uma briga, ou cujo comportamento me irritavam e causavam-me desaprovação. Finalmente, ele tomou a forma mais inesperada possível: lá estava eu, diante de mim mesma! Não foi muito fácil, reconhecer aquela cara mau-humorada e a expressão de superioridade; muito menos, sustentar o olhar julgador e o sorriso de escárnio. Mas aquela era eu, sem a menor sombra de dúvida! 


E para meu total espanto, era a face na frente da qual eu me sentia mais desconfortável. Pedi-lhe que assumisse novamente sua forma normal, mas eu – ou melhor, ele- ergueu as sobrancelhas, e ouvi minha própria voz, dizendo:



-Não... é este demônio que você precisa aprender a dominar.



-E desde quando o diabo ajuda alguém? Olha, conheço os seus truques! Na Bíblia Sagrada, está escrito que...



-Ora, cale essa boca! Nós dois sabemos que você não acredita em dez por cento do que está escrito ali! Sabemos que você só vai à igreja de vez em quando para ser sociável, quando tem casamento, missa de sétimo dia ou batizado. Deixe de ser hipócrita! 



Naquele momento, não suportando mais tanta audácia, comecei a rezar um Padre-Nosso, em voz alta. Ele olhou para cima, demonstrando impaciência, pegou uma lixa de unhas no bolso e pôs-se a lixar as unhas, displicentemente, exatamente como eu costumava fazer, quando queria irritar meu noivo e fingir que não estava escutando o que ele falava. Parei de rezar, e olhei para ele. Ele riu, jogando a cabeça para trás:



-Querida, foi Ele quem me mandou aqui! Ele, o Todo-Poderoso, entende? Deus, a Força, o Senhor do Universo, o Pai! Nem adianta rezar.



-E desde quando Deus tem pacto com o diabo?



-Mas você é burra mesmo, hein? (Aquela era minha própria voz, exatamente como eu me dirigia aos meus funcionários). Deus não precisa ter pacto com ninguém, ó trouxa! E nem precisa dessas orações ridículas que vocês dizem para conseguir Dele o que querem. Ele sabe exatamente do que vocês precisam, e por isso, me criou! Sem mim, vocês jamais evoluiriam, indo finalmente, voltar às suas origens...



-Origens?...



-É! O final de todos os seres humanos, é voltarem a ser unos com o Pai! Mas antes, precisam consertar uns defeitinhos de fabricação... sabe como é, Deus cometeu alguns errinhos ao criar a humanidade, e agora, está fazendo um recall... chegou a sua vez!



-Recall? Mas... como assim?! Se Ele nos criou, por que não pode corrigir Seus erros sozinhos? Por que Ele precisaria criar você? E dar-lhe, ainda por cima, essa forma... horrorosa, bizarra?



Ao dizer isso, ele assumiu, novamente, a sua forma de diabo:


-Esta? Não foi Ele quem me fez assim, foram vocês! Bem, eu vou explicar desde o início.



Dizendo isso, ele serviu-se de mais uma xícara, recostando-se na poltrona e derramando mais café na almofada:


-Foi mais ou menos assim: Tudo começou há muito tempo. Deus vivia sozinho no universo, e entediado, decidiu criar uns playmobill para divertir-se. E Ele o fez. Mas cansou-se de brincar com aqueles bonequinhos inanimados, e por isso, decidiu que estava na hora de fazer com que eles criassem vida; levou-os todos para uma clínica especializada, em um lugar bem parecido com Miami, a fim de fazer a transfusão de fluidos dele para os bonequinhos, mas Ele não sabia que havia por lá uma bactéria misteriosa que contaminou – em maior ou menor grau – todos os bonequinhos a quem Ele deu vida. Assim, Deus precisou retirar-se para o Paraíso, a fim de não ser contaminado. Os bonequinhos cresceram e se reproduziram, e daí, teve aquela confusão toda entre o Adão e a Eva, acho que você já sabe...


-Hum, hum...


-Então; Ele teve uma idéia de Mestre: ligou para a clínica e pediu-lhes que fizessem uma outra criatura, que contivesse todas as bactérias com que os humanos tinham sido contaminados. Ou seja: Euzinho aqui. E meus outros ajudantes e secretários.


-E qual seria a sua utilidade?



