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quinta-feira, 25 de julho de 2013

A Casa Onde Morei





A Casa Onde Morei

Novamente, chego à mesma velha e conhecida rua. Anoitece. A casa, com seu telhado em "V" invertido no alto da colina, é apenas uma sombra escura contra o céu.
O portão range quando o abro. Conheço este ruído. Vagarosamente, começo a subir os degraus. Conheço também cada pedra, sei onde cada degrau é mais alto ou mais baixo. Posso subí-los mesmo durante a mais negra escuridão. Quando chego em frente à casa, deparo com as duas janelas da frente escancaradas e negras, como se fossem dois olhos sem órbitas a me fitarem. Já está quase totalmente escuro. O silêncio é total, e não há luzes na casa. 
Entro. Deparo com uma sala sem móveis, fantasmagórica. Onde está minha mãe? E meu pai? Onde estão meus irmãos? Testo o interruptor, apenas para confirmar: não há luz. Meus passos ecoam no chão de assoalho. 
A velha e pesada mesa de madeira ainda está na cozinha. Sobre ela, uma vela acesa. Súbito, a porta da cozinha se abre, e entra meu pai. Mas ele apenas me fita, sem nada dizer. Está muito sério e parece zangado. pergunto-lhe o que quer, ele não responde. Percebo que só posso vê-lo da cintura para cima, a parte de baixo do seu corpo se desvanece aos poucos. Assusto-me, afinal de contas, lembro-me de que ele está morto há muitos anos. Mas antes que eu possa ter qualquer reação, ele vira-me as costas e sai. A chama da vela oscila. Vejo a porta entreaberta do quarto que foi de meu avô. Eu a empurro, e ela chora. Lá dentro, de pé no canto da parede, meu avô é apenas uma sombra indistinta. Não posso ver seus olhos. Logo, ele some.
A escuridão agora é total. Saio pela porta dos fundos. Vejo as folhas das bananeiras brilhando, mas não há luar. De repente, vejo meus gatos, que me rodeiam, miando desesperados: Loretta, a gatinha que perdeu um olho; Frieda, a que gostava de comer as esponjas de lavar louça. Dirceu, o gato preto que caçava borboletas. Gugu, o rajado, meu preferido. Barbarella. Pedro, Amarelo, Mimi. Há também outros gatos que já foram meus. Tenho que alimentá-los. mas lembro-me que estão mortos. Mortos não comem. Choro de saudades deles.


Aparecem meus cachorros: Fox, Rex, Bolinha, Susi, Fábrica (ela sempre paria muitos filhotes), Jolie, Fifi, Dédi (Dead, em Inglês, pois ele era muito feio), Bob, Mim e muitos outros. Sinto muito ter que ir embora e deixá-los sozinhos naquela casa vazia e escura. Mas não posso cuidar deles, e eles não podem vir comigo. 
Preciso ir embora. A melancolia que me invade é indescritível. Chamo por nomes. Apenas o eco da minha própria voz responde. Grito o nome da nossa vizinha. Olho por cima do muro, mas a casa dela está vazia e escura, como a minha. Apenas D. Delfina, a sogra, que era cega e muito idosa, e andava segurando-se nas paredes da casa a fim de se guiar, passa por mim. Mas ela some, antes de fazer a curva em volta da casa. Alguém aparece à janela. Reconheço Tamico, o irmão da vizinha, que morreu de tuberculose quando eu tinha cinco anos. Nunca mais eu me lembrara dele desde então!
Como os outros, ele some.



Passam de mãos dadas D. Lourdes e seu marido, Moacir. Caminham como num transe e passam por mim sem me cumprimentarem, desaparecendo contra a parede da casa.
Meu tempo está acabando. Cruzo a lateral escura da casa, correndo para o quintal da frente. Começo a descer os degraus lentamente. Olho para cima mais uma vez, e todos os animais me olham, sentados nos degraus. ter de deixá-los presos ali parte meu coração. Grito: "Eu volto para cuidar de vocês, prometo!"
Desperto.



quarta-feira, 24 de julho de 2013

A Idosa






A Idosa


Passava a mão pela testa
Enxugando o cansaço.
Apertando os olhos,
Mirava o horizonte
Tentando ver algo novo,
Diferente,
Curioso.

