witch lady

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quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Nada me Disseram








Nada me disseram os teus olhos,
Naquele dia em que eu te revi.
Havia um rio bem no meio,
E nas margens, uma cidade.

Na cidade, ruas úmidas
Pelas quais nunca andarei...
Casas de janelas altas
Pelas quais nunca olharei.

Nada me disseram os teus olhos,
Quase não reconheci
O estranho que eu fitava
De quem nem me despedi.









terça-feira, 18 de outubro de 2016

Cântico VI








Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.

E então serás eterno.


Cecília Meireles




Quebrando Regras



Reza o bom-gosto que todas as louças sobre uma mesa tem que ser iguais. Assim como todos os copos e talheres, tudo pertencendo a um mesmo aparelho. 

Tem mesmo?

Mas ... e aquelas peças que sobraram dos aparelhos antigos que foram quebrando, ou as que ficaram de herança dos pais ou tias? Só porque elas não tem suas peças correspondentes, terão que ser legadas ao esquecimento, ou então condenadas a permanecerem enfeitando a cristaleira? Não! Coloque tudo na mesa!

Copos diferentes uns dos outros, xícaras, travessas  e pratos que pertenceram a vários aparelhos diferentes e talheres que não tem nada a ver uns com os outros, servem para quebrar o gelo da formalidade e criar mesas lindas e coloridas. Basta usar um pouco de imaginação. 

Sou absolutamente contra qualquer regra em uma casa. Casa tem que ter a nossa cara. Mais importante do que cumprir regras que mais parecem uma 'ditadura do bom-gosto,' cada um deve usar o que gosta, o que pode evocar lembranças de bons momentos ou de pessoas queridas que se foram. Por que não?




Por isso, quando eu era menina, adorava tomar café na casa da tia Rosa. Lá, as xícaras eram todas diferentes: cada uma mais linda e antiga que a outra, e eu podia sempre escolher qual xícara ou pires gostaria de usar. Optava quase sempre por uma branca de bolinhas vermelhas, redonda e bojuda. 




Quando me casei, eu tinha copos lindos, mas como não sou de guardar nada, eu usei-os todos, e eles foram quebrando. Um dia, peguei todos os copos que eram de conjuntos diferentes e doei. Hoje, eu me arrependo de ter seguido a regra ditatorial de que todos os copos sobre uma mesa devem ser iguais. 


Uma das vantagens de ter copos de cores e modelos diferentes, é que cada pessoa saberá qual é o seu, sem confundí-los com os de outra pessoa. 

Para mim, a única regra de uma casa deveria ser esta: use tudo o que gostar, sem se preocupar com o que os outros vão pensar ou com as convenções da moda e do bom-gosto. Casa é para ser feliz. É o único espaço do mundo onde você pode andar nú, cantar no banheiro, ficar de pijama o dia inteiro no final de semana, convidar quem você quiser... e usar louças diferentes em uma mesma ocasião.

O mesmo eu digo sobre lençóis, fronhas e colchas. E também sobre as cores das paredes. Gosto de um cômodo de cada cor. Certa vez, uma pessoa disse sobre minha cozinha: "Onde já se viu, cozinha de paredes vermelhas?" Sem hesitar, respondi: "Aqui em casa!"










segunda-feira, 17 de outubro de 2016

É MEU









É meu - tem meu cheiro, minha letra,
Meu estilo, minha escolha,
Minhas cores, meus olhares
-E eu sou possessiva.

Piso firme 
calcando os calcanhares
Nesse solo que conheço,
E que me pertence,
-E é meu.

Danço sobre as linhas virtuais e inexatas
Quase me arriscando a cair num abismo
Sem começo ou fim
De bits, megas, terabites,
Entre blogs e sites.

São minhas - e me pertencem totalmente
As palavras que aqui deito, e que deixo
À míngua, para morrer
Ou quem sabe, viver.

E se viverem,
É porque, na verdade,
Não mais me pertencem,
Mas a quem as escolher.





quinta-feira, 13 de outubro de 2016

O GRITO – EM PRIMEIRA PESSOA UMA REFLEXÃO








O texto abaixo trata-se de uma reflexão baseada em meras observações – sobre mim mesma e sobre outras pessoas.







Por que eu grito?

Há vários motivos que podem fazer alguém gritar ao dirigir-se à outra pessoa. Cada um tem suas razões para gritar, mas estas razões tornam-se perdas logo após o grito: perda de bom senso, paciência, calma, autocontrole, justiça, caridade, compreensão, verdade, razão.

1- Eu grito porque me sinto frustrada. Alguém não está me escutando. Com certeza, quando chego a este ponto, já tentei várias outras formas de abordagem sem ter sucesso. Grito porque eu preciso que me ouçam, pois quem sabe, uma injustiça está sendo cometida contra mim, ou tenho algo muito importante a dizer que, se não for escutado, poderá trazer graves consequências para todos. Mesmo assim, quando eu grito por este motivo, perderei a razão e as pessoas virarão as costas para mim ainda mais rapidamente.

