Ela tinha medo de escuro.
A escuridão pegou-a de surpresa, durante uma tempestade, em uma noite na qual o marido estava fora, em viagem. Ali onde morava, a escuridão era total. De repente, após um trovão, enquanto ela se encaminhava para a cozinha a fim de separar velas, fósforos e candelabros - já prevendo o que aconteceria - a luz acabou. E ela viu-se no meio do corredor negro, no meio da escuridão negra. Lá fora, a chuva torrencial.
Por um instante, ela não pensou em nada, sentindo o pânico que rastejava sinuosamente pelo chão, em direção às suas pernas, para subir por elas e agarrá-la totalmente. O coração dava pulos dentro do peito, querendo sair pela garganta, e ela não conseguia mover-se. Um relâmpago clareou tudo por alguns segundos, e ela deu alguns passos em direção à cozinha, aproveitando a breve claridade.
A chuva fustigava as vidraças. O vento, maldoso, assoviava pelas frestas. Vieram-lhe à mente cenas dos filmes de terror que assistira quando era criança. Disse a si mesma: "Você é uma mulher feita, não há nada na escuridão, apenas o seu medo." Assim, braços estendidos à frente do corpo, conseguiu chegar à cozinha às apalpadelas. E apalpando, abriu o armário. Derrubou algumas caixas de chá até tocar a caixa de fósforos . Também deixou cair a lembrancinha que trouxera da festa de casamento que fora na semana passada, antes de alcançar as velas.
Mãos ainda trêmulas, acendeu um fósforo e localizou o candelabro sobre a geladeira. Dali em diante, pensava, deixaria os três - candelabro, velas e fósforos - sempre ao alcance das mãos. Acendeu a vela, e quando ia virar-se para voltar à sala, onde estava antes, sentiu uma presença muito forte atrás de si. Parou, com o candelabro na mão, sem conseguir virar-se para trás. Um trovão ribombou, fazendo o chão tremer e os copos chacoalharem na cristaleira. Ela fechou os olhos, sentindo o medo voltar. Podia sentir alguma coisa atrás dela, que de vez em quando, tocava seu cabelo.
De nada adiantaria gritar, pois o vizinho mais próximo estava a mais de cinquenta metros, e com aquele temporal, ninguém a ouviria. Decidiu que se ficasse imóvel, aquilo - seja lá o que fosse - iria embora. Fechou os olhos. Um vento que entrou pela fresta aberta do basculante da cozinha apagou a vela. Ela se sentia dentro de um filme de terror, vivendo seu maior pesadelo. Achava que não sobreviveria àquela noite. Começou a rezar, logo ela, que não tinha fé. Prometeu que, se ela conseguisse sobreviver, tornar-se-ia uma católica devota.
Milagrosamente, a chuva começou a diminuir. A luz voltou, piscou algumas vezes e depois estabilizou-se. Ela sentiu os músculos retesados irem se afrouxando aos poucos, e suspirou, aliviada. Ao olhar para trás, deparou com a enorme borboleta Monarca pousada na parede.
Esqueceu-se de todas as suas promessas de fé e dedicação eternas.
Minha linda, hoje estou conseguindo vir aqui na maior facilidade. - Que coisa boa!!!! Obrigada pela belíssima participação na Ciranda '' Reflexão sobre o '' Mundo Poesia''. Estou muito feliz de verdade mesmo!!!!! Um beijo
ResponderExcluirEsta borboleta monarca no final
ResponderExcluirrevela um confortante presságio
para nós poeta
que as vezes
sofremos com a aflição do mundo
mas ler este conto
é como tomar uma copo de leite
olhando para a Royal negra
como a escuridão da noite
mas tocada nas teclas
revela poesia e relâmpagos
maravilhosos...
Luiz Alfredo - poeta
Muito bonito Ana:Quando comecei a ler,pensei em uma cobra.Surpreendeu-me a meneira delicada com descreve o encontro e a surpresa com uma borboleta.Parabéns Ana.
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