witch lady

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sexta-feira, 16 de junho de 2017

Ao Sol da Tarde



Metáfora









Às vezes,
há ainda uma  corrente
Muito fina e cristalina
Que quer correr para o mar,
Ainda há um par de pernas
Que caminham devagar, 
Mas que querem caminhar.

Há uma história em seu final,
Porém, algo a se contar
E também a se escrever;
Uma alma que pressente
Que as palavras são cansadas,
Que os olhos estão baços
Mas ainda querem ver.

Às vezes,
A memória se confunde,
Misturando em seu cadinho
O presente e o passado,
Mas ainda há um futuro,
Um epílogo iminente
Cujo fim está marcado.

Às vezes,
Ainda arde o desejo
De abrir portas e janelas,
E pôr aquele vestido
De saias muito rodadas
E pedir que um vento lúdico
Venha brincar, divertido,

Mas vem a voz do repúdio,
Aquela, que sempre diz “não”
E encerra o interlúdio
Com um só gesto de mão.

Às vezes, 
Ainda há um caminho
Com vontade de pegadas,
Há um pedaço de sonho
Sob as pálpebras fechadas,
Porém, à realidade,
Desfolha-se a rosa murcha
Debaixo dos olhos críticos
Que sentem-se ameaçados.

E um dia, sob a terra,
Ficará aquela história
De alguém que já se foi,
E nem fez muita questão
De incomodar a memória
De deixar uma lembrança
Num canto de coração.






Hai-Kai








Dia amanhece
No hálito, neblina 
Que o sol dissipa.







terça-feira, 13 de junho de 2017

Farewell









All that fits into a look 
Rehearses a farewell. 

There are too many dry leaves 
On the grass of my life, 
Swept away from their moments, 
Born to not stay ... ... 

Your skin is so ephemeral, 
 Fleeting is your look! 
And every touch is goodbye...

Each encounter creates roads 
To take you away from me...

 Nothing ever stays, 
We are lonely creatures ... 
It is part of our essence
To turn ties into knots.





Na Casa da Gente, na Mente da Gente







A vida da gente deveria ser exatamente como a casa da gente: só entra o que a gente gosta. Mas como precisamos ter os olhos abertos, a vida da gente acaba cheia de coisas que não gostaríamos de ver; e quando percebemos, é tarde: já vimos!

Como lidar com as coisas que entram assim na vida da gente, pela janela? Algumas delas precisamos enxotar. Mas não sem antes dar uma boa olhada, porque se entrou, talvez tenha sido necessário entrar. Já repararam que a gente aprende muito mais através dos acontecimentos ruins do que dos acontecimentos bons? Pois é. 

De repente, escutamos algo - uma indireta, um comentário maldoso, ou então somos vítimas de um olhar atravessado ou de uma indiferença inesperada. Na hora, podemos não dar tanta importância, mas quando estamos sós, começamos a pensar naquilo e a nos indagar: por que? E esses pensamentos tristes ficam ali, contaminando tudo, e nos tornamos mau humorados sem nem sabermos direito o motivo.

Alguém me disse que é muito mais fácil ficar lembrando do que foi ruim, prestando atenção às injúrias que nos fazem, do que se concentrar em coisas boas. Acredito que seja verdade, e que haja um bom motivo para isso: é que ninguém está aqui apenas a passeio. As coisas ruins acontecem para que nós aprendamos através delas a ter mais serenidade. Só se valoriza a paz conhecendo o desespero. Essa felicidade imaculada de Facebook não existe. E se existisse, seria absurdamente chata.





A casa da gente precisa ser limpa de vez em quando. Para isso, precisamos colocar a mão na massa: mover móveis pesados de seus lugares, aspirar, tirar o pó, passar pano úmido... dá trabalho. Da mesma forma, dá trabalho limparmos as nossas vidas do que é ruim e sujo, e só conseguiremos fazer isso se olharmos para a sujeira também. 

Quem limpa a casa de olhos fechados acaba deixando muita sujeira espalhada. É preciso abrir bem os olhos. Pode ser que, ao terminarmos, nós estejamos sujos e suados. Então, vamos tomar um bom banho e descansar. 

