witch lady

Free background from VintageMadeForYou

terça-feira, 7 de outubro de 2014

INVEJA




Introdução ao poema


Muito já foi dito e escrito sobre a inveja, neste e em outros espaços, em verso e em prosa. Alguns não acreditam nela e em seus efeitos. Mesmo assim, ela continua sendo o tema de tantos escritos, exatamente como outros temas sobre deuses, demônios, santos e anjos - que embora não tenham existência comprovada, povoam as mentes de quase todas as pessoas. 

Se a inveja existe? Existe, e é um artifício humano. Uma desculpa para odiar alguém que conseguiu ser aquilo que o outro não conseguiu - ou sequer tentou ser.  A inveja é um olhar voltado para o outro, mais do que para si mesmo e seus próprios potenciais.

Quem sente inveja não acredita em si. Vive em um mundo conturbado e triste, onde nada é o suficiente. Equilibra-se em uma corda de desespero e medo o tempo todo, e lá embaixo não há rede de segurança. Leva uma vida angustiante, sempre achando que deve competir com alguém a fim de vencer na vida. Precisa provar ser o melhor o tempo todo, e eu não consigo pensar em nada mais angustiante do que isto...

O invejoso é um competidor nato. E um mau competidor, pois quando se vê diante da possibilidade de "perder", é capaz de fazer qualquer coisa para minimizar os efeitos desta perda;  esquece-se (ou talvez jamais fique sabendo) que vencer na vida é, simplesmente, sentir-se feliz com aquilo que se é; olhar em volta e ver coisas bonitas pelas quais agradecer. Encontrar o próprio caminho e segui-lo, fazendo uso de seus próprios dons e potenciais. Expressar, sinceramente, carinho e alegria pela beleza que nasce na vida do outro. É torcer para que o outro seja feliz e alcance seus sonhos, participando deste caminho sempre que for possível.

Pois eu acho que, para ser feliz, a única maneira possível é largando mão de olhar para o que existe na vida do outro, parando de compará-la com a própria vida e as próprias conquistas.








Fica um poema:




Inveja

Os olhos seguem sofregamente
A imagem branca que passa.
Cai-lhe um botão da túnica,
Rola e perde-se pelas escadas.

Mas ela passa.

Explodem cristais de sal.
Na pia, quebram-se as xícaras.
Um pássaro encontra a morte
De encontro à sua vidraça.

(Os olhos arregalados
Segredam suas desgraças).

Caem-lhes as pérolas do colar,
Entram nos buracos das calçadas,
Arrebentam-se as sandálias,
E ela segue, descalça.

Murmuram os olhos. Secam-na.
Derramam lágrimas ácidas.

Arranha o braço na aspereza
De um muro negro de tristezas.
Ela sangra. Ela passa.

Desfazem-se as bainhas das saias,
Fiapos sobre seus pés.
Mas ela segue, ela passa.

Seus planos emaranhados
Nas tranças dos seus cabelos
Não conseguem desfazer-se
Dos nós tão bem apertados.

Mas pouco a pouco, ela segue,
Desfaz, com dedos pacientes,
Cada nó que lhe foi dado.

E os maus olhos que a olham
Choram sua frustração
De não passarem assim,
Mas se agarrarem ao chão
Por onde ela sempre passa...


segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Descobertas




Ontem li uma postagem do blog da Sheila, Passarinhos no Telhado, e fiquei pensando em muitas coisas que me aconteceram. Ela fala da necessidade de deixar ir pessoas e coisas que não mais se harmonizam conosco. Diz que, apesar de continuarmos amando e desejando o bem, quando não dá mais, é porque... não dá mais.

E eu concordo plenamente com ela. A gente vem para esse mundo sendo sempre condicionados a acreditar que alguns relacionamentos são cármicos, e que por isso somos obrigados a conviver com certas coisas. A gente tenta, e tenta, e tenta. Até que chega uma hora que a gente abre os olhos e percebe que vem sabotando a nós mesmos e nos submetendo voluntariamente a dores, decepções  e sofrimentos desnecessários, de gente que não gosta da gente de verdade, não nos admira e não nos respeita. Gente que só lembra de nós quando precisa. Gente que, quando a gente chega para uma visita, finge que a gente não está lá ou demonstra sua desaprovação e desprezo à nossa presença. Gente de íntimo convívio que dá festas em casa e posta as fotos no Facebook para você saber que estava todo mundo lá, e você não foi convidada. Gente que, ao ouvir um "não" de nossa parte, passa a nos ignorar e confabular contra nós. Gente que sente um prazer mórbido em demonstrar todo o seu desprezo pelas nossas conquistas, e que não é capaz de uma palavra ou gesto de alegria pelo que você conquistou. Gente que só gosta da gente se nos comportarmos como bonequinhos de controle remoto, dizendo "sim" a tudo o que eles querem.