2- Eu grito porque eu fui ferido, magoado, machucado, e pretendo pagar tal pessoa na mesma moeda. Assim, acabo cometendo o mesmo erro que ela, me comportando da mesma forma destemperada, bestial e mal-educada.

3-Eu grito porque eu quero que não me ouçam. Isso mesmo! Eu grito porque existe algo dentro de mim que eu preciso disfarçar de alguma forma, e meu escândalo é a minha tática para que as outras pessoas não escutem meu segredo, e sim a minha mentira. 

4-Eu grito porque não tenho autoconfiança, e a voz elevada pode fazer com que as pessoas fiquem assustadas na minha presença, pensando no quanto eu sou temível, poderoso, superior. Na verdade, esse meu grito não passa de insegurança, medo, pavor. Grito para parecer forte e destemido. Grito porque não sei afirmar-me de outra forma. Sou um incompetente. 

5-Eu grito porque, de repente, as coisas tornaram-se pesadas demais, e meu peito está oprimido. Neste caso, meu grito não é dirigido a ninguém especificamente, mas é uma forma de desabafo, uma tentativa de aliviar o estresse, a opressão, o meu medo do futuro ou a minha incapacidade de lidar com todos os acontecimentos que estão em minha vida. 

6-Eu grito porque não quero escutar o que você tem a dizer, pois sua verdade me assusta. Ela me obriga a encarar meus próprios erros. Ela me coloca frente a frente comigo mesmo, e eu não consigo me olhar e me enxergar em suas palavras, pois sei que elas são verdadeiras. Grito para que você se cale. 

7- Eu grito de medo, porque preciso de ajuda. Meu grito é uma maneira de chamar a atenção dos outros sobre a minha pessoa, mas o efeito é totalmente contraproducente, pois muitas vezes, ao invés de obter a ajuda da qual necessito, acabo espantando quem poderia ajudar-me. 

E você? Por que grita?

Seja qual for o motivo, o grito é uma forma de agressão à outra pessoa. Na maioria das vezes, o grito perpetra uma grande injustiça, e demonstra, não o meu poder, mas a minha incompetência em dialogar.









segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Estou me expondo?










"Só conseguimos deitar no papel os nossos sentimentos, a nossa vida." – Graciliano Ramos





Quem não deseja expor-se, jamais poderia pensar em escrever alguma coisa. Todos que escrevem correm vários riscos, entre eles: cometer erros de gramática, parecer ridículo para quem lê, ser mal interpretado - e o mais mortal pecado de todos, expor a si mesmo. Porque quem escreve e não expõe a própria alma por medo do que os outros pensarão, nunca produzirá nada que valha a pena.

Em cada poema, em cada personagem de contos, em cada crônica, passeia o escritor. A grande confusão, é que muitas vezes a alma dele está ali, naquele personagem ou no eu-lírico de um poema, mas muitas vezes, o leitor pensa, equivocadamente, que a história daquele personagem é uma autobiografia. 

O personagem e o eu-lírico, como os filhos, carregam traços do escritor, mas não são ele, e nem sempre significam uma reprodução de sua vida pessoal. 

Imaginem se Stephen King, escritor de contos de terror, tivesse sua vida real representada em cada personagem que cria! Que tipo de pessoa ele seria? 

Quando, por exemplo, o poeta fala de solidão, apesar de ele estar colocando ali naquele poema seus sentimentos sobre ela, isto não significa que ele seja, necessariamente, um solitário. Ele pode estar falando de uma solidão real ou não. Um eu-lírico não é sempre uma representação da vida do autor, embora traga em si seus traços, vivências, observações sobre vivências alheias e opiniões suas e / ou de outras pessoas. 

Eu penso que o leitor precisa tomar muito mais cuidado ao ler do que o escritor ao escrever. Uma leitura malfeita e uma interpretação precipitada podem gerar comentários totalmente equivocados, e até mesmo, bizarros.



Graciliano Ramos









Pensamentos do autor Graciliano Ramos





"Se a única coisa que de o homem terá certeza é a morte; a única certeza do brasileiro é o carnaval no próximo ano."






"É o processo que adoto: extraio dos acontecimentos algumas parcelas; o resto é bagaço."






"Quem escreve deve ter todo o cuidado para a coisa não sair molhada. Da página que foi escrita não deve pingar nenhuma palavra, a não ser as desnecessárias. É como pano lavado que se estira no varal."






"Só posso escrever o que sou. E se os personagens se comportam de modos diferentes, é porque não sou um só."