De vez em quando, eu olho para  a minha vida (geralmente, quando começo a me sentir incomodada com alguma coisa, ou pesada e entediada) e começo a fazer uma boa limpeza nos meus pensamentos, sentimentos, lembranças, e até mesmo em pessoas cujo único objetivo é me colocar para baixo. Para isso, vale até um ritual:

Escrevo em um papel tudo o que está me incomodando, e penso bastante no porquê de estas coisas estarem me incomodando. Tento entender por que permiti que elas entrassem, e por que elas estão ali até agora. Depois, me imagino tirando essas coisas que me incomodam da minha vida. Acendo uma vela, ou um incenso, mentalizando que elas estão desaparecendo. Finalmente, queimo o papel onde as escrevi.

De vez em quando, eu preciso fazer isso. Logo depois, é como se tivesse tirado um peso enorme dos ombros.





Simpatia





Trago hoje um poema de Casimiro de Abreu:



O QUE É - SIMPATIA
(A uma menina)

Simpatia - é o sentimento
Que nasce num só momento,
Sincero, no coração;
São dois olhares acesos
Bem juntos, unidos, presos
Numa mágica atração.

Simpatia - são dois galhos
Banhados de bons orvalhos
Nas mangueiras do jardim;
Bem longe às vezes nascidos,
Mas que se juntam crescidos
E que se abraçam por fim.

São duas almas bem gêmeas
Que riem no mesmo riso,
Que choram nos mesmos ais;
São vozes de dois amantes,
Duas liras semelhantes,
Ou dois poemas iguais.

Simpatia - meu anjinho,
É o canto do passarinho,
É o doce aroma da flor;
São nuvens dum céu d'Agôsto,
É o que m'inspira teu rosto...
- Simpatia - é - quase amor!




segunda-feira, 12 de junho de 2017

Onde Está a Barbárie?








Um rapaz é torturado em São Bernardo do Campo por suspeita de estar envolvido em um roubo de bicicleta. Um filme circula pelas redes sociais, no qual dois tatuadores tatuam na testa do rapaz os seguintes dizeres: “Sou ladrão e vacilão.” 

As notícias se cruzam, se entrecruzam e não atingem um senso comum: alguns dizem que o possível ladrão é deficiente mental, viciado em drogas e alcoólatra, enquanto outros afirmam que a vítima (ou quase vítima) do roubo é quem sofre de deficiência mental. Uns defendem o torturado, e outros, os torturadores. 
Fato é que da verdade nua e crua, ninguém sabe.

Um internauta decide fazer uma campanha de arrecadação a fim de pagar pela remoção dos dizeres tatuados na testa do rapaz, e sofre ameaças de morte por isso. Enquanto isso, outros o criticam alegando que, quando há uma campanha para ajudar alguém doente, não se arrecada tanto dinheiro assim – dizem que a quantia já ultrapassa quinze mil reais, em apenas alguns dias de campanha. 

Observando tudo isso, eu me pergunto: onde está a barbárie? Quem está certo, e quem está errado?


Só consigo ver erros em todos os lados. 

O rapaz errou por ter roubado, se é que ele realmente roubou. Errou ao tornar-se usuário de drogas e alcoólatra. A família dele errou por não dar a ele a assistência que ele precisa. Os torturadores erraram ao marcarem o rapaz por um crime que até agora as informações não confirmam se ele cometeu ou não. E mesmo que tivesse cometido, isto não justificaria alugar um quarto de pensão, sequestrar uma pessoa e praticar tortura contra ela, filmando e colocando tudo em redes sociais – o que prova a deficiência mental também dos tatuadores. 

Às vezes, na hora em que um criminoso é pego no ato, o sangue quente pode fazer com que alguém o agrida antes de chamar a polícia, mas não foi o caso. Os tatuadores em questão tiveram a frieza e o tempo de alugar um quarto de pensão, levando para lá todo o equipamento de tatuagem, sequestrar o garoto, tortura-lo e filmar tudo. Não foi uma reação causada pelo calor do momento: foi algo fria e calculadamente planejado. Não podemos aceitar que isso se torne comum. 