Mas mesmo que seja depois de muitos anos, sempre é tempo para perceber e (mais difícil) admitir para si mesmo que não tem mais jeito, não dá mais, chegou ao cúmulo da falta de respeito próprio tentar ser aceito ou amado por gente assim, por mais próximos que eles sejam. E a gente deixa essa gente ir. Solta. A gente passa a ser ausente na vida dessa gente que constantemente se fez ausente nos nossos momentos importantes, e que não respeita ou aprende, nem mesmo através das maiores dores, que nós não somos nada!

E dói, dói muito. Mas de repente, nos vem aquela sensação de leveza. "Nossa," a gente pensa, "Como consegui carregar todo esse peso nos ombros durante toda  minha vida?! Como foi possível ouvir tantas coisas e calar tantas coisas? Como pude desviar das indiretas que sempre foram tão maldosamente diretas? Como foi possível viver tanto tempo fingindo que não percebeu e fazendo de tudo para aceitar os outros "como eles são", enquanto ninguém nunca fez o menor esforço para me aceitar como eu sou?"

E os passos da gente ficam fluidos de repente. As coisas melhoram, a gente começa a andar para frente e se acostuma com certas ausências. E vê que é muito bom não ter que aturar tanta coisa!




domingo, 5 de outubro de 2014

UMA REFLEXÃO SOBRE O MUNDO DOS BLOGS







Meus blogs, e seus índices até o dia de hoje:

-Liberdade de Expressão, aberto em Março de 2012 – 1278 postagens, 285 seguidores e 102.664 exibições de página.

-Passagem , aberto em dezembro de 2012 – 271 postagens, 263 seguidores e 99.463 exibições de página.

-A Casa & a Alma, aberto em julho de 2013 – 111 postagens, 63 seguidores e 26.111 visualizações de páginas.

-Histórias, aberto em fevereiro de 2013 – 200 postagens publicadas, sendo que muitas delas são contos em capítulos; tem 106 seguidores e 40.939 visualizações de páginas.

-Nada a Dizer, aberto em novembro de 2013 – blog apenas de imagens, com apenas 33 seguidores, 84 postagens e 4.984 visualizações de página.

Como vocês podem ver, mantenho meus blogs simplesmente porque gosto de escrever e ler, não tendo qualquer interesse além destes. Devido à pouca receptividade e pouquíssimos visitantes, considero meus blogs espaços quase anônimos no mundo virtual; mas meu objetivo é apenas registrar meus pensamentos, contos e poemas.

Desde que comecei a realmente fazer uso dos blogs, em março de 2012 (não considerarei minha primeira entrada por aqui em 2009, que foi breve e muito mal-sucedida),  pude observar, através de minhas próprias experiências e das experiências relatadas por outros usuários, uma série de coisas das quais falarei nesta postagem. 

Blogar não é fácil; é para quem tem persistência e muita paciência. Existem uma série de problemas nos blogs do Google, que, não sei ainda porque, o suporte ainda não deu jeito, apesar de toda a tecnologia disponível nos dias de hoje e do grande lucro que o Ad Sense pode proporcionar-lhes. Vou listar alguns deles, que já aconteceram comigo ou com outros blogueiros:

-O blog desaparece misteriosamente, com todas as postagens. Todo o trabalho, dedicação, tempo e carinho simplesmente somem dentro do nada, sem que ninguém possa dizer o que ocorreu, e alguns deles, nunca mais voltam a aparecer. Acho que este seria o mais grave dos problemas.

-O que sempre acontece comigo: ao digitar um comentário, o blog recarrega de repente, e tudo o que foi digitado desaparece. Após vários minutos lendo a postagem e escrevendo um comentário (às vezes, mais de vinte minutos), o blog volta a carregar e some com o que comentamos. Começar tudo de novo? Só quando dá tempo... o comentarista acaba perdendo o pique, e talvez por este motivo, os blogs em geral tenham tão poucos comentários. Por isso, geralmente mantenho meus comentários bem breves.