-Curar! Pois a única maneira de curar a bactéria negativa, seria colocando os infectados em contato direto com ela, anulando, assim, o seu efeito. Você sabe, como o veneno de cobra é combatido através da vacina feita com o próprio veneno. Mas esta bactéria tem uma outra característica muito peculiar.


-E qual seria?...


-Ela faz com que seus portadores criem defesas contra a cura! Foi então que vocês – os humanos – começaram a criar estas histórias horrorosas contra o Diabo. Deram para escrever sobre nós em Bíblias e outros livros, e desenvolveram formas de nos exorcizarem cruelmente, só para não serem curados! Projetaram imagens horrorosas, com tanta força, que fomos ficando assim, desta forma que você vê...


Comecei a sentir pena dele. Afinal, era apenas um pobre diabo.


-Mas e daí? O que Deus fez?


-Bem, Deus, que não é nada bobo, teve uma outra idéia: se a vacina que trará a cura consiste em combater o mal através de sua fonte criadora, então... vocês teriam que aprender uns com os outros! Teriam que conviver uns com os outros, vendo o mal que cada um contém na face do outro. É claro que isso leva mais tempo, mas no final, acaba dando certo.

-Então é por isso que eu odeio tanto o meu vizinho? 


-É. Ele tem uma característica que te irrita profundamente, não tem?


Balancei a cabeça afirmativamente. Ele continuou:


-E qual é?


Naquele momento, deu um branco em minha cabeça. Respondi que eu não sabia. Ele disse que eu poderia pensar sobre aquilo mais tarde, mas que deveria fazer um esforço. Perguntei-lhe:


-E vocês, os diabos, como é que ficam nessa história toda?


-Bem, nós não somos mais os personagens principais nesta cura, principalmente, depois que vocês trataram de criar tantas histórias sórdidas a nosso respeito, e começaram a nos banir com aqueles exorcismos ridículos toda vez que a gente tentou se aproximar. Além do mais, nos transformaram em bodes expiatórios, colocando em nós a culpa sobre tudo o que há de errado no mundo, sendo que a culpa está em vocês mesmos! Bem, você quer saber o que vai acontecer com a gente? Ainda temos um trabalhinho por aqui, e depois... vamos tirar férias por tempo indeterminado. Ai, mas confesso que dói, às vezes...


Ele fez uma cara triste, e vi lágrimas em seus olhos:



-Basta ter uma dor de barriga, e vocês dizem que a culpa, é de algum espírito zombeteiro. Se o marido vai embora com a periguete, é porque alguém fez macumba e invocou as Forças do Mal... tudo é culpa nossa!



Senti pena dele novamente. Servi-lhe mais uma xícara de café. Ele fez uma careta após beber, dizendo que tinha esfriado, e eu fui para a cozinha, preparar-lhe outro. Olhei pela janelinha sobre a pia, e a tarde já dava lugar ao comecinho da noite. Terminei de preparar o café, e quando coloquei tudo na bandeja e fui para a sala, ele tinha sumido.


Na minha almofada, as manchas de café começavam a secar e desaparecer. Sobre a mesa de centro, o açúcar tinha atraído algumas abelhas. 



Suspirei fundo, e depois de limpar tudo e lavar as xícaras, fiquei à janela, vendo as últimas luzes do dia se transformarem em noite. O céu encheu-se de estrelas. 


Desde aquela tarde, eu perdi o medo da escuridão, pois percebi que os demônios que eu temia, não estavam do lado de fora; estavam dentro de mim.



terça-feira, 27 de março de 2012

SANDÁLIAS - um conto







Sandálias





O coração dele disparou ao vê-la aproximar-se. Não era como as outras meninas que chegavam, interessadas nas pulseiras, colares e sandálias que ele fabricava. Já trabalhava naquele canto de praia há vários anos, montando sua barraca todas as manhãs e desmontando-a no final do dia. Estava acostumado à rotina de lindos corpos bronzeados, e por isso, sabia que não era apenas pela beleza do corpo, nem pelas cores deslumbrantes do florão da canga que ela trazia enrolada à cintura.

Talvez fosse a maneira como os cabelos castanho dourados se agitavam sinuosamente com o vento do mar... ou as esmeraldas que ele percebeu nos olhos dela.

Não era só aquilo; era exatamente aquela coisa que acontece e que é indefinível. Pronto: estava perdido, irremediavelmente perdido.

Pegar seus pertences e ir trabalhar todas as manhãs tornou-se um acontecimento diferente, bem longe da rotina que ele cumpria há anos; pois agora, ela estava lá. Sempre no mesmo horário, passava por ele sem notá-lo. Passava como a brisa do mar, refrescando a todos sem distinções.