Afinal, em que mundo queremos viver? Torturar é normal agora?

Este é um tempo no qual circulam nas redes sociais toda espécie de barbáries e atrocidades, cometidas por alguns e defendidas ou criticadas por muitos. Vemos casos de idosos e crianças sendo agredidos covardemente, enquanto alguém filma tudo e põe na rede com dizeres como: “Compartilhem! Vamos pegar este criminoso!” Porém, quem filmou e nada fez também não cometeu crime? E quem, ao descobrir marcas e feridas no corpo de uma criança ou idoso, ao invés de chamar a polícia e demitir imediatamente o cuidador, preferiu colocar uma câmera escondida a fim de ‘pegar no flagra’ o torturador – sabendo que quem sofre as agressões poderia correr risco de morte – também não age de forma bárbara? 

Como eu poderia, sabendo que minha própria mãe ou avó, ou até meu bebê, tem marcas de agressões no corpo e que a próxima vez poderia ser a última, ter a frieza de instalar uma câmera e deixa-la ser agredida mais uma vez?

Aqui na minha cidade houve o caso de um homem que agrediu um cão de rua à facadas, causando sua morte. O caso aconteceu no meio da rua, e ninguém fez nada para impedi-lo. Todos sabem quem ele é, mas ninguém pensou em denunciá-lo ou impedi-lo enquanto o crime acontecia. Mas é claro, alguém filmou, fotografou e colocou no Facebook. Em um outro caso, um homem aparece colocando um cachorrinho dentro de uma caixa de papelão, enquanto vários observam e um deles filma tudo; depois, o tal homem ateia fogo à caixa, com o cão dentro, e ninguém faz absolutamente nada enquanto o cão grita, e após finalmente conseguir sair da caixa, sai correndo, em chamas. Quantos criminosos há nesta postagem?

Acho que quem assiste a estes acontecimentos e nada faz para impedi-los, é igualmente criminoso, e sádico, pois faz questão de assistir e depois partilhar na internet. E de que adianta submeter às pessoas a assistir estas filmagens, depois que o crime já aconteceu? Talvez, se ao invés de filmar, tivessem chamado a polícia, tais coisas não teriam acontecido! 

Sem contar os inúmeros casos de notícias falsas, acusando pessoas inocentes de maltratar animais ou vulneráveis, onde fotografias dos ‘torturadores’ são partilhadas enquanto o ódio é incitado contra estas pessoas inocentes, que acabam sendo torturadas e mortas por justiceiros. Eu me pergunto: por que ainda há pessoas que partilham coisas assim?

Existe uma divisão nos dias de hoje, entre os ‘bonzinhos’ e os ‘malvados.’ Mas pelo que vejo, esta divisão está ficando cada vez mais tênue, e a barreira entre a maldade e a bondade está sendo rompida pela hipocrisia e a vontade de aparecer. 

Quem filma coisas assim não é bonzinho: é um sádico. E o mal está vencendo, tomando conta do bem, contaminando o bom senso.

Está errado quem rouba, está errado quem tortura, está errado quem filma e posta na rede. E compartilhar cenas como estas – hoje eu compreendo – é o mesmo que dar suporte a esse tipo de coisa. Pois tudo o que eles querem, é notoriedade. Vídeos assim devem ser entregues à polícia, e não serem partilhados nas redes sociais. 






Landscape








Sometimes
The landscape is not beautiful,
But we keep silent
Not to disturb other people's illusions.





quarta-feira, 7 de junho de 2017

António Aleixo






Do lindo blog de Maria Dilar, o "Luares de Agosto." Não pude deixar de compartilhar.


Glosa

Se Deus te deu, com certeza
Tanta luz, tanta pureza, P'rò meu destino ser teu
Deu-me tudo quanto eu queria
E nem tanto eu merecia...
 Que feliz destino o meu!

Às vezes até suponho
 Que vejo através dum sonho
 Um mundo onde não vivi.
 Porque não vivi outrora
 A vida que vivo agora
 Desde a hora em que te vi.