-As pessoas seguem o link postado em alguma rede social – Facebook, por exemplo – chegam até o blog e não conseguem abri-lo. Após tentarem duas ou três vezes, acabam desistindo. Isto pode acontecer quando o blog está “pesado”, ou seja, cheio de imagens e widgets, músicas e selinhos; mas apesar de tentar manter meus blogs sempre leves, isto também constantemente acontece comigo. 

- As pessoas até conseguem abrir o blog, mas ao tentar comentar, não conseguem. Irritadas, não voltam nunca mais. 

-A conexão de internet está funcionando normalmente em todos os sites que frequento, mas quando tento acessar algum dos meus blogs, ela desliga ou torna-se muito lenta de repente. Este estado irritante de coisas pode durar semanas ou meses! Não consigo postar, ler ou comentar nada. Nestas horas, sinto vontade de apagar tudo e desistir.

-Li reclamações de outros usuários cujos blogs foram retirados do ar sem explicações, após sofrerem denúncias. Antes de serem apuradas tais denúncias (e pelo menos em um dos blogs eu tenho certeza absoluta de que tais denúncias foram totalmente infundadas), o blogger retira o blog do ar, sumindo com as postagens do autor.

-Ao tentarmos abrir uma postagem, bugs nos direcionam para sites pornográficos ou de propagandas. Acredito que o dono do blog nem sequer sabe da existência de tais links associados ao seu blog, e por isso, acaba perdendo seus leitores, e ainda corre o risco de ser denunciado.

-Dezenas, centenas de spams nos comentários. Abrimos nossa caixa de emails, e lá estão centenas de comentários imbecis em inglês, pedindo que acessemos tais e tais links a fim de conhecermos seus ‘produtos.’ Uma vez, em uma só postagem, tive que apagar mais de vinte destes comentários feitos em apenas dia!

-Inocentemente, acessamos um link em nossa lista de leitura e, sem qualquer aviso prévio, deparamos com blogs de pornografia pura e simples, com imagens grosseiras e sem classe, sem qualquer teor artístico ou erótico – apenas baixaria. Acho isso abominável, pois muitas vezes, a pessoa que acessa o link o faz inocentemente, e pode estar acompanhado de alguma criança ou amigo, criando uma situação tremendamente constrangedora. Geralmente, tais blogs tem nomes comuns, que nem sequer causam no leitor a desconfiança de que tratam com material pornográfico.

-A lista de leitura simplesmente desaparece, o que também pode durar dias, semanas ou meses! Não ficamos sabendo das postagens dos blogs que seguimos.

-Ao tentarmos seguir um novo blog, o blogger nos bloqueia, alegando que ultrapassamos o número permitido de blogs a serem seguidos. Onde já se viu?!
-Ao tentarmos relatar tais (e outros) problemas, não recebemos resposta – nem mesmo um email de confirmação automática. 

Bem, como eu disse no início, administrar um blog exige paciência e muita perseverança. E é claro, muito carinho e amor pelo que se faz. Quanto a mim, é apenas o meu amor pela escrita que me faz manter meus blogs, apesar de tantas dificuldades.

Mantenho uma escrivaninha em outro espaço que é pago, simplesmente pela facilidade nas postagens, leituras e comentários que o espaço oferece. A navegação é leve e fluida, a colocação de imagens é fácil e os recursos oferecidos são os mesmos que os do blogger; porém, a formatação é muito mais simples e acessível. Se eles podem, por que não o blogger? Por que não mudam o formato dos blogs, facilitando a navegação entre eles? Com certeza, se isto fosse feito, muitos dos que hoje pagam por um espaço virtual para postar seus escritos, migrariam para o blogger.

E você: quais problemas enfrenta, e por que continua a blogar?



DO PÓ AO PÓ







DO PÓ AO PÓ... PÔ!
(CRÔNICA ESCRITA EM UM PERÍODO DE OBRAS NA CASA - OS CÃES MENCIONADOS ERAM MEUS QUERIDOS E SAUDOSOS ROTTWEILERS, ALEPH E LATIFAH)


Ai, ai... há muito desisti de lutar contra a poeira... ela se deita suavemente sobre tudo o que me cerca, deixando os móveis translúcidos e o piso, cheio de pegadas. A obra, que deveria terminar em um mês, talvez se estenda por três ou quatro... 

Vou passando, respirando o pó (nem espirro mais, pois já me acostumei) e de vez em quando, baixa um "Caboclo Trabaiador" (geralmente, nos finais de semana) e decido jogar água na varanda e nas escadas, passar pano na casa toda, retirar pelo menos um pouco da poeira, para que durante os finais de semana, possamos viver em um local mais ou menos limpo...