Cabelos brancos esvoaçavam
Em volta de um rosto magro
E às vezes, a chuva seguia
Nas valetas das muitas rugas.

Avançada em anos,
Tinha tão poucos bem vividos...
Chinelos gastos de tanto errar
Pela vida e pelos caminhos.

Mas ainda havia flores
Mesmo que já desbotadas
Na estampa do vestido.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Face-cara-de-pau




Fico escandalizada com algumas sandices que vejo sendo compartilhadas no Facebook. Acho que Mark Zuckerberg criou uma ferramenta infernal, embora não tenha sido esta a sua intenção. Infelizmente, o Facebook no Brasil tem se tornado uma ferramenta para espalhar calúnias, agredir pessoas verbalmente, difamar cidadãos honestos e espalhar a violência.

De repente, alguém não concorda com o que a gente diz, e adentra a nossa página com abordagem irônicas e agressivas, e nem sequer se preocupa em disfarçar que toda aquela agressividade direcionada só estava esperando por uma pequena chance a fim de revelar-se - pois tratava-se de coisa 'encomendada' por outros.

Mas bem além das ofensas pessoais, o Facebook está sendo usado por gente ignorante que nem sabe o que está partilhando, ou que nem sequer leu a postagem até o fim antes de clicar sobre ela. 

Ainda há pouco, deparei com o seguinte compartilhamento:


"A Globo te mostra um dono de loja chorando, te faz sentir pena dele, mas não te diz que eles tinham seguro que cobre tudo, e que as roupas da loja foram distribuídas para MENDIGOS do Leblon... 
A Globo faz você sentir pena dos bancos que foram quebrados, mas não te diz que os bancos brasileiros são os que mais lucram no mundo inteiro. Extorquindo o povo pobre. E não te diz que os sete maiores bancos tem ativo superior a 50 bilhões de reais.
A Globo só mostra o quebra quebra do protesto, mas não te fala sobre a pauta dele. Diz que a polícia tem que agir mais energicamente, mas não te fala que a polícia não vai resolver a farra dos helicópteros, que a polícia não vai resolver a crise na saúde e na educação, e não fala que a polícia não vai resolver a cpi dos transportes e do maracanã. Não fala sobre quem são os responsáveis por todos esses problemas que estão levando essas pessoas às ruas.
A Globo te fala que o governador fez uma reunião de emergência com a secretaria de segurança depois do protesto... mas não te diz que faria mais sentido ele fazer uma reunião com a secretaria de educação, de saúde e de transporte.
A Globo chama as pessoas que estão lutando na rua de vândalos e de arruaceiros, e mostra a revolta que ta acontecendo ali, mas não te mostra o relato das pessoas que estão sendo presas injustamente, não te diz porquê elas estão fazendo aquilo, nem te mostra outro lado, não te diz que a maioria dos feridos foram socorridos entre médicos de verdade que ofereciam os primeiros socorros com qualidade e gratuitamente, que os advogados da oab defenderam gratuitamente essas pessoas, e que suas fianças eram pagas por vaquinhas feitas entre os próprios manifestantes.
A Globo te mostra moradores do Leblon colocando flores em frente as lojas invadidas, e faz você sentir mais pena das lixeiras das ruas do que das pessoas que são mortas pela Violência e Terrorismo de Estado. Ela fala muito pouco dos muito inocentes que são assassinados na favela toda vez que tem incursão policial e põe um ex-policial na tv dizendo que tem mesmo que usar fuzil na favela, fazendo você acreditar que aquelas vidas valem menos.
ATENÇÃO: A televisão está tentando colocar você contra as pessoas 'fudidas' (sic) como você, e a favor dos ricos. Se quer assistir esse Jornal, assista sabendo disso, e observe as táticas que eles usam para te convencer de que os seus irmãos são seus inimigos."