Ele decidiu que lhe faria um presente: um par de sandálias. O par mais lindo que jamais havia feito. Selecionou as melhores tiras de couro, as miçangas e cristais. Começou a pensar em um arranjo encantador para dispor tudo sobre as tiras, e como trançá-las de forma que os cristais e miçangas formassem um lindo desenho. Engenhoso que era, logo arranjou uma solução.

Um dia, enquanto trabalhava em sua preciosidade, ela chegou de repente, parando para olhar as coisas que ele vendia. Ela fingia estar olhando as pulseiras, mas na verdade, tinha o olhar atento às costas bronzeadas e musculosas do rapaz (ele estava sentado de costas para ela). Reparou que ele usava uma argola em uma das orelhas. Achou aquilo horrível! Pode perceber que suas unhas estavam sujas devido aos produtos que usava para trabalhar o couro. Também não gostou nada daquilo... mas ele tinha alguma coisa de especial que a atraía, embora ainda nem tivesse visto seu rosto: era o cheiro que vinha dele.

Quando ele se virou de frente para ela, ambos tiveram um momento de confusão, corações disparados, bocas entreabertas.Finalmente, ela gostou de alguma coisa que viu nele: os olhos, o olhar profundo, a barba por fazer. Tinha um charme que não era nada parecido com o charme estudado dos rapazes que ela tinha namorado. Ele era totalmente natural e original, tão original que chegava a ser bruto, e aquilo doía.

Ela pegou uma das pulseiras sem pensar, e disse friamente: "Vou levar esta..." Ele não conseguiu dizer nada: colocou a pulseira em um saquinho de papel, que estendeu a ela, pegou o dinheiro, fez o trôco. Foi quando ela reparou nas tiras cravejadas de pedrinhas e contas que estavam no chão, atrás dele. Ficou encantada com a beleza delicada que estava sendo formada por aquelas mãos embrutecidas.

Perguntou: "O que é aquilo?" Ele respondeu, gaguejando um pouco: "Um par de sandálias." Sem pensar, ela quase gritou, entusiasmada: "Eu as quero! Quando ficam prontas?" Ele sorriu: "Na verdade, elas já tem dono... ou melhor, dona. Estou fazendo as sandálias para dá-las de presente à mulher que é a dona do meu coração."

Ela percebeu que uma leve fúria começou a insinuar-se dentro dela, sem querer. Como ele podia ser tão petulante? Ele percebeu o desconcerto da moça, e achou-o divertido. Ela apenas virou as costas e foi embora, deixando no ar o leve perfume de seus cabelos misturado à maresia.

Ele trabalhou a noite toda, na casinha humilde que ocupava junto ao pier, para terminar o par de sandálias no dia seguinte. Não aceitou o convite dos amigos para mais uma noitada de violão na praia, em volta da fogueira. Quando terminou, o dia amanhecia, e as gaivotas gritavam em volta dos barcos de pesca.

Ele vestiu sua melhor camiseta, sua melhor bermuda, e foi caminhando até a praia. Seu coração não estava acostumado à emoções tão fortes. Batia descompassado, causando-lhe um misto de alegria e ansiedade.

Ela chegou, passando por ele. Desta vez, ela sorriu e seus olhares se cruzaram. Ele esperou até que ela estendesse sua canga na areia e, colocando seus óculos escuros, se deitasse sobre ela. Então, ele pegou sua obra-prima e foi até aonde ela estava, parando diante dela, que, ao perceber que havia uma sombra entre ela e o sol, abriu os olhos, retirando os óculos escuros.

"Você ainda quer as sandálias?"
"Pensei que você tivesse dito que elas estavam sendo feitas para a dona do seu coração..."

Sem nada dizer, ele se ajoelhou diante dos pés dela, colocando-lhe as sandálias. Só então ela compreendeu!

No final do dia, quando ambos estavam sentados diante do mar, exaustos de tanto amar, ela se lembrou que teria que partir na manhã seguinte. Sua vida estava lhe esperando. E a vida bem sabia que não poderia juntar, durante muito tempo, duas criaturas tão diferentes.

Quando ele acordou e estendeu o braço, procurando por ela, encontrou apenas o par de sandálias.





Ana Bailune







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EU SÓ TENHO UMA FLOR

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