Mas dizem que do pó viemos, e ao pó voltaremos. Só não pensei que fosse tão cedo! Sinceramente, o mal é necessário, mas não vejo a hora de ter a minha casa todinha para nós de novo, limpinha, sem açúcar derramado na mesinha da cozinha, sem bate-bate- de martelos, sem sacos de entulho na garagem, e especialmente, sem poeira!




Qual é o pó? Bem, acostumei-me com silêncio e privacidade! E não tenho tido nem uma coisa, nem outra, apesar do rapaz que trabalha aqui - o Almir - ser uma pessoa educadíssima, discreta e de inteira confiança.

Mas tenho saudades de poder olhar pela vidraça da janela e ver - literalmente, enxergar - o lado de fora... receber meus alunos e ouvi-los novamente dizer o quanto minha casa é organizada, silenciosa e aconchegante... mas vai valer a pena esperar.

Até o pelo dos cachorros está empoeirado! Morro de dó, ao olhar aquelas caras pretas e translúcidas, deitados no meio do pó de cimento - pois não ficam no canil durante o dia, preferindo a varanda, que é mais fresca. A água deles é trocada a cada uma ou duas horas, pois se eu não fizer isso, fica uma nata grossa de pó boiando sobre ela.



Terça-feira passada, nem precisei brigar com eles para dar banho: só chamei, e ambos submeteram-se voluntariamente, acho que cansados de carregar quilos de poeira no lombo! Não sei porque, mas depois do banho, eles ficaram bem mais serelepes, como se estivessem mais leves!

Mas a poeira pode ser encarada de uma forma filosófica; por exemplo, dá para fazer alguns desenhos de casinhas com montanhas atrás na mesinha de vidro da sala. Não preciso preocupar-me em varrer, pois de nada adianta, então tenho uma boa desculpa para relaxar e ser natural e literalmente... relaxada! Com isso, sobra mais tempo para escrever, dormir, preparar minhas aulas. 

Lembrei-me até daquela velha piada, em que duas mineirinhas preparavam café na cozinha da fazenda; a primeira pergunta: "Pó Pô o pó?" A segunda responde: "Pó! Pó pô o pó!"

E querem saber? Até que ficou bonitinho, o sol desenhado com o dedo na vidraça.




Frida - A Biografia

Diego e Frida



Ao conhecer Frida Kahlo, o renomado pintor Diego Rivera caiu de encantos pela menina determinada e forte. Ela decide pedir-lhe uma opinião sobre suas pinturas, já que nutre por ele grande admiração e quer saber se seus quadros são realmente bons ou se ela deve desistir de pintar. Achei lindo este trecho do livro, que fala do começo do amor entre eles... Um trechinho do livro Frida - A Biografia, de Hayden Herrera. Disponível na amazon.com.br



"...Eu me senti profundamente comovido de admiração por aquela menina. Tive de me refrear para não cobri-la de elogios tanto quanto eu queria. Mas não consegui ser totalmente insincero. Eu estava intrigado pela atitude dela. E perguntei por que ela não  confiava no meu julgamento. Ela afinal não tinha ido me ver justamente pra ouvir a minha opinião? "O problema", ela disse, "é que alguns amigos seus me aconselharam a não dar muito valor ao que você diz. Eles me contaram que quando é uma mulher que pede sua opinião, e desde que ela não seja feia, você logo se derrama todo sobre ela e a enche de atenções apaixonadas. Bom, eu quero que você me diga só uma coisa. Acha mesmo que devo continuar pintando, ou devo procurar outro tipo de trabalho?" "Na minha opinião, por  mais que seja difícil pra você, você deve continuar pintando", respondi de imediato. "Então vou seguir seu conselho. Agora, eu gostaria de te pedir mais um favor. Pintei outros quadros que eu gostaria que você visse. Já que você não trabalha aos domingos, será que poderia ir até a minha casa domingo que vem para ver as telas? Eu moro em Coyacán, avenida Londres, 126. Meu nome é Frida Kahlo." No momento em que ouvi o nome dela, eu me lembrei que meu amigo Lombardo Toledano, quando era diretor da Escola Nacional Preparatória, tinha reclamado de uma menina de  mesmo nome. Ela era líder, ele dizia, de um bando de delinquentes juvenis que causavam tantos tumultos que ele tinha pensado em pedir demissão do emprego por causa deles. 



