Ela era uma nuvem que passa e ninguém vê,
Um poema épico que ninguém jamais leu,
Escrito à sangue no coração de Deus.
Uma pena soprada por um vento em desatino,
Folha temporã caída da árvore do destino,
Fruta tão doce que ninguém colheu.
Ela era uma passagem bem no meio do tempo,
Que levava do Nada à Plenitude,
Mas que muitos temiam como a finitude.
Ela tinha cores claras e sempre discretas
Que compunham suas vestes na dor e na festa,
No rosto, o mesmo riso ante o sol e a tempestade.
Ela não compreendia o que era saudade,
Pois nuvem que passa se derrete e vira rio,
E o frio se transforma novamente em verão.
Ela era o ‘sim’ que se escondia no ‘não’,
O doce reencontro após um amargo adeus,
A canção das estrelas em lenta escansão.
E ela sempre passava, e passando, ninguém via,
Ela era a eternidade vivendo em um só dia,
Era o som da palavra que ninguém ouvia.
E até hoje ela passa, e passando, se vai
Entre passos, poemas, e letras, e estradas,
Deixando as pegadas que nós, distraídos,
Com os pés, apagamos, até não restar nada.