Uma postagem que favorece às agressões, o quebra-quebra, e ainda justifica os saques, dizendo que os donos das lojas saqueadas tem seguros que cobrem tudo, e os objetos roubados foram 'humanamente distribuídos' entre os mendigos da cidade. Pimenta no olho do outro é sempre refresco. Queria ver se fosse a sua loja! Queria ver se você trabalhasse em algum destes lugares que foram destruídos, e fosse ficar sem salário no final do mês porque não existem mercadorias para você vender. Queria ver se o banco no qual você tem seu salário depositado todo mês, não abrisse amanhã de manha para você resgatar seu dinheiro suado. E mais ainda: sem os bancos, como você financiaria seu carro e sua casa própria? Afinal, por que ter casa própria e carro, se você é a favor do comunismo, contra os 'ricos' e contra a propriedade privada? Por que gritar palavras de ordem contra os burgueses, se você é um deles?

Ninguém que sai quebrando tudo, atirando coquetéis Molotov contra seres humanos e praticando todo tipo de roubo e violência, inclusive, contra prédios históricos, é preso injustamente! Pena que estas criaturas não possam ficar o resto de suas vidas em uma prisão.

Na verdade, esse movimento já deu nojo. As pessoas querem consertar o país, querem honestidade dos políticos, mas o que elas fazem? Agem exatamente como eles (ou até pior)! Roubam, matam, destroem, saqueiam, incitam a maldade e a violência! Por que não doam tudo o que elas possuem e vão viver em uma comuna, já que gostam tanto de comunismo? Por que não se mudam de vez para Cuba?

E se os manifestantes podem fazer 'vaquinhas' para soltar todo mundo (uma fiança destas pode chegar a 20 mil reais) por que não fazem vaquinhas para ajudar a quem realmente precisa? Por que não doam alguma coisa às comunidades carentes? Por que não se mobilizam para ajudar os mais fracos fazendo por eles algo de concreto, ao invés de apenas gritar palavras de (des) ordem? Fácil: porque o dinheiro das fianças não vem de vaquinhas coisa nenhuma! Tem alguém grande por trás disso. Tem gente financiando essa corja toda. E os bem-intencionados que vão às passeatas realmente por quererem um país melhor, são usados como massa de manobra.

E quem será que está por trás de todo esse vandalismo? Idiota é quem acredita que não há ninguém. Apenas concordo com uma única parte deste ridículo texto: "Observe as táticas!" Aprendam a observar e julgar por si mesmos, antes de caírem nas malhas de gente que os incitam a destruir, roubar, matar,  depredar e infernizar a vida de pessoas honestas que nada tem a ver com nada  disso.

Casa Vazia





CASA VAZIA


Quando nos mudamos para esta rua, há seis anos, logo percebi que teria bons vizinhos. Todos estão sempre prontos a ajudar, respeitam a privacidade uns dos outros e convivem de maneira gentil. É claro, descobrimos mais afinidades com alguns do que com outros, mas de maneira geral, somos todos bons vizinhos.

A casa ao lado da minha, era ocupada por uma família: mãe, pai, dois filhos, alguns empregados... e -acho- uma dezena de cães! Adoro cães, e eles não me incomodam ao latir, a menos que eu perceba que são latidos de angústia, o que nunca foi o caso. Meu marido às vezes reclamava do barulho dos cães, pois um deles latia compulsivamente quando os donos estavam ausentes. Este latido também me incomodava, pois era de tristeza...mesmo sabendo que o caseiro vinha todos os dias cuidar de tudo, meu coração murchava quando ele começava a latir.

Há pouco tempo, percebi que os jarros de plantas que marcavam o portão da casa, desapareceram. Caminhões de mudança carregavam, aos poucos, objetos e mobília. É lógico, percebi que meus vizinhos estavam indo embora. Bem, eles não eram, exatamente, grandes amigos, já que nem sequer se despediram dos outros vizinhos. Ou de nós. Não posso dizer que sinto saudades deles.

Mas a casa vazia me incomoda. Não ouço mais os carros chegando em casa à noite, nem os cães latindo. Foram-se os vasinhos de flores e casinhas de passarinho pendurados no madeiramento do telhado da garagem. O alarme não dispara mais no meio da noite porque alguém se esqueceu de desligá-lo antes de sair para uma volta no jardim. Acabou o movimento de crianças indo e chegando da escola, ruídos delas em volta da piscina. À noite, olho para o outro lado e está tudo escuro. Bem mais silencioso, mas escuro...