pintura de Frida Kahlo


Eu me lembrei de que uma vez ele me apontou quem era a menina, depois de deixá-la na sala do reitor para uma reprimenda. Então outra imagem surgiu em minha mente, a daquela menina de doze anos que desafiara Lupe (nota: Lupe, na época, era esposa de Rivera), sete anos antes, no auditório da escola onde eu estava pintando murais. Eu disse: "Mas você é..." Ela rapidamente me interrompeu, tão ansiosa que quase colocou a mão na minha boca. Seus olhos  adquiriram um brilho diabólico. Em tom ameaçador, ela disse: "Sim, e daí? Eu era a menina do auditório. mas aquilo não tem absolutamente nada a ver com o agora. Ainda quer ver -me no domingo?" Tive grande dificuldade de não responder "Mais do que nunca!". Mas se eu demonstrasse minha empolgação, ela talvez nem me deixasse ir. Por isso, respondi somente: "Sim." Então, depois de recusar a minha ajuda para carregar as pinturas, Frida foi embora, com as enormes telas balançando debaixo dos braços. No domingo seguinte me vi em Coyacán, procurando a avenida Londres, 126.  



Quando bati na porta, ouvi alguém assoviando "A Internacional" por cima da minha cabeça. No topo de uma árvore alta, vi Frida, de macacão, começando a descer. Rindo alegremente, ela segurou minha mão e me levou para dentro de casa, que parecia estar vazia, e para dentro do quarto dela. E então ela me exibiu todas as suas pinturas. O desfile das telas, o quarto dela, sua presença radiante, me encheram de uma maravilhosa alegria. Eu ainda não sabia, mas Frida já tinha se tornado o fato mais importante de minha vida, e continuaria sendo até o momento de sua morte, 26 anos depois.  



Dias depois de visitar Frida em casa, eu a beijei pela primeira vez. Assim que concluí meu trabalho no prédio do Ministério da Educação, comecei a cortejá-la a sério. Embora ela só tivesse dezoito anos (vinte ou vinte um; Frida mentia sobre sua idade) e eu mais do que o dobro, nenhum de nós se sentia nem um pouco constragido. A família dela parecia aceitar  que estava acontecendo. Um dia, o pai dela, don Guillermo Kahlo, que era um excelente fotógrafo, me chamou de lado: "Vejo que está interessado em minha filha, não é?" ele me perguntou. "Sim," respondi. "Do contrário não faria  essa viagem toda até Coyocán para vê-la." "Ela é um demônio," ele disse. "Eu sei." "Bom, eu avisei," ele disse, e saiu andando.


Frida, já muito doente, pintando em sua cama, ao lado de Diego Rivera, seu marido.



sábado, 4 de outubro de 2014

Intensa





Ah, tarde vermelha que entra pela janela,
Salpicada pelos cantos molhados dos sabiás
E pelos cheiros doces das flores e do mel dos colibris!
Ah, tarde, tuas vozes de velhos amores,
Rostos derretidos de gris, na sépia do tempo,
Que já nem aparecem mais nas fotografias!...

Ah, tarde, que me trouxe uma canção distante,
Cheia de lembranças de almas errantes
Que passaram, que se foram para sempre, e antes,
E que nunca, nunca mais aqui voltaram!

Ah, tarde se eu pudesse!... - te prometo, e te juro,
Mergulhava de vez nesse anoitecer escuro
Cujas pontas seguras entre os dedos duros!



terça-feira, 30 de setembro de 2014

FASES...










INGRATIDÃO







Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido.

Bateu à porta, contrita,
Um fiapinho de vida,
Os olhos postos no chão.

Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido.

Viu a estendida mão,
Pegou-a, sem cerimônias,
Colocou no coração.

Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido.

Deitou a necessidade
Que assolava sua vida,
Derramou sua saudade.

Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido.

Recebeu seu lenitivo,
Encontrou uma saída,
Reviu a felicidade.

Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido.

E depois, virou as costas
Saindo através da porta
Sem nem mesmo olhar para trás.

Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido.

Relegou ao esquecimento
Aquele que lhe salvara,
E não voltou nunca mais...

Precisava de um vestido,
Precisava de um ouvido...



segunda-feira, 29 de setembro de 2014

UM LUGAR PARA OLHAR O CÉU





Acho que toda casa deveria ter um lugar para olhar o céu; seja uma janela, um canto de jardim, uma poltrona, um pedacinho de chão. Lembro-me que quando eu e meu marido nos mudamos para nossa primeira casa (e tivemos, pela primeira vez, um quadradinho de jardim), nos deitávamos no chão nas noites de verão (geralmente, aos sábados) e ficávamos conversando e olhando o céu.

