Não é ter uma casa maior ou mais bonita que vai preencher o seu vazio. Não é um carro novo, uma viagem, um novo eletrodoméstico ou a renovação do guarda-roupa que vai fazer com que aquele enorme buraco dentro de você seja preenchido. Embora estas coisas possam ser positivas e acrescentar momentos de prazer, elas não servem para aquele espaço que deve ser ocupado pelo autoconhecimento, sabe, aquelas coisinhas que a gente não quer ver, se recusa a escutar e acha que se elas ficarem lá fora no frio, miando de fome, vão acabar morrendo.
Elas não vão morrer; vão miar cada vez mais alto, sem jamais se cansarem. E estes miados vão se revelar de várias formas: dores no corpo, pesadelos, insônia, insatisfações, e a pior de todas: a amargura.
O que é amargura? Amargura é olhar em volta e não achar nada bonito para se ver, pois os olhos ficam turvos. Parece que o olhar se acostuma a só focar no que for feio, e é só isso que a pessoa amarga consegue enxergar, pois é só por isso que ela se interessa. Quando está diante de alguma coisa bonita, ela procura, procura e procura, até achar um defeito que possa citar; e quando está diante de algo não tão bonito, ao invés de se calar ou procurar por alguma coisa positiva, ela simplesmente se sente feliz feito pinto no lixo, e passa a apontar, criticar, rebaixar. Parece que o prazer da pessoa amarga é causar desprazer nos outros, fazer pouco de suas conquistas e jogar indiretas ferinas.
Pessoas assim não precisam de mais, e sim, de menos: menos coisas materiais, e mais momentos preciosos de silêncio para conversar com elas mesmas; menos gente em volta, e mais solidão até aprenderem a sentir prazer na própria companhia; menos ruídos e barulhos altos, e mais silêncio para se concentrar no que realmente interessa; menos dezenas de pessoas em volta que nada acrescentam, e mais amigos verdadeiros; menos medicação, e mais meditação. Menos dinheiro, e mais criatividade e gratidão. Menos viagens complicadas a lugares longínquos, e mais passeios à pé pelas redondezas.
É tão difícil conversar com pessoas assim, amargas! Elas não escutam. Simplesmente, mudam de assunto. Não deixam a gente sequer terminar uma frase, e já estão falando de outra coisa. Principalmente, delas mesmas. Tentam esconder com palavras aquilo que seus silêncios revelam, aquilo que seus olhares querem derramar, mas escondem por medo de parecerem fracas. Não sabem que demonstrar fragilidade, dizer "Eu preciso de alguém para conversar", "Eu estou triste," "Sinto saudades de você," e "Por favor, me ajude," é um sinal de grande força. É aceitar que é humano. Assim, acabam afastando as pessoas. Ninguém consegue participar de um monólogo - que deveria ser um diálogo - por muito tempo. Conversar é dar e receber, falar e ouvir.
Às vezes, a gente acha que a mudança tem que começar do lado de fora: "Preciso emagrecer para me sentir feliz." Na verdade, é o contrário: "Preciso me sentir feliz para emagrecer." Ou então: "Preciso de uma nova casa para recomeçar a vida." Mas na verdade, deveria ser: "Preciso de uma nova vida para me sentir bem na mesma casa." As mudanças duradouras e verdadeiras começam do lado de dentro. Quem está de bem consigo mesmo, não perde tempo planejando vinganças, focando no que é feio, ferindo as pessoas, remoendo o passado e amarrado a relacionamentos doentios com pessoas que só vampirizam. Quem quer ser feliz, deve aprender a deixar ir, relaxar mais, agradecer mais, se amar mais.
É muito bom ter coisas nas nossas casas que tornem o nosso dia mais prático, fácil e confortável. Mas não é bom deixar que estas coisas nos possuam, e muito menos, acreditar que elas, por sí, trarão felicidade e preencherão aquele enorme espaço vazio que não pode ser preenchido com nada material. O espaço que deve ser ocupado pela nossa alma.