Quando eu ainda era uma adolescente, e todas as minhas irmãs já tinham se casado, meus pais pegaram pneumonia ao mesmo tempo, e uma de minhas irmãs, que morava perto de um hospital, achou melhor ficarmos com ela até que nossos pais se curassem. Ficamos morando no centro da cidade durante mais ou menos um mês. Um dia, minha mãe me pediu que eu fosse em casa pegar algumas coisas. Quando cheguei lá, levei um choque: O mato havia crescido tanto, que tive que atravessá-lo para chegar até a porta da casa. Quando entrei, o soalho de madeira estava todo mofado, coberto por uma camada de pelos verdes, e as roupas da casa cheiravam a mofo.

Logo percebi o que significa uma casa estar morrendo! Imediatamente, eu e minhas irmãs abrimos as janelas e começamos a faxinar, lavar, esfregar, encerar. Quando meus pais voltaram, estava tudo limpinho de novo.

Uma casa vazia, ou um coração vazio: sinônimo de angústia. Tomemos sempre cuidado para que nunca sejamos tomados pelo mofo da indiferença e da falta de amor.



Anne Frank




Anne Frank - pensamentos


"Os pais somente podem dar bons conselhos e indicar bons caminhos, mas a formação final do caráter de uma pessoa está em suas próprias mãos."


"Nunca mais recuarei diante da verdade;
pois quanto mais tardamos a dizê-la;
mais difícil torna-se aos outros..
ouví-la."


"Apesar de tudo eu ainda creio na bondade humana."




"Aquele que é feliz espalha felicidade.
Aquele que teima na infelicidade, que perde o equilíbrio
e a confiança, perde-se na vida."


"Viro o meu coração do avesso. O lado mau para fora, o bom para dentro e continuo a procurar um meio para vir a ser aquela que gostava de ser, que era capaz de ser, se... sim,
se não houvesse mais ninguém no Mundo."


"Criticam tudo, e quero dizer mesmo tudo, sobre mim: o meu comportamento, a minha personalidade, as minhas maneiras; cada centrimetro de mim, da cabeça aos pés, dos pés à cabeça, é objecto de mexericos e debates. São-me constantemente lançadas palavras duras e gritos, embora eu não esteja habituada a isso. Segundo as autoridades definidas, eu devia sorrir e aguentar."


"O melhor de tudo é o que penso e sinto, pelo menos posso escrever; senão, me asfixiaria completamente."


"Saia, vá para o campo, aproveite o sol e tudo o que a natureza tem para oferecer. Saia e tente recapturar a felicidade que há dentro de você; pense na beleza que há em você e em tudo ao seu redor, e seja feliz.
A beleza continua a existir mesmo no infortúnio. Se procurá-la, descobrirá cada vez mais felicidade, e recuperará o equilíbrio. Uma pessoa feliz tornará as outras felizes; uma pessoa com coragem e fé nunca morrerá na desgraça."

Anne Frank




Anne Frank morreu aos quinze anos de idade, em um campo de concentração.



Ausência





Zumbidos na tarde morna,
O sol entornando os raios
Por sobre as montanhas lisas.

Uma borboleta agoniza
Numa teia de aranha.

Um passo dentro do mato,
Farfalhar de folhas secas.
Um suspiro de cansaço,
Um maço de flores secas
À espera do teu braço.

Serena fotografia,
Teu sorriso eternizado
Entre as tramas do passado.

Finalmente, a tarde morre,
E os raios de sol, já fracos,
Escrevem teu nome nas flores
Que sobre a cerca, murcharam...




domingo, 21 de julho de 2013

A Casa & a Alma




"A casa é a morada do corpo. O corpo é a morada da alma. Portanto, a casa é a morada da alma."

É o que eu sinto quando vou passando pelos cômodos da minha casa, arrumando, limpando e perfumando. Depois de tudo pronto... curtir! Aproveitar as energias renovadas, o cheirinho de limpeza, o aconchego do relógio tiquetaqueando na parede do corredor. 