Sofro enquanto não te veja
 Ao meu lado na igreja,
 Envolta num lindo véu
. Ver então que te pertenço,
 Oh! Meu Deus, quando assim penso
 Julgo até que estou no céu.

É no teu olhar tão puro
Que vou lendo o meu futuro
 Pois o passado esqueci;
 E fico recompensado
 Da perda desse passado
 Quando estou ao pé de ti.

Poema de António Aleixo, em "Este Livro que Vos Deixo."





Também de António Aleixo:




Os Vendilhões do Templo

Deus disse: faz todo o bem 
Neste mundo, e, se puderes, 
Acode a toda a desgraça 
E não faças a ninguém 
Aquilo que tu não queres 
Que, por mal, alguém te faça. 

Fazer bem não é só dar 
Pão aos que dele carecem 
E à caridade o imploram, 
É também aliviar 
As mágoas dos que padecem, 
Dos que sofrem, dos que choram. 

E o mundo só pode ser 
Menos mau, menos atroz, 
Se conseguirmos fazer 
Mais p'los outros que por nós. 

Quem desmente, por exemplo, 
Tudo o que Cristo ensinou. 
São os vendilhões do templo 
Que do templo ele expulsou. 

E o povo nada conhece... 
Obedece ao seu vigário, 
Porque julga que obedece 
A Cristo — o bom doutrinário. 





Não Creio nesse Deus

Não sei se és parvo se és inteligente 
— Ao disfrutares vida de nababo 
Louvando um Deus, do qual te dizes crente, 
Que te livre das garras do diabo 
E te faça feliz eternamente. 

II 

Não vês que o teu bem-estar faz d'outra gente 
A dor, o sofrimento, a fome e a guerra? 
E tu não queres p'ra ti o céu e a terra.. 
— Não te achas egoísta ou exigente? 

III 

Não creio nesse Deus que, na igreja, 
Escuta, dos beatos, confissões; 
Não posso crer num Deus que se maneja, 
Em troca de promessas e orações, 
P'ra o homem conseguir o que deseja. 

IV 

Se Deus quer que vivamos irmãmente, 
Quem cumpre esse dever por que receia 
As iras do divino padre eterno?... 
P'ra esses é o céu; porque o inferno 
É p'ra quem vive a vida à custa alheia! 





António Fernandes Aleixo OB (Vila Real de Santo António, 18 de fevereiro de 1899 — Loulé, 16 de novembro de 1949) foi um poeta popular português.

Biografia (fonte: Wikipedia)
Considerado um dos poetas populares portugueses de maior relevo, afirmando-se pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo também é recordado como homem simples, humilde e semi-analfabeto, e ainda assim ter deixado como legado uma obra poética singular no panorama literário português da primeira metade do século XX.
No emaranhado de uma vida cheia de pobreza, mudanças de emprego, emigração, tragédias familiares e doenças, na sua figura de homem humilde e simples houve o perfil de uma personalidade rica, vincada e conhecedora das diversas realidades da cultura e sociedade do seu tempo. Do seu percurso de vida fazem parte profissões como tecelão, polícia e servente de pedreiro, trabalho este que, como emigrante, exerceu em França.
De regresso ao seu Algarve natal, estabeleceu-se novamente em Loulé, onde passou a vender cautelas e a cantar as suas produções pelas feiras portuguesas, atividades que se juntaram às suas muitas profissões e que lhe renderia a alcunha de «poeta-cauteleiro».
Faleceu vítima de uma tuberculose, a 16 de novembro de 1949, doença que tempos antes havia também vitimado uma de suas filhas.







Tudo Vai Bem








Findo O trabalho, ao final de um dia,
Olhei para cima: o céu estrelado.
O dia se foi, e a lida, e a vida
Continuam sempre -  tudo vai bem...

Pois por sobre a casa a noite estendeu
O seu véu rendado, todo salpicado
De pequenos brilhos frios e espelhados
Esperança que aguarda o dia que vem.






Parceiros

Wyna, Daqui a Três Estrelas

Este é um post para divulgação do livro de Gabriele Sapio - Wyna, Daqui a Três Estrelas. Trata-se de uma história de ficção científica, cuj...