"Certos lugares que me davam prazer tornaram-se odiosos. Passo diante de uma livraria, olho com desgosto as vitrinas, tenho a impressão de que se acham ali pessoas, exibindo títulos e preços nos rostos, vendendo-se. É uma espécie de prostituição."




"Só conseguimos deitar no papel os nossos sentimentos, a nossa vida."




Graciliano Ramos de Oliveira foi um romancista, cronista, contista, jornalista, político e memorialista brasileiro do século XX, mais conhecido por seu livro Vidas Secas.
Nascimento: 27 de outubro de 1892, Quebrangulo, Alagoas
Falecimento: 20 de março de 1953, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro






Às vezes










Às vezes, 
Quando abro os olhos sobre a tela,
Um ranço deixa tudo definido:
As mesmas rusgas de sempre,
As mesmas rugas nos Faces,
A palavra sempre à esquerda
Tentando chegar à direita.


Às vezes, 
Quando os olhos passam sobre as linhas,
Elas cortam como cerol,
Despedaçando as minhas frases,
Partindo em mil pedaços
O verdadeiro sentido
De todas as mensagens.


Às vezes,
O mundo inteiro me cansa,
Então vou lá para fora; fecho os olhos,
Escuto os pássaros nos galhos,
E sinto o vento no rosto
Para trazer de volta o gosto
E matar o desgosto
De tanto esgoto.





ODDITY






What we see 
When we look in the mirror
Is an inverted image of ourselves,
Exactly the image
That others see
When they look at us.





Editadas









Tempo Livre






O que você gosta de fazer no seu tempo livre?

Esta é uma pergunta que sempre aparece durante as conversas com meus alunos de inglês: "What do you like to do in your free time?"  E então começamos a falar de todas as atividades com as quais preenchemos nosso suposto 'tempo livre:' exercícios físicos. Cozinhar. Cuidar da casa. Levar o cachorro para passear. Fazer compras. Ir à festas. Assistir a um filme. Ler um bom livro. E então, eu acabo concluindo de que essa coisa de tempo livre não existe; pelo menos, não como a imaginamos!

Pois se nós tratamos de preencher todas as lacunas do nosso tempo com atividades, então não haverá mais lacunas, e portanto, não haverá o que deveria ser chamado de tempo livre.

O trabalho em uma casa jamais termina. Jamais! Sempre há alguma coisa que a gente deixa para fazer no nosso tempo livre: arrumar os armários, podar as roseiras, retirar as teias de aranha dos cantinhos, tirar o pó. Se não tivermos cuidado, estaremos dedicando todo o nosso tempo livre ao cumprimentos de tarefas após tarefas. 

O mesmo se diz de quem trabalha fora: ao invés de tirar dez minutinhos para o café, as pessoas aproveitam para colocar alguma coisa em dia. Quando eu trabalhava fora, os intervalos entre as aulas eram todos dedicados à preparação de outras aulas. 

Lembro-me de um final de tarde muito cansativo; eram cinco da tarde, estava um calor horroroso e minha próxima aula seria às sete. Todos os professores estavam em sala de aula, e decidi que ao invés de começar a preparar as aulas da semana seguinte, eu ia antes tirar algum tempo para descansar. Apaguei as luzes da sala dos professores, virei o ventilador na minha direção, coloquei os pés para cima em uma cadeira e fechei os olhos. Dez minutos depois, alguém passou no corredor e me viu. Ela entrou, acendendo a luz e perguntando: "Você está bem? Precisa de alguma coisa?" Respondi que estava bem, mas ela continuou me perguntando qual era o problema comigo. Quando insisti que estava apenas descansando, ela me deu um tapinha nos ombros e saiu, dizendo que se eu precisasse conversar, ela estaria disponível, e saiu, deixando a luz acesa.

As pessoas não estão acostumadas a verem as outras descansando. Logo concluem que há um problema de saúde, ou emocional. Se você está apenas parado, contemplando a natureza ou o movimento da rua, você está deprimido. Há muitos anos, quando eu era uma estudante, o pai de uma amiga passou de carro e me viu parada no ponto do ônibus. Por algum motivo, ele não podia me oferecer uma carona, e seguiu adiante. Eu estava bem debaixo de um salgueiro chorão, uma árvore linda, e eu contemplava o vento agitando suas longas folhagens, e nem sequer o vi passar. Quando nos reencontramos, ele me perguntou por que eu estava tão triste naquele dia. Só que eu não estava triste! Estava apenas parada, olhando para uma linda árvore que ninguém olhava, embora passassem por aquela ela centenas de vezes por ano.

Para mim, tempo livre é para não fazer nada. É como eram as horas de recreio na escola, mas ao invés de brincar, eu me sento no pátio e apenas observo. É o momento de aguçar minha percepção, descansar o corpo e a alma. Hora de não fazer absolutamente nada - por mais estranho que isso pareça.




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