E pensando em minha casa, e em outras casas que conheci ou que gostaria de conhecer, acabei abrindo mais um blog: A casa e a Alma  acasaeaalma.blogspot.com


Espero você para um café e um dedo de prosa.






sexta-feira, 19 de julho de 2013

DIAS DE VENTO







Libra é um signo do ar. Eu sou de libra, portanto, amo o vento. Gosto de sentar-me no jardim em dias de vento e conversar com ele, que me responde através dos sons de meus sinos de vento.
Ontem - terça feira - foi meu dia de faxina. Enquanto varria, aspirava, tirava o pó e esfregava, abri todas as janelas e portas da casa e pedi ao vento que me ajudasse. Eu limpava a sujeira física, e ele percorria os cantos, sacudindo as cortinas e banindo energias negativas acumuladas, ocasionais espíritos das trevas e maus pensamentos. 
Pus cobertores, almofadas, edredons e travesseiros ao sol, na varanda, e o vento sacudiu-lhes a poeira e os prováveis ácaros.
Ele passava assoviando, levando consigo para bem longe todas as impurezas. Eu cantava, e ele respondia. Ficamos nessa pareceria por toda a tarde. 
Quando finalmente terminamos, acendi alguns incensos pela casa e pelo jardim, e ele soprou o cheiro pelos quatro cantos, ajudando a perfumar tudo e acalmar as energias. 
Agradeci ao vento pela grande ajuda, enquanto ia fechando as portas e janelas, cerrando algumas cortinas e chamando São Jorge e meu Anjo Guardião para que Eles reenergizassem a casa toda.
O sol já ia se despedindo, e dentro da casa limpa e refrescada, paz e silêncio. Tomei uma chuveirada bem quente, coloquei uma roupa limpa e agradeci a todos os meus ajudantes.
Em resposta, o vento assoviou de leve pela greta da janela.



AVENTURAS EM PORTUGAL






Texto inspirado nas dificuldades e diferenças linguísticas entre o português falado no Brasil e o português falado em Portugal.




Entramos naquele restaurante maravilhoso – eu e meu amigo português. Uma garçonete mal-humorada aproximou-se de nossa mesa, estendendo-me o cardápio. Dentre tantas variedades de pratos, achei melhor que ela sugerisse alguma coisa. Franzindo o cenho, ela respondeu:
- Sugiro a punheta.
Olhei-a, sem acreditar no que acabara de ouvir! Meu amigo permanecia impassível, olhando o cardápio. Tentando não criar um caso, decidi:
-Vou comer uma bacalhoada.
Enquanto isso, meu amigo decidiu:
- De entrada, traga-nos cacetes amanteigados. Para beber, um sumo de laranja. Eu vou ficar com a punheta.
Aos berros, a garçonete faz o pedido:
-Dois cacetes amanteigados e sumo de laranja para a mesa oito! Uma bacalhoada e uma punheta!
Senti-me corar. Meu amigo percebeu, e achando que eu estava chocada pela maneira escandalosa da garçonete, ele comentou, rindo:
-Não te preocupes! Ela deve estar com histórias... com licença, vou ali cumprimentar meu amigo banheiro um minutinho e já volto.
Enquanto eu esperava a refeição, o celular do homem na mesa à esquerda tocou, e ao atendê-lo, ele disse: “Está lá?”
Naquele momento, entra no restaurante um grupo de crianças barulhentas, acompanhadas dos avós, supus, e o homem ao telefone diz:
-Como? O que disseste? Fala mais alto, pois acaba de adentrar uns canalhas barulhentos!
Fiquei escandalizada pela maneira como ele se referiu às crianças. Meu amigo voltou, e não querendo ser indiscreta, não comentei o assunto. Fizemos nossa refeição, que estava deliciosa, e chamando a garçonete, meu amigo pediu duas bicas. Também perguntou-lhe se ela sabia aonde ficava a paragem de autocarro mais próxima, o que ela nos informou entre grunhidos.
Deixamos o restaurante. Meu amigo perguntou-me se eu não gostaria de olhar as montras, e sem graça, eu respondi que não (não tinha a menor ideia sobre o que ele estava sugerindo que eu olhasse). Então, ele pediu-me licença, dizendo que precisava ir comprar fita-cola para sua esposa, e eu sorri, pois sabia exatamente o que aquilo significava. Orgulhosa pela minha inteligência, afirmei, caprichando no sotaque de Portugal:
-Entendi! Vais comprar durex!
Meu amigo me olhou como se eu fosse de outro planeta, corando muito, e respondeu-me:
-Não! Já disse, vou comprar fita-cola! Enquanto isso, fique lá naquela bicha a guardar nosso lugar!
Olhei para o lugar que ele estava apontando, e vi um homem afeminado parado em um ponto de ônibus. Pensei no quanto seria preconceituoso referir-se a um gay daquela maneira no Brasil! Indignada, perguntei:
-Onde queres que eu fique?
E meu amigo, já impaciente:
-Ali, naquela bicha, junto ao paneleiro!
Olhei, mas não vi panela alguma... mesmo assim, fui até o lugar que ele me indicou, e dez minutos depois, meu amigo estava de volta. Estendeu-me uma caixa de goma de mascar, oferecendo:
-Queres uma pastilha elástica?
Por via das dúvidas, agradeci e recusei. Naquele momento, nosso ônibus chegou. Acho que devido à longa viagem e a tudo o que havia ingerido no restaurante, comecei a sentir-me um pouco enjoada. Meu amigo sugeriu que fôssemos a uma farmácia para que eu tomasse uma pica digestiva.
Agradeci novamente, e disse que já me sentia bem melhor.
Ele comentou:
-Antes tivesses comido a punheta!
Concordei com ele, só para não perder o amigo.