No último sábado, ao fazer compras em um supermercado por aqui, achei umas poltronas de jardim que me atraíram. Ao olhar para elas, que são largas e feitas de material plástico, com braços confortáveis e assentos baixos com encostos reclinados, imediatamente imaginei que seriam boas para olhar o céu. Compramos duas, e coloquei-as no jardim ontem de manhã. O tempo não estava muito ensolarado, mas mesmo assim, sentei-me em uma delas e relaxei - os cães brincando à minha volta. 

Comecei a ler um dos livros que baixei para o meu e-reader, mas em poucos minutos comecei a sentir-me sonolenta e fechei os olhos. Passei a escutar e tentar identificar os cantos dos pássaros que voavam pelo jardim e pela mata próxima... sabiás... coleiros...  canários da terra... bem-te-vis... maritacas... cambaxirras... um tucano... saíras... e assim, contando passarinhos, eu dormi. Apenas por alguns minutos, mas dormi. Despertei com pinguinhos de chuva no rosto, e ao abrir os olhos, dei com o céu cinzento e as copas das árvores. Debaixo das cadeiras, dormiam meus cachorrinhos...

Mal posso esperar por uma noite estrelada, para que possamos nos sentar nas cadeiras e olhar as estrelas.


VORACIDADE




Almoçando ontem em um excelente restaurante de comida mineira, em Juiz de Fora, eu e meu marido, sentados próximos ao bufê (único lugar vago quando entramos)  observávamos o comportamento de alguns clientes. Era um destes restaurantes tipo “all-you-can-eat”, no qual as pessoas pagam um preço único e servem-se o quanto desejarem. Em uma das mesas, onde estavam sentados um casal e o filho pequeno, a moça foi ao bufê muitas vezes, e a cada vez, voltava para a mesa com pratos cheios – obviamente, eles não devem ter conseguido comer toda aquela comida! Enquanto isso, reparei em um senhor que encheu o prato quatro vezes. Seu estômago volumoso e seu rosto vermelho demonstravam o esforço que seu organismo deveria estar fazendo para digerir toda aquela comida.

Acima dos pratos, na parede do bufê, o anúncio: “Por favor, Evitem desperdício de comida!” Acredito que ninguém o tenha lido. Pensei no quanto os seres humanos são vorazes e egoístas. Da mesma maneira que serviam-se naquele bufê (pegando mais comida do que seriam capazes de comer ou do que seria aconselhável à sua própria saúde), nós, “humanos,” depredamos florestas, secamos rios, eliminamos outras espécies e disputamos vagas em empresas passando por cima de outras pessoas – sabotando-as se preciso. E há os que dizem: “É a lei da sobrevivência!”

Nos queixamos dos políticos que estão lá, eleitos por nós, depredando o povo e os recursos do país, mas quantos faríamos diferente se estivéssemos no lugar deles? Para mim, eles apenas retratam as convicções da maioria das pessoas. A ordem da vida é pegar o máximo que for possível, encher os pratos e as mãos, comer até vomitar; afinal, é preço único, e ninguém quer ser chamado de tolo... a vida deve ser aproveitada “ao máximo.”

Na volta para casa, já anoitecendo, vemos na estrada quilômetros de florestas pegando fogo, e imaginamos quantos animais e quantas plantas estavam sendo destruídos ali; certamente, através das mãos de alguém egoísta que acha bonito ver o mato pegar fogo. Enquanto isso, passamos por uma senhora que lavava a calçada com jatos de mangueira, ignorando as queimadas, a estiagem e a falta d’água.

Chegamos em casa, e ao ligar a TV, vemos um grupo de adolescentes de skate surrando um cão que tentava desesperadamente escapar de dentro da pista escorregadia.

Amanheci pessimista.

Deus errou. Deveria ter descansado bem antes do sétimo dia. Antes de criar a raça humana.


sábado, 27 de setembro de 2014

MENSAGEM A UM DESCONHECIDO - CECILIA MEIRELES






Teu bom pensamento longínquo me emociona.
Tu, que apenas me leste,
acreditaste em mim, e me entendeste profundamente.


Isso me consola dos que me viram
a quem mostrei minha alma,
e continuaram ignorantes de tudo que sou,
como se nunca me tivessem encontrado.


Fevereiro, 1956



Parceiros

Wyna, Daqui a Três Estrelas

Este é um post para divulgação do livro de Gabriele Sapio - Wyna, Daqui a Três Estrelas. Trata-se de uma história de ficção científica, cuj...