Glossário


punheta: bacalhau cru desfiado
cacetes: paezinhos
estra com histórias: ficar menstruada
banheiro - salva-vidas
Está lá? - alô?
canalhas - grupo de crianças
bica - cafezinho
paragem de autocarro - ponto de ônibus
montra - vitrine
fita-cola - durex
durex - camisinha
bicha - fila
paneleiro - gay
pastilha elástica - goma de mascar
pica - injeção

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Sobre Passar Roupas




Sobre Passar Roupas


Quando não gostamos de fazer alguma coisa, existem técnicas neurolinguísticas avançadas, nacionais e importadas, para nos ajudar a fazer com que elas tornem-se suportáveis - ou quem sabe, agradáveis. Uma vez, li em um livro zen que todo mundo deveria fazer, todos os dias, alguma coisa da qual não gosta, como disciplina de espírito. 

Bem, depende da coisa! Imaginem só, se um heterossexual convicto decide disciplinar o espírito cedendo aos domínios da carne como se fosse um homossexual, ou vice-versa? Não daria certo... Ou se a sogra decide fazer faxina na casa da nora todo final de semana, apenas pela disciplina espiritual? As delegacias andariam ainda mais cheias!

Bem, mas vamos voltar a falar das coisas simples, pois nem toda frase de efeito é necessariamente prática. Quais são, afinal, as vantagens de se passar roupas?

1) A roupa fica passada, e a gente não fica andando por aí feito um maltrapilha.

2) Podemos exercitar o braço direito. É bom trocar de vez em quando, para exercitar o braço esquerdo também.

3) Podemos aproveitar para ouvir um pouco de música; basta pegar o CD portátil e tentar relaxar... de repente, podemos cantar junto! E bem alto! Quem canta, seus males espanta, e quem sabe, alguém escuta e se oferece para passar a roupa no nosso lugar, contanto que paremos de cantar?

4) Quando a gente termina e põe tudo arrumadinho no armário, fica tudo bonitinho e cheiroso, e por algum tempo, se houver visitas intrometidas na casa, elas elogiarão a sua organização.

5) A gente tem tempo para pensar nas coisas. Bem, nem sempre isso será positivo... se você estiver meio-brigada com o cara-metade, pode sentir-se tentada a queimar aquela camisa caríssima, favorita dele... OK, só um pouquinho, ali nas costas. Ele vai vestir e nem vai perceber (só os outros).

Pensando bem, passar roupa até que é bom... não é não?


Punhal





PUNHAL





Havia um punhal na bainha,
Acomodado à cintura,
Um punhal bem afiado,
Brilhando na noite escura...

Havia um punhal, e eu o via,
Mas não soube, ninguém disse
Se ele ali estava, em riste,
Para cortar os nós da corda
Ou da concórdia, os laços...

Mas sei que senti sua presença
No meio daquele abraço...

Parceiros

Wyna, Daqui a Três Estrelas

Este é um post para divulgação do livro de Gabriele Sapio - Wyna, Daqui a Três Estrelas. Trata-se de uma história de ficção científica, cuj...